1.
Introdução:
O presente trabalho tem por escopo o direcionamento do
debate acerca dos contratos de depósito, promovido por meio de seminário
apresentado à turma de pós-graduandos do Centro de Pesquisa e Pós Graduação do
centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas.
De maneira sintética e com um
enfoque prático, sem perder de vista os imprescindíveis conceitos e noções
necessários a alicerçar o tema trazido à baila, são apresentados os tópicos
mais importantes e as questões sobre as quais persistem interessantes
divergências, norteadas pela finalidade acima exposta.
Com a consciência de que um
tema desta magnitude comporta um enorme e aprofundado trabalho de pesquisa,
após a análise das opiniões dos Ilustres autores consultados em cotejo com a legislação
e as manifestações jurisprudenciais emanadas de nosso Tribunais, espera-se que
este trabalho tenha cumprido com a sua finalidade de forma proeficiente,
levando aos docentes importantes informações e gerando um saudável e
enriquecedor debate.
2.
Princípios
Gerais dos Contratos:
Todo arcabouço jurídico que
envolve os contratos em suas mais diversas espécies, parte de quatro princípios
os quais também possuem sua aplicação indubitável aos contratos em testilha.
Sem qualquer redundância,
antes de tratarmos dos contratos de depósito, referindo-se a espécie, devemos
deixar patente que tratamos de contratos, no tocante ao gênero. Tal afirmação
denota que, aquém de qualquer peculiaridade da espécie contratual trazida à
baila, existem e persistem princípios os quais não há como deixá-los sem
menção.
2.1.
Autonomia
da Vontade:
Este princípio advém no
direito contratual da liberdade de contratar. Ressaltando-se as disposições
legislativas concernentes à limitação desta liberdade, o que será tratado
adiante e, adiantando que tal tratamento se dará sob a égide do ditame
Constitucional o qual preconiza que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de
fazer algo senão em virtude de Lei.
Assim, este princípio
consubstancia-se no poder dos indivíduos de suscitar, mediante declaração de
vontade, atos aptos a gerar efeitos e, conseqüentemente, serem tutelados pelo
ordenamento jurídico.
Como bem asseverado por
Orlando Gomes[1], o conceito de liberdade de contratar abrange
os poderes de auto regência de interesses de livre discussão das condições
contratuais e, por fim, de escolha do tipo de contrato conveniente à atuação da
vontade. Manifesta-se, por conseguinte, sob tríplice aspecto: a) liberdade de
contratar propriamente dita; b) liberdade de estipular o contrato; c) liberdade
de determinar o conteúdo do contrato. E ainda, nesta mesma esteira,
continua o ilustre doutrinador, ... não
procede a observação de que a autonomia das partes é mais aparente do que real,
feita sob o fundamento de estas se submetem, quase sempre, aos preceitos
legais, despreocupando-se dos efeitos secundários do contrato. Se é verdade que
ocorre freqüentemente a submissão dos contratantes às norma supletivas do
Direito Contratual, nem por isso a liberdade de contratar é um postulado
acadêmico. Em cada contrato usa-se com maior ou menor extensão, dependendo da
conveniências das partes. Se a dispensam freqüentemente, é porque a Lei
condensa, via de regra, os preceitos usuais que costumam reger o conteúdo dos
contratos mais comuns. Somente, pois, quando lhes convém regulá-los de modo
diverso é que fazem valer a liberdade que lhes é assegurada.
2.2. A Lei entre as partes:
Este princípio demonstra
alicerce no brocardo latino pacta sunt
servanda.
Consubstancia-se na regra de
que o contrato é a Lei entre as partes. Celebrado que seja, com a observância
de todos os pressupostos e requisitos necessários à sua validade, deve ser
executado pelas partes como se suas cláusulas fossem preceitos legais.
O contrato obriga os
contratantes sejam quais forem as circunstâncias em que tenha que ser cumprido.
Estipulado validamente seu conteúdo, vale dizer definido os direito e
obrigações de cada parte, as respectivas cláusulas têm, para as partes do
contrato, força obrigatória.
2.3.
A
Imprevisão:
Imprescindível a alusão ao que
muitos doutrinadores classificam como a continuação do brocardo latino acima
referido, qual seja rebus sic stantibus.
O contrato é sim a Lei entre
as partes, desde de que as condições originárias das partes permaneçam as
mesmas e não encontrem-se estes em desigualdades grandiosas, ou diante de
obstáculos que impeçam o cumprimento de sua parte no avençado.
As modificações nas condições
por assim dizer existentes ao tempo da contratação devem ser previstas, pois
constituem, em uma das razões que movem o indivíduo à contratar, garantindo-se
contra as variações que trariam insegurança para suas relações jurídicas,
nestes casos, o contrato permanece intacto, sem relevante razão para sua
modificação.
É necessário que o
acontecimento seja extraordinário, imprevisível e que esta alteração do estado
de fato determine uma dificuldade do contratante cumprir sua obrigação, por se
ter tornada excessivamente onerosa a prestação.
São estes, em brevíssimas
linhas, os apontamentos trazidos e necessários à compreensão do tema como um
todo.
2.4.
Boa-fé:
Este princípio diz respeito
mais à interpretação do contrato do que com sua estrutura.
Orlando Gomes[2]
ensina que significa que o liberal da
linguagem não deve prevalecer sobre a intenção manifestada na declaração de
vontade, ou dela inferível. Ademais, subentende-se, no conteúdo do contrato,
proposições que decorrem da natureza das obrigações contraídas, ou se impõem
por força de uso regular e da própria equidade. Fala-se na existência de
condições subentendidas. Admitem-se, enfim, que as partes aceitaram estas
conseqüências, que realmente rejeitariam se as tivessem previsto.
Importante deixar patente
que, com a evolução legislativa ocorrida em nosso país, mesmo considerando-se a
morosidade intrínseca ao tema, com o advento do Código de Defesa do Consumidor,
fica ainda mais clara a intenção da proteção ao equilíbrio contratual.
À Luz do artigo 170 de nossa
Carta Magna, bem como do artigo 421 do Código Civil e diante da atuação dos
órgãos correlatos ao Ministério da Justiça, abstrai-se que esta função social é
cada dia mais relevante.
A proeficiente professora
Liliana Minardi Paesani[3],
elucida a questão demonstrando que as
disposições do novo código civil não conflitam com o estatuto do consumidor
enquadrado pela doutrina como direito social intermediário entre o direito
público e o direito privado. Ocorre, isto sim, uma harmonização entre os dois
ramos de direito e constata-se que a nova lei civil busca uma função social do
contrato em oposição ao anterior princípio individualista. A função social do
contrato é prevista no art. 421 e declara que a sociedade não poderá ser
prejudicada em decorrência do desequilíbrio contratual e estabelece que a
interpretação de uma cláusula não poderá favorecer a uma só das partes pois o
art. 422 prevê que os contratos devem buscar sempre o equilíbrio entre os
contratantes. A Lei Civil, nessa nova postura, sentiu a necessidade de integrar
o contrato na sociedade, como meio de realizar os fins sociais.
Fins sociais estes elencados
ao longo de nossa Constituição que, principalmente, baseiam-se na distribuição
de riquezas, diminuição das desigualdades sociais e progresso social e
humanitário de forma igualitária.
3.
Pressupostos
Contratuais:
Os pressupostos contratuais
devem obrigatoriamente estar presentes no momento em que o contrato se realiza.
Também, estes pressupostos
possuem três distinções que facilitam seu entendimento de forma cabal, quais
sejam, dizem respeito aos sujeitos, ao objeto do contrato e à situação dos
sujeitos em relação ao objeto do contrato.
Em razão disto apresentam-se
os pressupostos imprescindíveis à qualquer contrato consubstanciados em:
- capacidade das partes – no
sentido de possuírem condições e a Lei atribuir os devidos efeitos àquele
determinado ato;
- objeto lícito – na medida
em que pressupõe-se à licitude e a plausibilidade do objeto do contrato; e,
- consentimento – o acordo
das vontades propriamente dito, livre de quaisquer vícios ou circunstâncias que
possam dar uma conotação diversa ao contrato;
A forma, no tocante às
formalidades, ao tipo de consentimento aceito, se expresso ou tácito por
exemplo, são modalidades de requisitos dos contratos e, tal dicotomia se faz
interessante, na medida em que auxilia na compreensão das causas de nulidade ou
anulabilidade destes contratos, entre outras acepções.
4.
Contratos
Comerciais:
De maneira geral, são
comerciais os contratos que se celebram nas atividades mercantis, reunindo-se
os empresários entre si, visando as atividades concernentes ao desenvolvimento
de suas respectivas atribuições, nos mais diversos negócios jurídicos
plausíveis.
No tocante a este aspecto,
Carlos Alberto Bittar[4]
ensina que levam-se em conta nesta
esquematização, os objetivos e os fins visados pelos contratantes; a etapa em
que se inserem os ajustes, a índole do negócio visado e outros fatores ligados
à própria contratação, em função, principalmente, da organização e da atuação
da empresa.
A distinção entre os
contratos comerciais e os contratos civis enseja controvérsia na medida em que
encontra-se dificuldade em caracterizar-se os atos do comércio.
Assim, como há contrastos
essencialmente civis, pois estranhos à atividade do comércio, existem outros
puramente comerciais. Tal dificuldade agrava-se quando os contratos são comuns
ao Direito Civil e ao Comercial, mas o interesse em distingui-los aparece não
só porque são diferentemente disciplinados, sob a égide de determinado
ordenamento jurídico, mas em decorrência do fato de que sua interpretação se dá
conforme preceitos diversos, cada qual com a sua peculiaridade.
A introdução no ordenamento
jurídico da idéia de empresa, facilita a distinção, contudo, esta só é tangível
diante de dados concretos relacionados ao objeto do contratado, as partes
envolvidas e demais aspectos já ventilados.
5.
O Depósito
Mercantil:
Esta espécie consubstancia-se
na guarda de bens ou de valores efetivadas por empresas especializadas que,
além deste serviço de guarda, colocam outros serviços à disposição dos
usuários.
Decorrentes da evolução
tecnológica relativa às comunicações e a expansão da atividade empresarial esse
contrato desdobram-se por várias nuances, de que o depósito é o modelo central
existente desde tempos antigos, como por exemplo, estacionamento de veículos,
depósito de bagagens, guarda de bens e custódia de valores.
Qualquer bem móvel pode ser
objeto de depósito, denominando-se como regular aquele celebrado com coisa
infungível, pois permite a restituição da mesma coisa entregue.
Ao contrário, é considerado e
chamado de irregular, o depósito de coisas fungíveis, pois com a tradição acaba
se operando a transferência de direitos, ficando a obrigação de restituir
suprimida não à mesma coisa entregue, mas a bens do mesmo gênero.
O contrato deve ser firmado
por escrito, salvo em casos particulares, em que não se documenta a operação ou
se recorre a documentos representativos do contrato. Aperfeiçoa-se com a
entrega simbólica do bem e, em certas atividades, existe a regulamentação
particularizada na qual se define o respectivo regime de armazenamento, de guarda
e de conservação dos bens.
5.1. Conceituação:
Constitui-se, o depósito
mercantil, em contrato bilateral, oneroso, comutativo e real, desenvolvendo-se
por força de atividade mercantil ou no respectivo exercício de atendimento dos
interesses do usuário.
Importante e imprescindível o
fator de confiança em sua celebração, pois incumbe-se o depositário de manter a
coisa no estado próprio, afim de manter à disposição do usuário e à sua
faculdade o objeto depositado, garantindo a este segurança na realização de
suas atividades.
6.
Contrato de Depósito e o Novo Código Civil:
O Código Comercial tratava de forma
específica o negócio jurídico de depósito mercantil em seus artigos 280 a 286.
Em seu artigo 121, porém, esclarecia que as normas do direito civil, aplicadas
aos contratos em geral, deveriam ser aplicadas aos contratos comerciais de
forma subsidiária, sempre respeitando os ditames da Lei Comercial. Dispunha que
o depósito teria natureza
mercantil se fosse feito por causa proveniente de comércio, em poder de
comerciante, ou por conta de comerciante. (artigo 280 do Código Comercial).
Com o advento do
Código Civil de 2002, em seu artigo 2.045, foi expressamente revogada a Parte
Primeira do Código Comercial, passando aquele a tratar, em seu Livro I – Do
Direito das Obrigações –, Título VI – Das Várias Espécies de Contrato -, dos
Contratos de Depósito de uma forma mais ampla, disciplinando não só os
contratos de depósito firmados entre particulares como também os de caráter
mercantil.
O artigo 966 do CC
conceitua empresário como aquele
que exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou
a circulação de bens ou de serviços. Assim, os contratos de depósito de caráter
mercantil serão todos aqueles em que figure um empresário ou a pessoa jurídica
de uma empresa como contratante.
Como já observado, pelo contrato de depósito recebe o depositário
um objeto móvel, para guardar, até que o depositante o reclame. A princípio
este contrato é gratuito, muito embora na grande maioria das vezes, em se
falando de relação empresarial, de depósito que resulte de atividade negocial,
este contrato seja oneroso. Nos casos de falta de determinação do valor da
retribuição, dispõe o parágrafo único do artigo 278, do CC, que em não havendo
um ajuste, deve-se determina-la pelos usos do local ou por arbitramento.
O novo código suprimiu a presunção da
culpa do depositário responsável pelo depósito que lhe foi entregue fechado,
colado, selado, ou lacrado nos casos em que este vier a ser devassado.
Disciplina também que a responsabilidade pela despesa de restituição é do
depositante, que deverá retirar a coisa no local em que foi guardada, não
impedindo, por outro lado, que de outra forma seja estipulado.
Nos contratos de depósito mercantil,
normalmente se deposita um objeto no interesse de um terceiro, que
posteriormente busca sua restituição. Contanto que o depositário seja
cientificado deste fato, não pode devolver a coisa para o depositante e
exonerar-se de suas responsabilidades de depositário sem que haja o
consentimento do terceiro interessado.
Outro ponto novo é a responsabilidade
do depositário quando, devidamente autorizado pelo depositante, confia a coisa
em depósito a terceiro. Agindo com culpa na má escolha, responderá pelo dano que
por ventura a coisa sofrer.
7.
Depósito de Coisas
Fungíveis
Preceitua o artigo 645 do Código
Civil que “o depósito de coisas fungíveis, em que o depositário se obrigue a
restituir objetos do mesmo gênero, qualidade e quantidade, regular-se-á pelo
disposto acerca do mútuo.”
No meio
empresarial são corriqueiros os contratos de depósito de coisas fungíveis, tais
como produtos agrícolas. Daí a
necessidade de observarmos alguns aspectos importantes sobre o Instituto do
Mútuo, regulado pelos artigos 586 a 592
do mesmo Diploma Legal.
Sendo assim, da mesma forma do
depósito, o mutuário, quando requisitada, é obrigado a restituir a coisa ao
mutuante. Com o depósito da coisa fungível, ocorre a transferência para o
depositário de todos os riscos inerentes a coisa, devendo restituí-la do mesmo
gênero, qualidade e quantidade.
Outro aspecto interessante é visto no
que diz respeito ao prazo de depósito de produtos agrícolas. Não sendo
convencionado expressamente este prazo, presume-se que tenha termo na próxima
colheita. Em se tratando de outro produto fungível que não os agrícolas, o
prazo de término do contrato de depósito será o que o depositante declarar.
8. Da Possibilidade de Ligação
de Contratos.
Ao falarmos de contratos de depósito
mercantil, fácil lembrar de outros contratos que podem ter relação direta com
ele. Diversos são os contratos previstos no Código Civil. Dentre eles alguns se
destacam por sua natureza empresarial.
Nada impede um prestador de serviços
de depósito, por exemplo, de atribuir a sua empresa a responsabilidade pelo
transporte do produto depositado. Neste caso observamos um contrato de dupla
responsabilidade: A de guardar a coisa e a de transportá-la. O transporte de
coisas é tratado pelos artigos 743 a 756 do Código Civil. Em assim se
contratando, entendemos pela necessidade de se convencionar o fim das
responsabilidades características de depositário a partir do momento do
embarque da coisa, passando, o negócio jurídico, a partir deste momento, a ser
tratado conforme os ditames referentes ao transporte de coisas.
Ao contrato de depósito pode estar
ligado um contrato de agência e distribuição (artigos 710 a 721 do CC).
Importante, da mesma forma, limitar as responsabilidades, determinado que o
agente distribuidor assume o papel de depositário enquanto o bem a ser por ele
distribuído estiver em seu estabelecimento.
8.1.
Do contrato de seguro:
Atualmente,
diante das incontáveis modalidades de seguros encontradas no mercado, nota-se a
plena possibilidade de contratação de seguro para as mais diversas modalidades
de contratos de depósito.
Como
é cediço, o contrato de seguro, autônomo, gera uma garantia e segurança
extremamente vantajosa para ambas as partes.
Em
razão da possibilidade de, no contrato de seguro, estipular-se o beneficiário,
bem como sobre quem recairá a incumbência dos pagamentos, a negociação é livre
nesse sentido, sendo certo de que a contratação desta espécie é essencial para
o equilíbrio contratual, bem como para o resguardo dos interesses das partes.
9.
Da Ação de Depósito:
A ação de depósito tem por fim exigir a
restituição da coisa depositada nos casos em que haja a negativa de sua
devolução por parte do depositário.
Conforme
determina o artigo 633, em regra, deve o depositário entregar o depósito logo
que se lhe exija. Todavia, é ressalvado a ele o direito de retenção nos casos
em que não tenha sido paga a retribuição devida ou o líquido valor das despesas
feitas com a coisa e os prejuízos que dela provieram, desde que devidamente
comprovados. Em assim não sendo, deve o depositário devolver a coisa assim que
for solicitada.
Caso contrário,
pode o depositário recorrer ao judiciário, exigindo a força coercitiva do
Estado a fim de reaver o seu bem, conforme artigos 901 a 906 do Código de Processo
Civil.
Assim, o
depositante pode peticionar o juízo competente requerendo que determine ao
depositário entregue a coisa no prazo de 5 dias ou deposite em
juízo ou consigne-lhe o equivalente em dinheiro ou conteste a ação.
Julgada procedente a ação, ordenará
o juiz a expedição de mandado para a entrega, em 24 horas, da coisa ou do
equivalente em dinheiro. Visando resguardar seu direito, pode o depositante,
ainda, requerer a busca e apreensão do depósito ou do equivalente em dinheiro.
Todavia, poderá ocorrer a ineficácia da busca e apreensão. Neste caso, poderá o
depositante prosseguir nos próprios
autos para haver o que lhe foi reconhecido na sentença, observando-se o
procedimento da execução por quantia certa.
Como vemos, muitas são as garantias
oferecidas pela legislação ao depositante no que diz respeito a devolução do
objeto depositado.
10. Depósito em Armazéns Gerais:
Em que pese o artigo 2.045, do Código
Civil, ter derrogado a primeira parte do Código Comercial, especialmente quando
essa nova lei for incompatível com as disposições do código comercial, e, não
havendo nova regulamentação, continuam aplicáveis as normas da lei supostamente
“revogada”.
O Código Comercial, nos artigos 87 a 98,
regulamenta as funções e obrigações dos trapicheiros e dos administradores de
armazéns de depósito, sendo considerados como verdadeiros comerciantes,
obedecendo às normas gerais dos comerciantes.
Ainda que a lei não tenha feito a exata
distinção entre trapiches e armazéns de depósito. A diferença é mínima:
“trapiche é o mesmo armazém de depósito, mas situado à beira-mar, à margem das
enseadas, portos ou ancoradouros, molhes ou sugidouros, destinado a receber
mercadorias importadas ou a exportar.”[5]
Por armazéns gerais compreendem-se
empresas que têm por finalidade a guarda e conservação de mercadorias, com a
faculdade de emissão, quando requerida, de títulos especiais que as representem
e que poderão circular, conjunta ou separadamente, mediante endosso dos seus
proprietários.
O funcionamento, direito e obrigações
destas empresas está regulado no Decreto nº 1.102/1903, com as alterações da
Lei Delegada nº 3, de 26 de setembro de 1962.
A constituição de empresas de armazéns
gerais deve obedecer a regulamentação do Novo Código Civil quanto as formalidades
ali especificadas, declarando, no objeto do seu instrumento de constituição, a
natureza das mercadorias que receberão em depósito e as operações e os serviços
a que se propõem, devendo, inclusive, elaborar um regulamento interno que
regerão as suas atividades. E obrigatório o registro das empresas perante a
Junta Comercial do Estado, no domicílio onde elas prestarão seus serviços.
11. O contrato de Depósito
Mercantil:
O contrato feito entre as
empresas e os depositários é um contrato de depósito, sendo o seu ponto
característico, a possibilidade deles poderem emitir títulos que podem ser
transferidos a terceiros pelo depositante, representando a cessão integral da
mercadoria ou significando apenas o penhor da mesma.
Predito contrato é
aperfeiçoado mediante a entrega efetiva das mercadorias, sendo um contrato
real, bilateral e oneroso.
Uma vez recebida as
mercadorias para guarda e conservação, os armazéns gerais, passarão um recibo
onde serão especificadas todas as características distintivas das mercadorias,
tais como a sua natureza, qualidade, número, marcas, peso, medidas ou contadas,
dependendo a minúcia da especificação da natureza dos bens a serem depositados.
O recibo passado pelo armazém
serve de prova do depósito e deverá ser devolvido ao mesmo, quando da retirada
das mercadorias ou quando ao depositante forem entregues, a seu pedido, o
conhecimento de depósito das mercadorias e o warrant, vez que como mais bem explicado a seguir, atestam o
depósito das mercadorias, substituindo o recibo de entrega.
As empresas, em função da sua
atividade e prestação de serviços, terão direito à percepção de uma remuneração
pelas mercadorias depositadas, de acordo com a tarifa aprovada pelo órgão
responsável, a qual será aplicada.
Não ocorrendo o pagamento das
despesas pelo depositante diante da conservação das mercadorias, estas poderão
ser retidas pelo armazém para pagamento das referidas despesas, além de outras
autorizadas pelos donos, como, por exemplo, adiantamentos feitos com frete e
seguro.
Por fim, poderá também o
armazém geral vender, em leilão público, as mercadorias que não foram retiradas
no prazo contratado e que forem consideradas abandonadas.
Os armazéns gerais respondem
pela guarda, conservação, imediata e fiel entrega das mercadorias que tiverem
recebido em depósito, sob pena de serem considerados depositários infiéis os
empresários, gerentes, administradores, sempre que não providenciarem a
devolução, dentro de 24 horas, depois que judicialmente requeridas.
No caso de avarias ou vícios provenientes
da natureza ou acondicionamento das mercadorias e de força maior, não há
responsabilidade do depositário, exceto se houver convenção com o depositante
para responsabilidade por parte dos armazéns por avarias, vícios intrínsecos,
falta de acondicionamento ou força maior.
Entretanto, respondem as
empresas pela culpa, fraude ou dolo de seus prepostos e, também, pelos furtos
acontecidos dentro dos armazéns, correspondendo a indenização ao preço da
mercadoria em bom estado no lugar e no tempo em que devia ser entregue.
Por sua vez, o depositante
tem a obrigação de pagar a remuneração do depósito e tem o direito de dispor
livremente as mercadorias, empenhando-as, mediante a cessão do warrant, ou transferindo a sua
propriedade, pro conta do endosso no conhecimento do depósito e do warrant.
11.1. Prazo:
O prazo para depósito das
mercadorias é de seis meses a contar da data da entrega nos armazéns, podendo,
entretanto, o prazo ser prorrogado mediante avença das partes. Uma vez
depositadas as mercadorias, estas ficarão à disposição dos seus donos, até o
momento em que dor solicitada a sua entrega, dentro do prazo contratual.
Quando vencido o prazo do
depósito, a mercadoria será considerada abandonada, obrigando o armazém geral
providenciar aviso ao depositante, para que no prazo máximo de oito dias,
providencie a retirada da mercadoria, conjuntamente com a devolução do recibo
de depósito, ou, o conhecimento e o warrant,
no caso de terem sido emitidos.
Na eventualidade do
depositante, mesmo após a sua ciência do termo contratual, não providenciar a
retirada das mercadorias, o armazém geral venderá as mercadorias em leilão
público, por corretor ou leiloeiro, devendo esse leilão ser anunciado com
antecedência mínima de três dias.
Do produto da venda serão abatidas
as importâncias relativas aos direitos e impostos que forem devidos à Fazenda,
as comissões e despesas da armazenagem e outras feitas pelo armazém geral, o
crédito devido ao portador do warrant,
acrescidos dos juros convencionais e da mora, as despesas de protesto do warrant, sendo, então, o saldo entregue
ao proprietário das mercadorias.
12. Conhecimento de Depósito
e Warrant:
Os armazéns de depósito têm,
como característica inerente, e sempre a pedido dos depositantes, a faculdade
de emitir o conhecimento de depósito e o warrant,
que servem para provar a disposição da mercadoria e a circulação do crédito por
parte do proprietário.
Preditos títulos são emitidos
conjuntamente, contudo, podem ser separados e negociados a teor do interesse do
depositante. O recibo de depósito é substituído pelo conhecimento e o warrant quando emitidos conjuntamente
Tanto o conhecimento de
depósito e o warrant exigem certas
formalidades, devendo ser emitidos à ordem, e, transmissíveis, por meio de
endosso dos seus proprietários, e sempre deverão conter a denominação do
armazém geral, sua sede e endereço, o nome do depositante ou terceiro por ele
indicado, sua profissão e domicílio, o termo inicial e final do depósito, a
natureza, especificações e particularidades das mercadorias, o valor do seguro
e a seguradora, declaração dos impostos, dos encargos e despesas em razão do
depósito, a data da emissão dos títulos e a assinatura do empresário ou seu
representante legal.
A emissão destes títulos
possibilita a circulação do crédito com a garantia àqueles que os adquirem, vez
que as mercadorias não poderão sofre penhora, embargo, seqüestro ou outra
medida de privação das mercadorias.
12.1. Conhecimento de
Depósito:
A finalidade essencial do
conhecimento de depósito é comprovar a propriedade das mercadorias depositadas.
Nesse passo, é um titulo
representativo das mercadorias e a sua cessão implica na transferência da sua
propriedade, e com isso, está cedendo a propriedade e livre disposição das
mercadorias, como verdadeira celebração de venda.
Entretanto, o novo
proprietário do conhecimento responderá pelo pagamento do warrant, a não ser que proceda com a consignação da importância
relativa ao warrant, se a dívida
ainda não estiver vencida.
É justamente por isso, que o warrant deve ser transcrito,
obrigatoriamente, no conhecimento de depósito, ensejando, destarte, a ciência
de que sobre as mercadorias pesa o penhor e seu respectivo débito.
12.2. Warrant:
O warrant é o instrumento
comprobatório de penhor que se fez sobre as mercadorias. A peculiaridade do
penhor decorrente do warrant é que não se faz a entrega dos bens depositados ao
credor, mas condiciona o proprietário à solvibilidade dessa dívida.
A fim de garantir o
adquirente do warrant, no título de conhecimento de depósito devem ser anotados
a importância da dívida, taxa de juros e data de vencimento do contrato,
ressaltando que as mercadorias só poderão ser retiradas dos armazéns pelo
proprietário, uma vez consignados o preço, os juros e as despesas relativas ao
penhor.
Em função das peculiaridades
e formalidades retro mencionadas no parágrafo anterior, o warrant deverá,
obrigatoriamente, ser transferido antes de ser cedido o conhecimento de
depósito, possibilitando a anotação do seu teor nesse documento, evitando, destarte,
a necessidade de aquiescência do portador do conhecimento, haja vista tratar-se
apenas de mera cessão de direito garantido pelo penhor.
Como verdadeiro título
representativo, o warrant, deverá ser apresentado no dia de seu vencimento para
o pagamento de dívida. Em não havendo o pagamento, o portador procederá com o
protesto do título junto ao Oficial de Protesto da Comarca competente.
Do protesto decorre o direito
do portador do warrant valer-se da venda pública, para que com o produto da
venda seja ressarcido, surgindo, também, o direito regressivo contra todos os
endossatários anteriores para haver o seu pagamento.
13. Venda Pública de Bens
Depositados:
Os armazéns gerais possuem a
faculdade de manter salas de vendas, no fito de proceder com a venda pública
dos bens depositados, com acesso irrestrito ao público em geral, onde serão
fornecidos exemplares de suas mercadorias para exame e conhecimento para os
interessados em adquiri-las.
As transações deverão ser
realizadas por meio de leiloeiros ou corretores escolhidos livremente pelos
proprietários, valendo lembrar que a venda deve ser anunciada pela imprensa com
o anuncio do dia, hora e condições do leilão, bem como as especificações
peculiares das mercadorias, e nome do armazém geral e o local onde as
mercadorias se encontram para análise.
Os anúncios de venda devem
especificar também, as condições de pagamento, o prazo para pagamento do preço
pelo arrematante. Uma vez não ocorra o pagamento do preço nesse período, as
mercadorias por ele arrematadas serão levadas a novo leilão, sendo que as
despesas daí decorrentes serão feitas por sua conta e risco.
Caso o preço dessa nova
arrematação não atinja o preço da arrematação anterior, o arrematante
inadimplente terá a obrigação de completar a diferença do preço, além do sinal
dado, em prol do vendedor.
14. Conclusão:
15. Bibliografia:
BITTAR,
Carlos Alberto. 1939 – 1997. Contratos Comerciais / Carlos Alberto Bittar. – 3ª
. rev., atual. e ampl. de acordo com o novo Código Civil / por Carlos Alberto
Bittar Filho. – Rio de Janeiro. Forense Universitária, 2003.
BULGARELLI,
Waldirio. Contratos e Títulos Empresariais: as novas perspectivas / Waldirio
Bulgarelli. - São Paulo. Atlas, 2001.
COELHO,
Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial / Fábio Ulhoa Coelho. – 15ª ed. Ver. E
atual.. – São Paulo. Saraiva, 2004.
GOMES,
Orlando. Contratos. – 12ª ed. - Rio de Janeiro. Forense, 1993.
MARTINS, FRAN, Contratos e obrigações
comerciais, ed. ver. e aum., Rio de Janeiro, Forense, 1993.
MENDONÇA, CARVALHO DE, Tratado, vol. V.
2ª parte, nº1.075
PAESANI,
Liliana Minardi. Aplicação do novo código civil nos contratos empresariais:
modelos contratuais empresariais / Liliana Minardi, Elisa Yamasaki Veiga. –
Barueri, SP. Manole, 2004.
Demais
fontes:
www.planalto.gov.br / www.stf.gov.br / www.stj.gov.br / www.tj.sp.gov.br
Código Civil
Código de
Processo Civil
Código de Defesa
do Consumidor
16. Minuta de contrato de depósito:
CONTRATO
DE DEPÓSITO MERCANTIL DE BEM MÓVEL
IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES
CONTRATANTES
DEPOSITÁRIA: (Nome da
Empresa), com sede em (xxx), na Rua (xxx), nº (xxx), bairro (xxx), Cep (xxx),
no Estado (xxx), inscrita no C.N.P.J. sob o nº (xxx), e no Cadastro Estadual
sob o nº (xxx), neste ato representada pelo seu diretor (xxx), (Nacionalidade),
(Estado Civil), (Profissão), Carteira de Identidade nº (xxx), C.P.F. nº (xxx),
residente e domiciliado na Rua (xxx), nº (xxx), bairro (xxx), Cep (xxx), Cidade
(xxx), no Estado (xxx);
DEPOSITANTE: (Nome da
Empresa), com sede em (xxx), na Rua (xxx), nº (xxx), bairro (xxx), Cep (xxx),
no Estado (xxx), inscrita no C.N.P.J. sob o nº (xxx), e no Cadastro Estadual
sob o nº (xxx), neste ato representada pelo seu diretor (xxx), (Nacionalidade),
(Estado Civil), (Profissão), Carteira de Identidade nº (xxx), C.P.F. nº (xxx),
residente e domiciliado na Rua (xxx), nº (xxx), bairro (xxx), Cep (xxx), Cidade
(xxx), no Estado (xxx).
As partes acima identificadas
têm, entre si, justo e acertado o presente Contrato de Depósito Mercantil de
Bem Móvel, que se regerá pelas cláusulas seguintes e pelas condições descritas
no presente.
DO
OBJETO DO CONTRATO
Cláusula 1ª. O presente tem
como OBJETO o depósito do bem móvel (xxx) (Descrevê-lo completamente) feito
pela DEPOSITANTE à DEPOSITÁRIA, que desde já se compromete a
mantê-lo sob sua guarda, sem qualquer tipo de remuneração pelo serviço1.
DA
MANUTENÇÃO, GUARDA E RESTITUIÇÃO DO BEM
Cláusula 2ª. A DEPOSITÁRIA
se compromete a guardar única e exclusivamente em seu poder o bem objeto deste
contrato, como também a restituí-lo quando a DEPOSITANTE o requerer2,
não havendo prazo ajustado para que seja feita referida restituição.
Cláusula 3ª. Fica
estabelecido que não havendo a restituição3, a DEPOSITÁRIA
estará sujeita às penas da lei.
Cláusula 4ª. A DEPOSITÁRIA
se compromete a realizar mensalmente um relatório das condições as quais o bem
se encontra, bem como o que foi gasto para sua conservação, ou seja, as
despesas necessárias à conservação do mesmo.
DAS
DESPESAS
Cláusula 5ª. A DEPOSITANTE,
caso haja despesas para a conservação, restituirá à DEPOSITÁRIA, após
analisar o relatório e averiguar o bem4.
CONDIÇÕES
GERAIS
Cláusula 6ª. O presente
contrato passa a vigorar entre as partes a partir da assinatura do mesmo.
Cláusula 7ª. As partes desde
já acordam que, responderá por perdas e danos aquela que infringir quaisquer
cláusulas deste contrato, aplicando-se a este complementarmente o que dispõe o
Código Civil Brasileiro à matéria.
DO
FORO
Cláusula 8ª. Para dirimir
quaisquer controvérsias oriundas do CONTRATO, as partes elegem o foro da
comarca de (xxx);
Por estarem assim justos e
contratados, firmam o presente instrumento, em duas vias de igual teor,
juntamente com 2 (duas) testemunhas.
(Local, data e ano).
(Nome e assinatura do Representante
legal da Depositária)
(Nome e assinatura do Representante
legal da Depositante)
(Nome, RG e assinatura da Testemunha
1)
(Nome, RG e assinatura da Testemunha
2)
________
Nota:
1. Art. 1.265, do Código
Civil.
2. Art. 1.266, do Código
Civil.
3. Podem existir exceções a
essa regra: Arts. 1.268, 1.269 e 1.279.
4. Art. 1.278, do Código
Civil.
17.
Compendio Jurisprudencial:
[1] GOMES, Orlando. Contratos. – 12ª ed. Pg. 25/26.
[2] GOMES, Orlando. Contratos. – 12ª ed. Pg. 43.
[3] PAESANI, Liliana Minardi. Aplicação do novo código civil nos contratos empresariais. Pg. 18.
[4] BITTAR, Carlos Alberto. 1939 – 1997. Contratos Comerciais / Carlos Alberto Bittar. Pg. 03.
[5] MENDONÇA, Carvalho de, Tratado, vol. V. 2ª parte, nº1.075, nota 2.