“Contenham esse avanço... Façam qualquer coisa, por menor que seja... Mantenham aberta ainda que seja uma só porta dentre cem, pois conquanto que tenhamos pelo menos uma porta aberta, não estaremos numa prisão.”
(G.K.C)

segunda-feira, 7 de julho de 2008

A importância da leitura dos clássicos



Chamemos de “os clássicos”, a literatura universal que vai, mais ou menos, de Homero e Virgílio até Fielding e Dickens.

Por que lê-los? Creio que a importância de ler os clássicos não reside somente no grandioso estilo literário e na inspiração emotiva, senão pela visão equilibrada das idéias e da exposição de verdades mais completas. Os clássicos aguçam nossos sentidos contra as meias verdades e as idéias modernas tidas como inéditas e originais. Aprendi isso com Chesterton, que dizia que “na história da humanidade, aparecem de tempos em tempos, de maneira especial em épocas agitadas como a nossa, certas coisas, que no mundo antigo se chamavam heresias. No mundo moderno, chamam-se modas. Às vezes, são úteis durante certo tempo; outras são completamente nocivas. Porém, sempre se conciliam, graças a uma convergência indevida em torno de uma verdade, ou de uma meia verdade”. O herege, nesse caso, é uma analogia, é um empréstimo do vocabulário religioso e aplicado de forma mais abrangente. "O herege não é um homem que ama demasiadamente a verdade. O herege é um homem que ama sua verdade mais que a verdade mesma. Prefere as meias verdades que descobriu, à verdade completa que a humanidade tem encontrado. Ele não gosta de ver seus preciosos paradoxos misturados a vinte obviedades na trouxa da sabedoria universal".

O conhecimento dos clássicos nos faz identificar “heresias” da modernidade, é muito provável que uma idéia tida como original, se encontre dividida em todos os grandes livros de caráter mais clássico e imparcial. Podem-se encontrar todas as novas idéias em livros antigos, só que ali as encontraremos equilibradas, no lugar que lhes corresponde e, às vezes, com outras idéias melhores que as contradizem e as superam. Os grandes escritores não deixavam de lado uma moda porque não haviam pensado nela, mas porque haviam pensado também nas outras respostas.

Chesterton nos dá um exemplo disso. Nietzsche, como todos sabem, pregou uma doutrina que ele e seus seguidores aparentemente consideravam muito revolucionária; sustentaram que a moral altruísta comumente havia sido uma invenção de uma classe escrava para evitar que em tempos posteriores surgisse alguém que a sobrepujasse hostilmente. Os modernos, estando ou não de acordo com ele, sempre se referem a essa idéia como algo novo e jamais visto. Supõe-se que os grandes escritores, digamos Shakespeare, por exemplo, não sustentou essa idéia porque jamais havia pensado nela. Recorramos ao último ato de Ricardo III de Shakespeare e encontraremos não só tudo o que Nietzsche tinha a dizer, resumido em duas linhas, mas também as mesmas palavras de Nietzsche. Ricardo o corcunda, disse:

Consciência é só uma palavra que usam os covardes,
Criada, a princípio, para infundir terror aos fortes.


O fato é evidente. Shakespeare havia pensado no que Nietzsche pensou, porém o deu seu próprio valor e pôs no lugar que lhe corresponde. Este lugar é a boca de um corcunda meio louco nas vésperas da derrota. Essa raiva contra os debilitados só é possível em um homem valente, porém fundamentalmente enfermo; um homem como Ricardo, um homem com Nietzsche. Podemos ver um exemplo, dentre vários, da falsa idéia de que estas filosofias são modernas no sentido de que os grandes homens do passado não pensaram nelas. Não se trata de Shakespeare não ter visto a idéia de Nietzsche; ele a viu, porém viu muito além dela.

O que chamamos de idéias novas são, geralmente, fragmentos das velhas idéias. Não é que uma idéia particular não tenha ocorrido a Shakespeare. É que, simplesmente, ele encontrou muitas outras para livrar-lhe da tolice.

Nenhum comentário: