sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Alberto João Jardim: o senhor hipérbole e a coisa pública



Jardim integra o grupo dos políticos, raros, que acredita piamente terem a qualidade, também escassa, de serem providenciais.
Perdido num ego alimentado por mais de três décadas, está condenado à inevitabilidade maldita dos monarcas que se lhe assemelham: não ter sabido sair de cena. Será isso - e é provável que a parca lucidez já não lhe permita ver a evidência - que, fatalmente, lhe roubará o que o motiva (depois do desgosto de nunca ter conseguido desembarcar triunfantemente no Terreiro do Paço): um lugar repousante na História.

Rei da "sua" ilha (como não se coíbe de lhe chamar), Jardim tornou-se, com o passar dos anos, um prisioneiro dela.
Amargurado, rezingão. Cercado.

Creio que nunca terá pretendido lucrar pessoalmente, no sentido venial, dos tentáculos do seu poder. Por uma razão elementar: não é esse o móbil de um homem com o seu fascínio por, pura e simplesmente, mandar.
É possível que aqui e ali, na teia de favorecimentos que indubitavelmene estabeleceu (sempre para solidificar a sua força), tenha saboreado, porventura amargamente, o privilégio dos dinheiros alheios.
Mas o que realmente interessa é a irrelevância disso mesmo e o absurdo do portuguesíssimo raciocínio para justificar os desmandos dos tiranos: ao menos - costumam dizer - "não encheu os bolsos".
Não sei. Acredito que não. Mas também pouco interessa, perante o despudor das últimas revelações.

O que é dramático no que agora se soube da Madeira e na forma como Alberto João reagiu é a gravidade do descaramento que é tão característico da nossa cultura política. A assunção, sem vergonhas, de que Jardim, cego pelo festim de pequenos domínios forjados na ilha a que acabou acorrentado, já perdera o norte a ponto de a coisa pública não mais interessar.
Sim, porque do que se tratou foi tão-somente disso mesmo: na vertigem dos desmandos e no cúmulo da hipérbole a que se habituou a ter direito, Alberto João transformou, inebriado, a coisa pública em coisa sua. Tout court.

Para isso, não há desculpa.
Não há obra - pior ou melhor, discutível ou não - que valha.
O fim (que já não está longe) vai ser amargo. E tão cruel - é sempre - como a solidão do ilhéu.