Imposto de renda.Omissão de rendimentos. Constitucionalidade.

Hoje eu vou colocar uma decisão que proferi no processo de um contribuinte que foi autuado por omissão de rendimentos. O contribuinte entrou com ação anulatória de lançamento, com requerimento de antecipação dos efeitos da tutela, que acabei indeferindo. Em seguida, requereu a desistência da demanda. Articulou algumas questões interessantes acerca da constitucionalidade do dispositivo e etc. Somente vou colocar as alegações e o trecho da fundamentação em examino a questão. Faço uma observação de natureza sociológica que, às vezes, fico desapotando quando, logo depois da decisão, a parte vem requerer a desistência porque existem processos que trazem questões bastante interessantes.

XXX, já qualificado nos autos e por conduto de seu advogado, ajuizou ação sob o rito ordinário, com requerimento de antecipação dos efeitos da tutela, em face da UNIÃO FEDERAL, aqui representada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, visando à anulação do crédito tributário constituído no processo administrativo fiscal n.º XXX, assegurando-se a Certidão Negativa de Débito – CND ou Certidão Positiva com Efeitos de Negativa – CPDEN em virtude dos débitos discutidos neste processo.
(…)
Alegou, em síntese: (…) ; 3) a inconstitucionalidade da presunção prevista no art. 42 da Lei 9.430/96 em razão de não existir correlação segura e direta entre depósito em conta corrente e omissão de rendimentos, pois transitam outros valores que não são tributáveis; 4) “a simples presunção de omissão de renda tributável com base nos depósitos bancários de suposta origem não comprovada não pode levar à conclusão da existência de fato gerados de imposto de renda, para tanto deverá existir outros elementos, decorrentes da atividade fiscalizatória, que corroborem a presunção” (f. 09); 5) nem todos os depósitos em conta corrente constituem renda porque, como XXX (profissional liberal), é obrigado a receber valores de terceiros e repassá-los e fazer pagamentos para os seus clientes referente a sua atuação, bem assim efetuou a troca de cheques de terceiros; 6) a declaração formal do titular constitui prova hábil e idônea de que tais recursos não lhe pertenciam e demais documentos apresentados não podem ser desconsiderados pelo Fisco sem demonstrar a sua falsidade; 7) não tem como comprovar que os valores provenientes de seu “caixa pessoal” originaram desse ou daquele evento, desse ou daquele depositante; 8) “não houve lançamento configuração de nenhum sinal exterior de riqueza, nem aplicações financeiras, nem mesmo utilização desses valores, portanto, não é admissível a configuração dos mesmos como Omissão de Rendimentos Tributáveis” (f. 14);

Segue a fundamentação:

Em relação a constitucionalidade do art. 42 da Lei 9.430/96, a  competência para a instituição do Imposto de Renda está prevista no inciso III do artigo 153 da Constituição Federal e o seu fato gerador é a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica proveniente de renda ou de proventos, nos termos do art. 43 do CTN.
CTN, Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:
I – de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
II – de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
§ 1o A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. (Parágrafo incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)
§ 2o Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do
imposto referido neste artigo. (Parágrafo incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)
Por sua vez, dispõe o art. 42 da Lei n.º 9.430/96:
Art. 42. Caracterizam-se também omissão de receita ou de rendimento os valores creditados em conta de depósito ou de investimento mantida junto a instituição financeira, em relação aos quais o titular, pessoa física ou jurídica, regularmente intimado, não comprove, mediante documentação hábil e idônea, a origem dos recursos utilizados nessas operações.
§ 1º O valor das receitas ou dos rendimentos omitido será considerado auferido ou recebido no mês do crédito efetuado pela instituição financeira.
§ 2º Os valores cuja origem houver sido comprovada, que não houverem sido computados na base de cálculo dos impostos e contribuições a que estiverem sujeitos, submeter-se-ão às normas de tributação específicas, previstas na legislação vigente à época em que auferidos ou recebidos.
§ 3º Para efeito de determinação da receita omitida, os créditos serão analisados individualizadamente, observado que não serão considerados:
I – os decorrentes de transferências de outras contas da própria pessoa física ou jurídica;
II – no caso de pessoa física, sem prejuízo do disposto no inciso anterior, os de valor individual igual ou inferior a R$ 1.000,00 (mil reais), desde que o seu somatório, dentro do ano-calendário, não ultrapasse o valor de R$ 12.000,00
(doze mil reais). (Vide Lei nº 9.481, de 1997)
§ 4º Tratando-se de pessoa física, os rendimentos omitidos serão tributados no mês em que considerados recebidos, com base na tabela progressiva vigente à época em que tenha sido efetuado o crédito pela instituição financeira.
§ 5o Quando provado que os valores creditados na conta de depósito ou de investimento pertencem a terceiro, evidenciando interposição de pessoa, a determinação dos rendimentos ou receitas será efetuada em relação ao terceiro, na condição de efetivo titular da conta de depósito ou de investimento.(Incluído pela Lei nº 10.637, de 2002)
§ 6o Na hipótese de contas de depósito ou de investimento mantidas em conjunto, cuja declaração de rendimentos ou de informações dos titulares tenham sido apresentadas em separado, e não havendo comprovação da origem dos recursos nos termos deste artigo, o valor dos rendimentos ou receitas será imputado a cada titular mediante divisão entre o total dos rendimentos ou receitas pela quantidade de titulares.(Incluído pela Lei nº 10.637, de 2002)
Em verdade, o referido dispositivo institui uma presunção legal juris tantum de omissão de receitas ou rendimentos em favor do Fisco Federal, nos casos em que o contribuinte não consegue explicar a origem dos valores creditados em conta de depósito ou de investimento mantida junto a instituição financeira.
Segundo Dinamarco, “presunção é um processo racional do intelecto, pelo qual do conhecimento de um fato [indício] infere-se com razoável probabilidade a existência de um outro ou o estado de uma pessoa ou coisa” [1]. A presunção dispensa de prova a parte que beneficie dos seus efeitos e transfere o ônus para a outra parte de infirmá-la, mediante a apresentação de contra-prova.
Em verdade, o autor se insurge contra o ônus que lhe foi imposto, qual seja, de demonstrar a origem dos recursos que transitaram em sua conta corrente. Todavia, a norma não padece de qualquer vício de  inconstitucionalidade.
Presume-se que os valores depositados na conta pertençam ao seu titular. Um ou outro valor pode não pertencer ao titular, mas isto é o excepcional e deve ser demonstrado pelo titular da conta. Assim, o trânsito de valores em conta corrente ou de investimento somada à ausência de explicação razoável sobre a origem dos recursos constitui indício mais do que suficiente da existência de rendimentos não declarados, de maneira que não se pode taxar a presunção instituída pelo legislador de arbitrária.
Constitui uma decorrência lógica da obrigação do contribuinte de submeter os seus rendimentos para fins de tributação, mediante a prestação de informações anualmente a Receita Federal do Brasil, mediante Declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física – DIRPF. O contribuinte está obrigado a informar todos os rendimentos, salvo aqueles que não forem tributados ou estão isentos, não podendo escolher sobre qual o rendimento pretende pagar imposto de renda.
Não agrava consideravelmente a situação do sujeito passivo, considerando que ele é quem se encontra em melhores condições de explicar os seus rendimentos e deve prestar os esclarecimentos, quando requisitados pelo Fisco Federal. Caso se entendesse inconstitucional, a obrigação acessória de declaração de rendimentos anuais também seria. Se não mantém uma documentação suficiente para amparar as suas operações, não pode se beneficiar ulteriormente de sua própria omissão.
Se o contribuinte não justifica a origem dos recursos e não demonstra que ele é isento ou não tributável, a conseqüência que se impõe é o dever de pagar imposto de renda, pouco importando a origem do recurso.
Não é necessário qualquer sinal exterior de riqueza adicional, uma vez que o IRPF tributa o acréscimo patrimonial e não o patrimônio em si.
É até certo que a existência de sinais de riquezas pode até constituir um indício de acréscimo patrimonial, mormente se os bens adquiridos não guardam correspondência com os rendimentos declarados. Contudo, pela ordem lógica das idéias, se as contas bancárias do contribuinte demonstram vultuosa movimentação financeira, sem a respectiva declaração ao Fisco, esse fato por si só, é indicativo de sinais de riqueza, ainda mais quando se revela desproporcional com os rendimentos declarados. Tal regra está mais de acordo com o objetivo do imposto de renda que é tributar o acréscimo patrimonial.
Por sua vez, não há violação ao princípio da legalidade, uma vez que a referida presunção está calcada em lei editada pelo legislador. Ademais, não cria incidência nova, mas pelo contrário autoriza a interpretação de determinados fatos (rendimentos + ausência de comprovação de sua origem), aliviando o ônus probatório.
É razoável que o Fisco exija esclarecimentos daquele que apresentem sinais exteriores de riqueza e, caso não forem adequadas prestadas, sejam valoradas como omissão de rendimentos ou de receita.
Não houve lançamento direto, com base em extratos bancários, uma vez que a atuação fiscal se baseia em três condições: 1) nos dados bancários; 2) solicitação de esclarecimentos pelo sujeito passivo; 3) na aplicação da presunção de omissão de receitas.
Somente haveria inconstitucionalidade se a presunção fosse absoluta. Pelo contrário, trata-se de uma presunção relativa, que admite prova em sentido contrária, uma vez que a lei abre a oportunidade para o sujeito passivo demonstrar a origem dos rendimentos.
Não é outro o entendimento da jurisprudência acerca do tema, conforme excertos dos
julgados abaixos:
“A lei consagra a possibilidade de ser presumida, na falta de outros elementos, a existência de receitas, justificando-se a tributação. A presunção encontra suporte no Princípio da Generalidade (pelo qual todos os que auferirem renda e proventos deverão pagar o Imposto sobre a Renda), no Princípio da Universalidade (que impõe ao campo de abrangência tributária todas as rendas e proventos) e no Princípio da Igualdade (na medida que os contribuintes que se encontram em situação equivalente deverão receber o mesmo tratamento, tanto no que diz respeito à instituição de tributos como na apuração se todos o estão recolhendo devidamente).
Assim, obtidos elementos por meio dos quais se verifica que o contribuinte não estaria recolhendo ou estaria recolhendo a menor o Imposto sobre a Renda, o Fisco pode dele exigir esclarecimentos e documentação, advindo, assim, o dever legal de indicar a fonte da renda ou provento. Assim não procedendo o sujeito passivo da relação jurídica tributária, o Poder Público reputa, com base no referencial obtido, haver rendimento tributável, em face do acréscimo patrimonial de origem não comprovada.
Somente com a não comprovação da origem dos recursos é que permitirá a consolidação  a presunção de omissão de receitas, configurando-se o fato gerador do imposto de renda.
O fato gerador não é o crédito de valores não identificados em contas de depósito ou de investimento, mas a aquisição pura e simples de disponibilidade de receita pelo contribuinte, embora esta receita tenha sido omitida.
Ou seja, uma vez não identificados os valores creditados na conta bancária do contribuinte, há uma presunção legal no sentido de que estes valores pertencem ao contribuinte, sujeitos, portanto, à incidência do IRPF, apesar de não informados na
declaração de ajuste anual.
Tratando-se de presunção juris tantum, admite prova em contrário, a cargo do contribuinte, no sentido de que os valores creditados na conta bancária não são de sua propriedade.
Não se pode aceitar a alegação de que os contribuintes não são obrigados a comprovarem a origem dos seus recursos, estando tal obrigação abrangida no dever de informação ao Fisco”
[2].
“Como se percebe, o legislador, ao estabelecer a presunção de existência de receitas ou rendimentos omitidos a partir da apuração de depósitos de origem não-identificada,  oportuniza ao titular da conta em que encontrados os valores a demonstração da sua procedência, mediante documentação hábil e idônea, o que evidencia tratar-se de presunção legal relativa. Serve a presunção, assim, unicamente como técnica para aliviar o ônus probatório do fisco quanto à existência de receitas ou rendimentos omitidos, tornando praticável e garantindo a efetividade da legislação tributária. Neste sentido, a doutrina pontua que:
“as presunções legais relativas, normas jurídicas que fornecem ao magistrado critérios objetivos para a aferição de fatos juridicamente relevantes, que têm um certo parentesco com as provas legais, são criadas, normalmente, com o objetivo confesso de se aliviar o ônus probatório de uma das partes (o que não significa que invertam o ônus da prova). O legislador, editando a norma substancial, cria direitos e deveres; instituindo uma presunção legal relativa, torna menos árdua a prova da existência deles (…) Em  Direito Tributário, e aprofundaremos o tema em capítulo subsequente, a justificativa do uso de presunções legais relativas não está em que o Estado seja mais débil do que os contribuintes, individualmente considerados, mas, isto sim, tem a ver com o fato de que não tem ele, o mais das vezes, contato imediato com as atividades geradoras de riqueza tributável, além do que, por maior e por mais bem estruturada que seja a máquina de arrecadação, é, nos dias de hoje, praticamente inviável a investigação exaustiva da riqueza tributável de cada contribuinte”. (PAOLA, Leonardo Sperb de. Presunções e ficções no direito tributário. Belo Horizonte: Del Rey, 1997. p. 92)
O mesmo Autor, a partir da análise da doutrina italiana sobre a legitimidade do uso de presunções, em especial sob a ótica do seu possível choque com o princípio da capacidade contributiva, assenta que:
“Não podemos, pois, concordar com a opinião de certos doutrinadores estrangeiros, e Moschetti é um deles, como vimos, que consideram indispensável, para que as presunções sejam consideradas válidas, a possibilidade se lhes opor prova em contrário. Sem a camisa-de-força da discriminação das competências, a questão que se coloca é, basicamente, saber-se se o fato posto como base da presunção absoluta é, em si, um índice capaz de expressar riqueza tributável, sem indagar da sua relação com outro fato embora tal relação, como visto acima, seja relevante em termos de adequação ao princípio isonômico ou à capacidade contributiva relativa). Se a resposta a tal questão for negativa, a norma será inconstitucional, mas não devido à impossibilidade de prova em contrário.
Já no que respeita às presunções legais relativas, dá-se o inverso, isto é, o fato descrito na norma que contém a presunção é relevante, enquanto hábil a revelar a capacidade contributiva relacionada com o fato previsto em outra norma, que cria a obrigação tributária principal. Nesse caso, ao contribuinte que se sentir prejudicado, cabe a apresentação de contraprova, demonstrando que, no caso concreto, o indício que embasa a presunção relativa não revela a riqueza tributável. Indo mais além, pergunta-se: é possível que, ao invés de apresentar contraprova, o contribuinte questione, de forma genérica, quer dizer, sem exclusiva referência ao seu problema, o liame entre os fatos, provando que a presunção, sempre ou no mais das vezes, não leva ao fato presumido? Relativamente às presunções simples, como veremos a seguir, a viabilidade desse questionamento é indiscutível. Mas o fato da relação ter sido posta por lei, como se dá com as presunções legais relativas, não a torna imune à crítica em abstrato? Pensamos que não, e justamente devido à existência do princípio da capacidade contributiva, que impõe a busca da riqueza tributável efetiva, mesmo que de forma aproximada. Provado que o indício que fundamenta a presunção relativa não leva, com um razoável grau de segurança, à riqueza tributável, ela, presunção, deve ser abandonada, ou, ao menos, fortalecida por outras provas apresentadas pelo fisco. Pode-se, assim, dizer que, em  Direito Tributário, as qualidades que legitimam o uso de presunções simples (gravidade, precisão e concordância) também devem ser consideradas no exame das presunções relativas. Dessa forma, o princípio da capacidade contributiva é resguardado, pois que são colocados à disposição do contribuinte instrumentos que o protegem contra sua ofensa.
(…)
Já mencionamos anteriormente as duas maneiras pelas quais a presunção pode ser combatida: pela apresentação de contraprova, a cargo do contribuinte, que poderá demonstrar que o fato cuja existência é presumida não existe; pela discussão da razoabilidade da própria presunção. Este segundo mecanismo é imposto pelo fato da correlação sempre ser uma questão em aberto, o que é exigido, em Direito Tributário, principalmente pelo princípio da capacidade contributiva e pela discriminação constitucional de competências. Em outras searas jurídicas, exige-se, apenas, que as presunções relativas estejam abertas à contraprova, deixando-se a questão da razoabilidade da presunção para ser discutida apenas em face das presunções simples. No Direito Tributário, por todo o exposto, é preciso ir mais além.” (Op. cit., pp. 155-156 e 189)
Por esse motivo, na forma do artigo 42 da Lei nº 9.430/96, diante da presunção de omissão de receitas, não se exige do fisco a comprovação sobre a efetiva existência dessas receitas omitidas decorrentes de atividades não contabilizadas pela empresa. No entanto, verificada a existência de depósitos sem origem comprovada, desfaz-se a presunção de omissão de receitas acaso justificada a origem dos recursos, ou ainda, demonstrada a incompatibilidade do nexo adotado pelo legislador para vincular o fato índice ao fato presumido.
Ressalte-se que, nesse caso, não se cogita da aplicação da Súmula nº 182 do TFR, uma vez que lançamento, além de encontrar base legal no artigo 42 da Lei nº 9.430/96, o que autoriza a sua lavratura (artigo 149, I, do CTN), não é amparado unicamente na existência
dos depósitos em si, mas sim na ausência de elucidação por parte do contribuinte acerca da origem dos valores, a autorizar a sua caracterização como receitas ou rendimentos omitidos. Assim, “o objeto da tributação não são os depósitos bancários em si, mas a omissão de rendimentos representada e exteriorizada por eles” (STJ, REsp 792812/RJ, Ministro Luiz Fux, julgado em 13/03/2007). A jurisprudência vem reconhecendo a legitimidade da autuação com base na presunção relativa nessas situações:
TRIBUTÁRIO. OMISSÃO DE RECEITAS. IMPOSTO DE RENDA. ARBITRAMENTO. ARTIGO 42 DA LEI 9.430/96. AUSÊNCIA DE PROVA DO CONTRIBUINTE A DESCARACTERIZAR O LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO. IMPROVIMENTO DO APELO. 1. A presunção de que os valores mantidos em conta corrente bancária, cuja origem o titular não comprove, após ser intimado para tanto, mediante documentação hábil e idônea, tem fundamento na Lei nº 9.430/96; não há falar, portanto, em arbitrariedade ou ilegitimidade da conduta fiscal e do lançamento tributário. Na dicção da lei, os depósitos bancários sinalizam o acréscimo patrimonial não declarado, cuja origem cumpre ao contribuinte esclarecer. 2. Para que se aplique o entendimento consubstanciado na Súmula nº 182/TFR, é necessário que o lançamento tributário esteja fundado unicamente em depósitos bancários e não tenha sido possibilitada a apresentação de documentos e comprovantes que justifiquem o motivo pelo qual os valores depositados extrapolam a renda declarada do contribuinte. Se a ação fiscal intimou o contribuinte para explicar a origem dos recursos e empreendeu esforços para a investigação e elucidação dos fatos, não há falar em tributação baseada exclusivamente em extratos bancários. Nesse caso, os próprios depósitos bancários prestam-se como prova da omissão de receita. 3. Apelação improvida.
(TRF4, AC 2003.70.00.044173-1, Primeira Turma, Relator Marcos Roberto Araujo dos Santos, D.E. 11/03/2008)
MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. OMISSÃO DE RECEITAS. DEPÓSITOS BANCÁRIOS. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. NULIDADE DE PROCEDIMENTO FISCAL. SÚMULA 182 DO TFR. LEI Nº 9.430/1996, ART. 42. O artigo 42 da Lei nº 9.430/1996 prevê a incidência do imposto de renda sobre os valores considerados como omissão de receita, cuja origem dos recursos financeiros o titular da conta corrente não tenha logrado comprovar. Não há falar em inconstitucionalidade da Lei nº 9.430/1996, porquanto o fato gerador do imposto de renda deve ser definido em lei  ordinária, de acordo com o princípio da estrita legalidade tributária, nos termos do inciso I do artigo 150 da Constituição Federal de 1988. Inaplicável ao caso a Súmula 182 do extinto TFR, porquanto o objeto da tributação não são os depósitos bancários em si e sim a omissão de rendimentos por meio deles verificada. Instaurado procedimento administrativo, está autorizada a quebra do sigilo bancário, porquanto não é absoluto. Exegese da Lei Complementar nº 105, de 2001. Não há falar, assim, em inconstitucionalidade frente a uma possível discordância existente entre esses normativos e os princípios preconizados no art. 5º, incs. X e XII, da CF/88. É que as informações sobre o patrimônio das pessoas não se inserem nas hipóteses do inc. X da CF/88, uma vez que o patrimônio não se confunde com a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem. O próprio Código Tributário Nacional, em seu art. 197, inc. II, preconiza que os bancos são obrigados a prestar todas as informações de que disponham com relação aos bens, negócios e atividades de terceiros à autoridade administrativa. Ademais, tenho que há mera transferência do sigilo, da instituição financeira para o Fisco. O procedimento fiscal não padece de nulidade, tendo em conta não ter a impetrante se desincumbido de comprovar a origem dos valores por ela movimentados. (TRF4, AMS 2003.04.01.027650-7, Primeira Turma, Relator Vilson Darós, D.E. 10/07/2007)
Nesta esteira, uma vez caracterizado o fato índice que dá suporte à presunção legal, cumpre ao contribuinte demonstrar a regular procedência dos valores depositados, mediante a apresentação de documentação que demonstre o liame lógico entre prévia operação regular e o depósito dos recursos em conta de sua titularidade, sob pena de ser este reputado como receita omitida” [3].
Por outro lado, o art. 42 da Lei 9.9430/96 atenuou a súmula 182 do TFR (É ilegítimo o lançamento do imposto de renda arbitrado com base apenas em extratos ou depósitos bancários), conforme julgado abaixo:
“TRIBUTÁRIO. OMISSÃO DE RECEITAS. IMPOSTO DE RENDA. ARBITRAMENTO. ARTIGO 42 DA LEI 9.430/96. AUSÊNCIA DE PROVA DO CONTRIBUINTE A DESCARACTERIZAR O LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO. IMPROVIMENTO DO APELO.
1. A presunção de que os valores mantidos em conta corrente bancária, cuja origem o titular não comprove, após ser intimado para tanto, mediante documentação hábil e idônea, tem fundamento na Lei nº 9.430/96; não há falar, portanto, em arbitrariedade ou ilegitimidade da conduta fiscal e do lançamento tributário. Na dicção da lei, os depósitos bancários sinalizam o acréscimo patrimonial não declarado, cuja origem cumpre ao contribuinte esclarecer.
2. Para que se aplique o entendimento consubstanciado na Súmula nº 182/TFR, é necessário que o lançamento tributário esteja fundado unicamente em depósitos bancários e não tenha sido possibilitada a apresentação de documentos e comprovantes que justifiquem o motivo pelo qual os valores depositados extrapolam a renda declarada do contribuinte. Se a ação fiscal intimou o contribuinte para explicar a origem dos recursos e empreendeu esforços para a investigação e elucidação dos fatos, não há falar em tributação baseada exclusivamente em extratos bancários. Nesse caso, os próprios depósitos bancários prestam-se como prova da omissão de receita.
3. Apelação improvida.” [4]
No caso em exame, o autor teve mais de uma vez oportunidade para exibir os extratos
bancários.
(…)
Passo a examinar cada uma destas situações em separado.
1) valores depositados na conta pessoal e que foram transferidos para a pessoa jurídica;
No processo administrativo-fiscal, o autor, na qualidade de administrador da XXX, apresentou uma declaração que tais valores se encontram registrados na empresa (f. 56), conforme tabela de f. 54/55. Em juízo, o autor juntou declaração subscrita pelo contador da empresa XXX sobre os mesmos valores, constantes na tabela de f. 54/55, com o
seguinte conteúdo:
“os depósitos realizados na conta de XXX, (…), foram realizados na referida conta corrente por esta utilizada pela empresa XXX para trânsito de numerários de sua propriedade. Declaro, ainda, para os devidos fins, que todos os valores constantes da tabela abaixo, foram inscritos e contabilizados na empresa XXX, e que tais valores sofreram o tratamento tributário adequado” (f. 29/30)
Em sua defesa, alegou que:
“No referido processo o autor fez a juntada de documentos que comprovam que vários  dos depósitos realizados em sua conta corrente não correspondiam a rendimentos tributáveis, seriam, recursos da empresa XXX, da qual, como integrante, permitiu serem utilizados suas conta correntes de depósitos para trânisto de valores da referida empresa.
Para provar as suas alegações o contribuinte juntou Declaração Formal da empresa onde a mesma confirma que os valores constantes da tabela anexada aos autos do Processo Administrativo Fiscal era de sua titularidade e que apenas transitaram na conta corrente do Autor.
A Declaração Formal do titular dos recursos é prova inequívoca, válida e indiscutível de que tais recursos não eram de sua propriedade do contribuinte e, portanto, deveria de ser aplicada a regra prevista no parágrafo quinto do art. 42 citado acima”.
De início, é sabido que a pessoa jurídica não se confunde com a do seu sócio, possuindo uma existência própria. Assim, os recursos pertencentes a XXXX devem ser depositados na conta específica aberta para empresa, pois, do contrário, haveria a confusão patrimonial. É até admissível que, na qualidade de sócio-titular, o autor receba um ou outro pagamento na sua conta pessoal e transfira, imediatamente, os recursos para a sua firma, mas isto é preciso estar devidamente documentado.
Neste passo, as declarações acima não são prova suficiente, uma vez que veio desacompanhada de qualquer documento, especialmente os livros comerciais da empresa demonstrando que tais recursos foram transferidos para a conta da empresa e devidamente contabilizados.
Não há qualquer impossibilidade material de provar o alegado porque possui acesso a movimentação da empresa, a qual é sócio-administrador.
2) recursos próprios provenientes de sua provisão pessoal
O autor afirmou que:
“em sede de Processo Administrativo Fiscal, cuja cópia integral segue ema  nexo (sic), em resposta datada de 07.08.2006 o autor declarou, sob as penas da lei, que os recursos listados em tabela intitulada ‘Tabela de Valores Depositados em Conta Corrente de XXX Originados do Caixa Pessoal’ foram originados de sua provisão pessoal, ou seja, não representavam valores novos e sim valores que fizeram parte de uma caixa pessoal do Contribuinte
É comum na atividade comercial a utilização de recursos em espécie para qualquer tipo de transação nem por isso implicando em um rendimento tributável. Não há possibilidade de fazer prova hábil e idônea de que o saque e o depósito em espécie não corresponda a rendimento tributável.
(…)
Não há correlação de que qualquer desses valores tenham sido originados desse ou daquele evento, desse ou daquele depositante. Tratam-se de depósitos em espécie e, portanto, originados do caixa pessoal do Contribuinte” (f. 13/14)
Tais valores contam na tabela de f. 89.
O fato gerador do imposto de renda é a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica, proveniente da renda ou de proventos. Significa que qualquer recurso, pouco importando a sua origem, deve ser informado pelo contribuinte ao Fisco e devidamente tributado, salvo se enquadrar em uma das exceções previstas no Decreto n.º 3.000/99. Conforme se verifica no art. 39 do Decreto n.º 3.000/99, o dinheiro proveniente do “caixa pessoal” não se subsume a nenhuma das hipóteses de exclusão, logo deve ser tributados.
Por outro lado, para excluir a incidência do IRPF, bastaria o autor provar que como adquiriu tais recursos e se tais valores foram submetidos em algum exercício a tributação do IRPF. Assim sendo, não poderiam ser novamente tributados porque não representa um acréscimo patrimonial.
Em nenhum momento, o autor demonstrou que tais recursos foram informados em Declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física – DIRF e, se tais valores já foram submetidos a tributação, o que constitui um indício mais do que suficiente de omissão de
rendimentos. Em verdade, a afirmação não o beneficia, pelo contrário o prejudica, pois constitui uma confissão de omissão de rendimentos.

[1] DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. Vol. III. 6ª. ed., rev.e atual. São Paulo: Malheiros, 2005, p.:113.

[2] TRF 4ª Reg., 2007.72.99.002698-0/SC, 2ª Turma, Rel. Juiz VÂNIA HACK DE ALMEIDA , D.E. 08/10/2008
[3] TRF 4ª Reg., AC 2006.71.08.013019-2/RS, 1ª Turma, Relator Joel Ilan Paciornik, D.E. 01/12/2009
[4] TRF 4ª Reg., AC 2003.70.00.044173-1/PR, 1ª Turma, Rel. Juiz Federal Marcos Roberto
Araújo dos Santos, D.E. de 11/3/2008. No meso sentido: REsp 792812/RJ, Rel.
Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13/03/2007, DJ 02/04/2007, p. 242

Sobre FCL

Sou juiz federal da Seção Judiciária de Sergipe. Trabalhei como: 1) Juiz Substituto da 1ª Vara/SE ao da lado da Juíza Federal Telma Maria Santos Machado - no período de 06.2008 a 12.2012 2) Juiz Federal da 6ª Vara/SE - Subseção Judiciária de Itabaiana no ano de 2013. Atualmente, estou como titular da 2ª Relatoria da Turma Recursal de Sergipe. Eventuais perguntas deverão versar sobre esclarecimentos acerca dos fundamentos da decisão. Não responderei a casos concretos.
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Uma resposta para Imposto de renda.Omissão de rendimentos. Constitucionalidade.

  1. Hendrikus disse:

    Obrigado, assim que passar para 2 fase vou querer sim. A propósito: pode passar algumas informações sobre a preferência dos membros da Comissão Examinadora para fins de 2 fase? É possível, dependendo da colocação no certame, ser nomeado para Aracaju? (vi que algumas Varas estão sem substituto, e tenho parentes em Aracaju). Por fim, lhe convido a participar do twitter, sempre há discussões jurídicas legais. Entre seus colegas de TRF5 que lá se encontram temos: Marco Bruno, Ivan Lira, Hallison, Marcelo Navarro, etc. Caso se anime meu perfil lá é @HendrikusGarcia
    Abraço, de um mineiro que sonhar em morar no Nordeste e integrar o TRF5

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