domingo, 21 de março de 2010

A MODA ATRAVÉS DOS TEMPOS -A moda indumentária a.C. (continuação)


Com a chegada da cor, o conceito de moda/indumentária começaria a mudar; e, a comercialização da novidade expandiria os horizontes, transformando, passo a passo, as fronteiras. Reaparece a região da Anatólia, atual Turquia, berço da poderosa civilização Hitita, bem como cidades tais: Uruk, Lagash, Ur, Nippur e Kish. E o mundo vai ganhando terreno. Ao sul desta região, encontrava-se o Egito, com Tanis, Menfis, Tebas... E espremida em uma faixa estreita e montanhosa, entre o mar Mediterrâneo e a orla do deserto, tínhamos Canaã.
Esta poderosa terra constituía o elo de ligação entre o Egito e a Ásia, o que a tornava estrategicamente importante para os interesses políticos e econômicos da região, e nisso incluía o comércio da moda/indumentária. Pois esta precisou deste intercâmbio para se firmar como um diferencial na vida das pessoas.
E não é só. Os cananitas conseguiram desde tempos remotos extrair de um caramujo do mar, o murex, nativo da região, uma tinta azul púrpura, muito famosa e apreciada na época. A descoberta da cor púrpura foi de tamanha importância para este povo, que até a região foi batizada com a cor: Canaã significa “Terra da Púrpura”. Foi uma tinta tão rara e difícil de manufaturar que a cor púrpura passou a designar poder e bom gosto, e assim, apenas os muitos ricos usavam roupas com esta tonalidade.
Mas, a natureza não poupou colorir a região e o mundo, dando a Canaã uma paleta de cores. O amarelo vinha das romãs e do açafrão; o vermelho, cor do fogo, era conseguido da raiz da garança ou mesmo do cártamo; fazia-se também a cor azul, seja celeste ou pastel, e para isso, usavam o murex, mas com técnicas de produção que os permitiam produzir uma infinidade de tons e subtons. As damas da corte, de todas as nacionalidades, cobiçavam o maravilhoso pó azul de lápis-lazúli – para colorir as pálpebras – e o estíbio – cosmético para os cílios; e os ricos não deixavam de mandar suas roupas para serem tingidas pelas grandes tinturarias, um verdadeiro sucesso!
E mais, em Canaã florescia o comércio de ouro e especiarias da Núbia; cobre e turquesa das minas do Sinai; marfim, linho, prata da região do Tauro; vasos de vidro de Creta e couro de Biblos.
Os cananitas, que contribuíram até 3.000 a.C, a partir de então passam a serem conhecidos como fenícios, e logo depois, por volta de 800 a.C como púnicos. Os fenícios foram a primeira grande potência marítima que se tem registro na história, traçando um comércio que abrangia o norte da África, a costa oeste Africana até Gâmbia e Senegal, as ilhas Canárias, Mogador, o Bósforo, a Itália, Sardínia, as ilhas Britânicas, Espanha e ilhas Baleares.9
As tecelãs fenícias também conseguiam produzir um misto de lã e linho, muito utilizado na confecção das roupas; mas, também era possível adquirir seda diretamente da China. Sem esquecer que os fenícios foram os primeiros a produzirem tecidos estampados, usando o método do stencil. Eram capazes de produzir uma técnica de estamparia em blocos e ainda a tecelagem trabalhada em fios coloridos que formavam uma estampa inigualável. Além, é claro, de terem desenvolvido a arte de bordar; seus bordados eram em cores ricas e vibrantes; mas, apenas os muitos ricos usavam roupas assim, uma vez que o dinheiro empreendido na confecção de tais “obras de arte” era demasiadamente alto.
Por fim, quando as cores passaram a fazer parte da cultura difundida na época, as roupas brancas tornaram-se símbolos de luto, pobreza ou penitência. E as cores passaram a significar status, poder, luxo e requinte; tanto que algumas cores ficaram restritas à nobreza. Por exemplo, durante a república dos Caesares e mesmo algum tempo depois, apenas os senadores, reis e déspotas usavam roupas de cor púrpuras.
Os hebreus, com base no Velho Testamente, única fonte de esclarecimentos acerca, usavam basicamente roupas folgadas e drapeadas, até como proteção do sol e da areia dos desertos. As mulheres, exceto meretrizes, cobriam as cabeças e mantinham os cabelos presos. A indumentária consistia em uma túnica sem mangas, longa até os tornozelos, acrescida de outra, com mangas. As cores não eram predominantes, apenas usava-se tons naturais ou da terra e pequenos motivos geométricos feito pelos tecelões.
Já na Grécia antiga, era costume usar o quíton, normalmente feito de duas peças de pano costuradas; por cima desta peça, ainda, podia-se usar a clâmide uma espécie de capa curta, geralmente presa em um dos ombros pela fíbula. Sendo importante ressaltar que, esta capa também podia ser usada sozinha, sem nada por baixo. Ao contrário de outros povos, os gregos não viam a nudez como algo imoral, portanto, não pestanejavam em mostrar as partes pudentas, inclusive, homens e mulheres gostavam de se exercitar nus.10 Porém o efeito era estético, não erótico.
A versão feminina da clâmide era conhecida como peplo, e também usada sobre o quíton que ia até os pés. Note, que a moda feminina grega, mesmo a contragosto de leis suntuárias impostas contra o luxo excessivo de seus trajes, não fez cessar a busca por tecidos como a seda, extremamente finos e delicados. E, por fim, não esqueçamos de mencionar o himation, a capa ampla que, durante os dias frios era usada; chegava a medir até 2,40 m por 1,80 m e podia ser usada por homens e mulheres.11

Os gregos gostavam de proteger a cabeça, por isso, dispunham do uso de gorros, os pilos, dos chapéus de abas, os petasos e até mesmo das dobras da vestimenta. Tinham preferência por cores fortes como o vermelho, o amarelo e o roxo e principalmente adoravam bordados variados, desde formas geométricas como rosetas, círculos, estrelas e outros, até folhas de acanto e louro, ondas, meandros ou animais.
A civilização antiga, da grande Roma, não poderia ficar de fora. Durante a república dos caesares, as roupas copiaram a simplicidade dos gregos. Como dizia o poeta Horácio: “a Grécia cativa cativou os romanos”.12 Os homens usaram a toga e a stola; e as mulheres uma veste longa e ajustada, sem cinto, com meia manga, e às vezes um decote nas costas fechado por fitas.
A toga romana, com os anos ficou mais volumosa, além de pregueada. Talvez, por isso mesmo, neste período, usada apenas pelas pessoas abastadas, pois impedia qualquer atividade mais rigorosa. Os meninos livres, até completarem a puberdade, usavam a toga praetexta com barrado roxo, símbolo do homem livre; e, quando completassem os anos certos, trocavam-na pela toga virilis, na cor branca; no período de luto vestia-se uma toga com abertura pela cabeça, de cor preta.
Com o passar dos anos, a toga foi diminuindo de tamanho, e passou de um pallium a uma pequena tira de tecido, conhecida como estola. Depois, por cima, os homens passaram a usar um saiote, simples, feito de linho, que acabou substituído por uma túnica (antigo quíton grego). O tamanho da vestimenta chegava ao joelho, a não ser em ocasiões especiais, quando pedia-se que ela fosse até o chão.
O quíton grego, bem como seu equivalente romano, era uma capa, feita de dois pedaços de tecido costurados (tinha que vestir pela cabeça e amarrar com um cinto) usada sob as togas pelas classes superiores; classes inferiores vestiam apenas a túnica.

Ao longo dos anos, a túnica foi ganhando adereços, como as mangas até os cotovelos, chamada “dalmática” ou os bordados que a faziam ganhar o nome de tunica palmata. A vestimenta ganhou depois, duas novas túnicas, usadas na maioria das vezes, juntas. A primeira, de baixo, chamava-se subacula; a outra, para ser usada por cima, chamava-se tunica exteriodum, que em 100 d.C passou a se chamar caracalla.13 Depois da morte do imperador Nero, a dalmática e a toga caíram em desuso e a túnica longa passou a prevalecer.
Neste período, como já mencionado, usavam-se apenas calças (ou seja, calções ou tiras largas enroladas como calças) os povos considerados bárbaros. Os romanos eram demasiadamente rígidos no sentido de admitirem quebrar certas tradições, a ponto de remodelarem sua indumentária tão radicalmente ao que estavam acostumados. A maioria dos povos, ditos bárbaros (os godos, visigodos, ostrogodos, gauleses, etc), é que gradualmente, passaram a assimilar as roupas dos romanos, apenas os diferenciando pelo tecido inferior e o uso dos ditos calções.

Quanto às roupas das mulheres, estas não se diferenciavam muito das masculinas, exceto pelo corpete usado sobre o busto, o strophium (quase um biquíni moderno). As túnicas femininas eram apenas mais longas, cobrindo os pés; as mulheres gostavam muito das cores fortes, como o vermelho, azul, amarelo e dourado para os ornamentos (quase sempre bordados). Também usavam estolas de mangas compridas e xales, as pallas de seda; cobriam a cabeça com véus, lenços e capuzes e eram adeptas do ferro de encrespar os cabelos, dos descolorantes, apliques, perucas e penteados elaborados.
Indo agora para o Egito, pois que de todos os povos, foram certamente os que mais contribuições deixaram para a história, retratando para a posteridade seus costumes e vestimentas, através de pinturas das mais diversas possíveis encontradas em pirâmides e templos, encontramos uma moda, que durante quase 3 mil anos manteve-se, praticamente, estática. Esse povo manteve essa qualidade em suas vestes, mudando muito pouco no decorrer dos anos.
No Antigo Império (antes de 1.500 a.C), usou-se o chanti, um pedaço de tecido variante da tanga e preso por um cinto. Para os de classe mais elevada, este era engomado, pregueado, e por vezes, até bordado. No Novo Império (de 1.500 a.C – 332 a.C) usou-se túnicas longas, franjadas, chamadas calasires, sendo toda semitransparente, permitindo ver o chanti por baixo. Frise-se, que quando usada pelas mulheres, esta vestimenta produzia um efeito ajustado sob os seios.12
Na maioria das vezes, os egípcios também usavam uma capa curta cobrindo os ombros, ou, então, uma gola larga adornada com jóias, que deixava tanto nos homens, quanto nas mulheres, os seios à mostra. E diferentemente de outros povos, eles não costumavam utilizar lã para a confecção de suas roupas, pois consideravam as fibras animais impuras, preferindo o uso do linho.

E, após a conquista Alexandrina, embora permitida a fabricação de roupas comuns, as vestes dos sacerdotes e as usadas em funerais continuaram, ainda, proibidas de serem confeccionadas.14
Mas, mesmo tendo os trajes egípcios permanecidos inalterados por infindáveis anos, foi impossível mantê-lo totalmente imutável, principalmente, depois das conquistas estrangeiras, que aos poucos foram ganhando espaço; não tendo sido de todo alterado apenas no que se tratasse de cerimoniais festivos e religiosos. Estas indumentárias tradicionais foram mantidas por mais de 30 dinastias.
No mais, o povo egípcio em geral usava pouca roupa, quase sempre uma tanga; os ricos adoravam as transparências, que permitiam ver o colorido da pele e suas curvas, também um gorro de feltro ou de um pano listrado, o klaphe. Os faraós, a mitra e barba postiche. As mulheres, um tipo de sarongue, que atingia os seios, preso por alças; ambos os sexos gostavam de ornamentos como o besouro, o escaravelho, o abutre, o falcão e outros que enfeitavam.
Já na Europa antiga, precisamente na chamada Idade do Bronze, provavelmente 1500 a.C. tribos indo-européias formadas por celtas, germânicos, iberos, trácios, dácios e citas tiveram como vestimenta primaria um retângulo enrolado no corpo, preso por um cinto. Nessa época os acessórios também eram demasiadamente importantes.
O traje masculino era composto de capa, tunica retangular de lã, sem mangas, cinto, gorro, perneiras presas por tiras – forma primitiva de calças – e sapatos de pele de couro curtido, com tiras ou ligas. O cabelo era comprido, às vezes preso por chinó ou trançado. Os homens usavam bigode e barba e nas guerras não dispensavam os capacetes de chifres ou carcaças de animais, pois criava um aspecto repulsivo.15
As mulheres vestiam saias, presas por um cinto, atingindo os tornozelos, com blusas ou túnicas curtas; calçavam sapatos iguais aos dos homens. O cabelo podia ser solto, trançado ou preso por fitas, em rabo-de-cavalo. Nessa época, as roupas eram tingidas com plantas silvestres e a lã, o cânhamo e o linho empregados na tecelagem. 16
Assim sendo, não é de hoje que vemos que a moda/vestimenta/indumentária é uma constante na vida das pessoas. E podemos dizer que, graças às descobertas arqueológicas ela é mais antiga do que imaginávamos; e, sem desconsiderarmos seu lado fashion, que provavelmente existe a milhares de anos, e diga-se, com a mesma relevância para reis ou plebeus.


A moda do século I ao século XV será nosso próximo tema, aguardem!!!

1 comentário:

  1. 9) GARCIA, Patrícia Douat. Baal – o deus da moda. Disponível em: http://www1.uol.com.br/modabrasil/forcas_moda/deuses/index2.htm Acesso em 20 mar. 2004.
    10) LAVER, James. A roupa e a moda: uma história concisa. São Paulo: Companhia das Letras, 1989, p. 30-31.
    11) Idem. Ibid.
    12) NERY, Marie Louise. A evolução da indumentária: subsídios para criação de figurino. Rio de Janeiro: Ed. Senac Nacional, 2004, p. 46.
    13) LAVER, James. Op. Cit., p. 40.
    14) Idem. Op. Cit., p. 18
    15) NERY, Marie Louise. A evolução da indumentária: subsídios para criação de figurino. Rio de Janeiro: Ed. Senac Nacional, 2004, p. 32.
    16) Idem.

    6) desenho representando o modo de vestir da antiga civilização egípcia. Disponível em: http://www2.uol.com.br/modabrasil/forcas_moda/joia_roupa/index.htm Acesso em 24 abr. 2004
    7) desenho representativo da indumentária grega. Disponível em: http://www.modanahistoira.blogspot.com/ Acesso em 17 dez. 2007.
    8) desenho representativo do quíton. Idem.
    9) quadro representativo da indumentária romana. Idem.
    10) pintura representativa da indumentária egípcia. Idem.

    ResponderEliminar