segunda-feira, 23 de junho de 2008

Princípios biológicos do treinamento físico (III) - Reversibilidade

O organismo humano, apesar de níveis elevados de redundância, próprios de todos os seres vivos, apresenta um grau elevado de eficiência e economia.

O ferro e os constituintes proteicos dos milhões de células sanguíneas que colapsam diariamente são quase completamente reutilizados para a montagem de novas células.

As proteínas que se tornam desnecessárias deixam de ser sintetizadas, assim como a sua retenção.

A consequência do dinamismo das estruturas orgânicas para o atleta é a rápida reversibilidade das adaptações de treino uma vez interrompida a atividade sistemática de preparação.

O músculo esquelético hipertrofia como resposta a uma determinada atividade regular e contínua e atrofia quando o treino para.

Do mesmo modo, os ganhos em mobilidade articular, obtidos e mantidos ao longo de vários meses de treino regular de flexibilidade perdem-se com a interrupção dos respectivos exercícios.

Todas as alterações do organismo conseguidas através do treino têm uma duração definida. Isto significa que são transitórias e necessitam de um trabalho contínuo de solicitação para se manterem.

É claro que há adaptações mais duradouras que outras, como veremos á seguir. Acontece, também, que muitas das adaptações de treino, principalmente aquelas provenientes dos efeitos acumulados da carga, que implicam alterações estruturais no organismo, têm um certo grau de permanência e, mesmo após períodos relativamente prolongados de “destreino”, não retornam exatamente para nível inicial.

No entanto, níveis elevados de capacidade de desempenho necessitam de uma solicitação contínua dos seus fatores determinantes sob pena de ocorrer perda de uma ou mais capacidades com consequente diminuição da forma desportiva, ou seja, da capacidade de realizar boas marcas em competição.

O princípio da reversibilidade do treino declara que, do mesmo modo que a atividade física regular resulta em adaptações fisiológicas determinadas que permitem melhores desempenhos desportivos, assim interromper ou reduzir de um modo importante o nível de treino leva a uma reversão parcial ou completa destas adaptações, comprometendo a capacidade de desempenho anteriormente mostrada.

Durante um período de interrupção da atividade em atletas bem treinados observam-se alguns efeitos no desempenho, designados por “destreino”, e que constituem processos de reversão das adaptações orgânicas provocadas pelo exercício sistemático. Os efeitos mais óbvios são a rápida redução do VO2max, do desempenho aeróbio e do limiar anaeróbio.

Isto poderá estar dependente da dinâmica das alterações na atividade enzimática e no volume sistólico (Coyle et al., 1984).

Um decréscimo de 12% no volume sistólico pode ocorrer após 2 a 4 semanas de destreino, sendo acompanhado por um decréscimo da atividade das enzimas oxidativas mitocondriais SDH e oxidase citocromica (Wilmore & Costill, 1999).

Em atletas de elite, a densidade capilar mantém-se elevada durante mais tempo, até por volta de 12 semanas, e a densidade mitocondrial só estabiliza na 8ª semana de destreino, mantendo-se, no entanto, acima dos valores pré-treino.

Assim, após 2 meses de interrupção, os atletas de fundo perderão grande parte mas não a totalidade das suas adaptações funcionais.

A perda das adaptações anaeróbias é mais lenta. No que diz respeito às enzimas chave do processo glicolítico, foram registradas diferenças mínimas da sua atividade mesmo após quase 3 meses de destreino.

Isso não significa que o desempenho não sofra quebras significativas, pois este depende de muitas outras variáveis (Mujika & Padilla, 2000).

É provável que muitos atletas consigam manter o fundamental das suas adaptações aeróbias durante um período longo de tempo apesar de uma redução significativa da carga de treino.

Para que isso aconteça, será conveniente manter alguma estabilidade ao nível da intensidade, reduzindo-a não mais de 20%, preservar uma frequência de treinos semanais ainda importante (não reduzir mais de 30%, ou seja, repousar 2 a 3 dias por semana em vez de um) e, deste modo, reduzir significativamente o volume, até 70-80% do que o atleta vinha fazendo no período imediatamente anterior.

Referências:
Verkhoshansky, Y. (2002). Teoría e metodología do trenamento desportivo. Barcelona: Ed. Paidotribo.

Mujika, I., & Padilla, S. (2000). Detraining: loss of training-induced physiological and performance adaptations. Part I: short term insufficient training stimulus. Sports Med.,30(2): 79-87

Coyle, E.F., Martin III,W.H., Bloomfield, S.A., Lowry, O.H., & Holloszy, J.O. (1984). Time course of loss of adaptations after stopping prolonged intense endurance training. J. Appl. Physiol., 57(6): 1857-1864.

Um comentário:

  1. Oi Alvaro!
    Obrigada pela visita e elogios ao Cuidando do Corpo.blogspot.com
    Seu comentário foi muito relevante, pois tenho algumas amigas virtuais adeptas de dietas sem acompanhamento profissional que necessitam de orientações como as que publico lá e as observações que vc fez.
    Tenho procurado sites e blogs sobre educação física e encontro poucos, então, fique a vontade para passar por lá de vez em quando, vc já está na lista dos meus favoritos.

    abçs
    Vânia

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