terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Opinião Pública não existe: "quem pode pagar uma sondagem"


Por Henrique Silter


No texto de Pierre Bourdieu A opinião pública não existe o autor justifica suas contestações de modo objetivo, claro e com exemplificações. Para isso usa três postulados em que, segundo ele, as pesquisas indicam, de forma equivocada, que:


- Todas as pessoas têm uma opinião;

- Todas as opiniões se equivalem, ou seja, têm o mesmo peso; e

- Que há um consenso unânime em cada tipo de resposta nas pesquisas.


Uma a uma, Bourdieu rechaça as afirmações. Para o autor, não é bem verdade que todas as pessoas têm uma opinião sobre um assunto, pois se assim mesmo ocorresse, os próprios institutos de pesquisa não colocariam a opção “não sei responder”. Segundo Bourdieu, se “todo mundo deve ter uma opinião, consiste em ignorar as não-respostas”.


Quanto à equivalência das opiniões, ou seja, que toda opinião tem o mesmo valor, Bourdieu acha que essa afirmação não consiste em uma realidade, pois cada opinião isolada é manifestada sem articulação e por isso não é capaz de criar uma mobilização.


Para o autor, apenas as opiniões mobilizadas têm um poder real de transformação. “A opinião mobilizada é essencial”. Para exemplificar, Bourdieu cita o exemplo do peso das opiniões dos diretores de escolas técnicas para a tomada de decisão do ministro da Educação. Já as opiniões de individuas comuns da sociedade não têm um valor tão significativo quanto ao grupo de diretores, portanto não são capazes de decidir, transformar, modificar uma realidade, pois são opiniões isoladas e desarticuladas.


No que concerne ao pressuposto de que há uma unanimidade para cada tipo de resposta numa pesquisa, Bourdieu considera essa posição sem fundamento. Para o teórico, as pessoas estão diante de opiniões conflituosas e constituídas por segmentos da sociedade. “É preciso escolher entre grupos que se definem politicamente e definir cada vez mais tomadas de posições em função de princípios explicitamente políticos. (...) A pesquisa de opinião trata a opinião pública como uma simples soma de opiniões individuais que seriam recolhidas numa situação que é, no fundo, a cabine eleitoral onde o indivíduo vai furtivamente. Esta concepção de opinião pública ignora que as relações entre opiniões são conflitos de forças”.


A respeito desses conflitos de opiniões entre grupos, Bourdieu explica que as distorções das pesquisas, cujas sondagens não são justificadas, são plausíveis de questionamento. “São também acusadas (as agências de sondagens) de fazerem perguntas distorcidas, ou melhor, de distorcerem as perguntas em sua formulação”. Para tanto, Bourdieu justifica essas distorções. “Existe o fato de as problemáticas fabricadas pelos institutos de sondagens de opinião serem subordinadas a uma demanda de tipo particular. Interroga-se sobre os princípios geradores dessas problemáticas é perguntar quem pode pagar uma sondagem de opinião”.


Segundo Bourdieu, uma das conseqüências mais prejudiciais das sondagens é a manipulação. “Um dos efeitos mais perniciosos da pesquisa de opinião consiste precisamente em ordenar que as pessoas respondam a uma pergunta diferente da pergunta colocada, sendo que a interpretação apenas registra o mal entendido”.


Outro problema levantado por Bourdieu é o de ordem política. Segundo ele, a escolha das perguntas passa por um crivo de interesses políticos em que muitas vezes, perguntas muito importantes não são selecionadas devido ao confronto de interesses de cada grupo.


Para Bourdieu, as sondagens de pesquisas de opinião têm um “efeito fundamental” que é a legitimação de uma opinião pública unânime, constituída para reforçar as relações de força que fundam e tornam possível a opinião pública. Bourdieu também ressalta outras funções das sondagens. Entre elas a de construir a ilusão de que há uma opinião pública como se pudesse somar o conjunto das opiniões individuais e a função “inadequada” para representar o estado da opinião por uma porcentagem.



Permitida reprodução desde que citada a fonte Publico & Alternativo: A Hora e Vez


2 comentários:

Juliana Chaar disse...

Esse texto me leva a entender que se todos tivessem uma mesma opinião formada sobre determinados assuntos as coisas seriam bem mais fáceis, pois várias opiniões se tornariam uma só, e talvez pudesse ser levada em conta, mas que graça teria se todos fossem formadores de uma mesma opinião? Só iria existir um jornalista! hehe
Então, viva a diversidade de opiniões! Essa é a minha opinião.
Tô entrando no mundo dos blogueiros agora e passei aqui pra te deixar um olá!


Juliana Chaar

Claire Leal disse...

Eu sou professora de portugues na Inglaterra e um dos meus alunos ingleses fez-me essa intrigante solicitacao de apresentar-lhe um texto com a opiniao do povo brasileiro sobre si mesmo. Eu imediatamente respondi-lhe que isso seria impossivel. Qualquer genealizacao sobre o povo brasileiro leva a erros descabiveis como aquele de conluir que todo brasileiro seria conivente com o que se denomina "jeitinho brsileiro". Eu pesso permissao para apresentar o vosso texto claro e sintetico ao meu aluno.

Muito agradecida,

Claire