A montanha mágica

segunda-feira, junho 30, 2003

CINEMA



"Aos 96 anos
Morreu a actriz Katharine Hepburn

AFP

A actriz norte-americana Katharine Hepburn morreu na sua residência aos 96 anos foi hoje avançado.
A actriz, que participou em mais de 50 filmes e ganhou quatro óscares, vivia em Old Saybrook, no Connecticut, Nordeste dos EUA.

Hepburn sofria de vários problemas de saúde, nomeadamente da doença de Parkinson, que nos últimos anos a mantinha bastante fragilizada.

Nascida a 12 de Maio de 1907, em Hartford, Hepburn ganhou o seu primeiro Óscar de Melhor Actriz em 1934 pela sua interpretação em "Morning Glory". Trinta anos mais tarde, em 1967, recebe a sua segunda estueta pelo desempenho em "Guess Who's Coming To Dinner" e a terceira e quarta por "The Lion In Winter" (1968) e "A Casa do Lago" (1981). " (in www.público.pt)

"MADRID.- "¡Tiene cara de caballo!". Tras la primera prueba en pantalla de Katharine Hepburn, un ejecutivo de la cadena RKO soltó esta recordada frase. Por su mente no pasaba que la chica que tenía en pantalla se convertiría en un mito de Hollywood. Éstas son algunas de las frases que se dijeron sobre ella:


"Idolatro a esa maldita mujer. Nunca lo he pasado mejor trabajando con ninguna otra persona, ni siquiera con Richard Burton" (Peter O'Toole)

"Siempre admiré más los pómulos de Katharine Hepburn que sus películas. ¡Hubiera matado por esos pómulos!" (Bette Davis)

"Nosotros sólo nos acostumbramos a trabajar juntos. Aunque me interrumpía, no me importaba, y volvía a lo mío cuando ella acababa. Nosotros sólo nos habituamos a trabajar juntos. Eso fue todo" (Spencer Tracy)

"No puedo imaginarme a Rhett Buttler intentando cazarte durante diez años" (David O. Selznick)

"¡Dios mío, qué cara de caballo!" (Un ejecutivo de la RKO al ver su primera prueba en pantalla)

"Hay mujeres, y además está Kathe. Hay actrices y actrices, y además está Hepburn" (Frank Capra)"

in elmundo.es



posted by Luís Miguel Dias segunda-feira, junho 30, 2003

LITERATURA



Uma corrida eleitoral e uma longa história

“Era, realmente, um grupo muito curioso todo aquele pessoal que se juntou na margem – pássaros de penas molhadas, bichos com o pêlo pegado ao corpo e todos completamente encharcados, de mau humor e muito incomodados.
O primeiro problema a tratar foi, claro está, a maneira de ficarem outra vez enxutos: reuniram-se em conferência para debater o assunto, e passados poucos minutos já parecia muito natural a Alice falar com eles com tanta intimidade, como se os conhecesse de toda a vida. Até teve uma grande discussão com o Papagaio, que acabou por amuar e que só dizia:
- Sou mais velho do que tu e portanto eu é que sei – mas com isso Alice não pôde concordar sem saber que idade tinha ele, e, como o Papagaio se recusava de todo a dizer a idade, a conversa acabou.
Por fim, o Rato, que parecia ter bastante autoridade sobre eles gritou:
- Sentem-se e ouçam-me! Eu é que vos vou pôr secos, num instante!
Sentaram-se logo todos, numa grande roda, com o Rato no meio. Alice não tirava os olhos de cima dele, pois tinha a certeza de que iria apanhar uma terrível constipação se não se enxugasse muito depressa.
- Hum! – disse o Rato, com um ar importante. – Estão todos a postos? A coisa mais seca que conheço é esta. Tudo em silêncio por favor! Guilherme, o Conquistador, cuja causa foi patrocinada pelo Papa, obteve rapidamente a submissão dos Ingleses, que necessitavam de chefes e que estavam há muito habituados à usurpação e à conquista. Edwin e Morcar, condes de Mercia e Nothumbria…
- Ufa! – disse o Papagaio, com um arrepio.
- Como? Desculpe! – disse o Rato, franzindo o sobrolho, mas com muita delicadez. – Disse alguma coisa?
- Eu não! – respondeu o Papagaio, apressadamente.
- Julguei que sim – respondeu o Rato. – Continuando… Edwin e Morcar, condes de Mercia e Northumbria, estavam do lado dele e mesmo Stigand, o patriótico arcebispo da Cantuária, achou que era coisa aconselhável.
- Achou o quê? – perguntou o Pato.
- Achou essa coisa – respondeu o Rato, bastante zangado. – Claro que sabes o que é que «coisa» quer dizer!
- Eu sei muito bem o que é que «coisa» quer dizer, quando sou eu a achar alguma coisa, o que é sempre uma rã ou uma lagarta – respondeu o Pato - , mas a questão é saber o que é que o arcebispo achou?
O Rato não prestou atenção a esta pergunta, mas continuou apressadamente:
- … achou aconselhável ir com Edgar Atheling ao encontro de Guilherme, para o coroarem. A conduta do Guilherme, a princípio, foi moderada. Mas a insolência dos seus súbditos normandos… Como é que se sente, minha querida? – continuou ele, voltando-se para Alice, enquanto ia falando.
- Encharcadíssima! – respondeu ela, melancolicamente. – Não me parece nada que isso me esteja a enxugar.
- Nesse caso – disse o Dodo, pondo-se em pé, todo solene -, eu proponho que esta assembleia seja adiada, para adopção imediata de medidas mais enérgicas.
- Fale um inglês que se perceba! – disse a Aguiazinha. – Não sei o que querem dizer metade dessas palavras compridas, e, ainda para amis, não acredito que voc~e também saiba! – E a Aguiazinha baixou a cabeça à socapa de alguns dos outros pássaros.
- O que eu ia dizer – continuou o Dodo, num tom ofendido – é que a melhor coisa para nos secarmos é fazermos uma corrida eleitoral.
- O que é uma corrida eleitoral? – perguntou Alice; não que ela estivesse muito interessada em saber, mas porque o Dodo fizera uma pausa, como se achasse que alguém devia falar, e porque mais ninguém parecia disposto a dizer fosse o que fosse.
- Ora… - disse o Dodo -, a melhor maneira de a explicar é fazê-la. (E, como vocês, podem querer fazer essa experiência numa noite de Inverno, vou explicar-vos como é que o Dodo organizou a coisa…)
Primeiro delimitou o campo com uma espécie de círculo («A forma exacta não tem importância», disse ele) e depois todo o grupo se espalhou aqui e além pelo campo. Não havia o sinal de «um, dois, três, largada…», mas começavam a correr quando lhes apetecia e paravam também quando lhes apetecia. Por isso não era fácil saber-se quando é que a corrida ia acabar… No entanto, depois de estarem a correr durante cerca de meia hora e de já estarem todos outra vez bem enxutos, o Dodo gritou, de repente:
- Terminou a corrida! – E todos se juntaram à volta dele, exaustos, a perguntar:
- Mas quem ganhou?
A esta pergunta o Dodo não foi capaz de responder senão depois de muito pensar; ficou sentado durante muito tempo, com um dedo apoiado na testa (na posição em que geralmente Shakespeare costuma aparecer nos seus retratos), enquanto os outros aguardavam, em silêncio. Finalmente, eis o que Dodo disse:
- Todos ganharam e todos têm de receber prémios.
- Mas quem vai dar os prémios? – disseram várias vozes em coro."

CARROLL, Lewis (trad. Vera Azancot), Alice no País das Maravilhas, Lisboa, Biblioteca Visão, 2000, p.p. 19 – 21.

posted by Luís Miguel Dias segunda-feira, junho 30, 2003

BIOGRAFIA



"LEWIS CARROL, pseudónimo de Charles Lutwidge Dodgson, nasceu em 27 de Janeiro de 1832 em Daresbury, Inglaterra. Foi o terceiro de onze filhos de um clérigo. Desde jovem começou a produzir revistas para a família, nas quais era patente o seu gosto por jogos de palavras. Também os seus dotes matemáticos cedo se manifestaram. Conta-se que, quando era jovem, apresentou um problema de matemática ao pai, pedindo-lhe simplesmente: «Explique, por favor», como se antecipasse as palavras da Lagarta que mais tarde faria parte da sua obra.
De 1846 a 1850 frequentou a Rugby School e em 1854 formou-se no Christ Church College em Oxford, local onde viveu quase ininterruptamente até à sua morte (4 de Janeiro de 1898, Guilford).
Em 1861, Dodgson foi ordenado diácono, mas nunca optou pelo sacerdócio.
Colaborou com poemas para The Train, uma publicação periódica editada por Edmund Yeats, que escolheu Lewis Carrol entre quatro pseudónimos apresentados pelo autor. Lewis deriva de Lutwig através de Luduvicus e Carroll de Charles (Carolus).
A sua obra mais famosa, Alice no País das Maravilhas (1865), teve origem numa viagem de barco com as jovens Lorina, Alice e Edith, filhas do deão da Christ Church H. G. Liddell. Foi para Alice que ampliou uma história improvisada, para lhe dar a forma de livro.
Seguiu-se em 1871 Alice do Outro Lado do Espelho. Ambos os volumes foram ilustrados por Sir John Tenniel. Um crítico atribuiu o sucesso destas obras ao facto de, ao contrário dos livros daquela época para crianças, estes não terem um conteúdo moral.
Artistas do Surrealismo, como André Breton, Antonin Artaud e Salvador Dali, viram nele um precursor das suas inovações estéticas.
Outras obras de Carroll foram Phantasmagoria and Other Poems (1869), A Caça ao Snark (1876) e Sylvie e Bruno (1889 e 1893). O mais importante dos vários tratados de matemática que escreveu foi a sua defesa de Euclides em Euclid and His Modern Rivals (1879).
Carroll foi também um hábil fotógrafo amador com particular interesse pela fotografia de jovens raparigas, cuja amizade apreciava. Os seus diários foram editados por R. L. Green (2 volumes, 1953) e as suas cartas por M. N. Cohen e R. L. Green (2 volumes, 1979)."

CARROLL, Lewis (trad. Vera Azancot), "Alice no País das Maravilhas", Lisboa, Biblioteca Visão, 2000.

posted by Luís Miguel Dias segunda-feira, junho 30, 2003

domingo, junho 29, 2003

BLOGOSFERA

Subscrevemos o que o Aviz escreveu nos seus posts sobre futebol, excepto o post IV, mas como em cada um de nós existe um treinador… nada de grave.

Relativamente ao post III, sentimos o mesmo que o Avis. Repare-se que quando um jogador marca um golo, quer o árbitro quer o “bandeirinha”, tentam por todos os meios controlar o jogador. Será que não percebem a alegria do golo? Ou pretendem controlar os jogadores emocionalmente? Qualquer dia… teremos um limitador da alegria do golo, incorporado no organismo dos profissionais.

No que diz respeito ao post I e II, não temos palavras para definir a atitude dos deputados. Já agora, mais uma vez, de onde deveria vir o exemplo? Quem é a entidade patronal dos senhores deputados? Como é possível?

posted by Luís Miguel Dias domingo, junho 29, 2003

REPORTAGEM

In the Land of Guantánamo


In the Land of Guantánamo: A surreal society has emerged at the tip of Cuba in which rules are the only common language and prisoners and guards alike feel marooned.


Bruce Gilden/Magnum, for The New York Times

Pode ser lida, no The New York Times

posted by Luís Miguel Dias domingo, junho 29, 2003

LITERATURA



Na luminosa tarde de Verão mergulhados,
Vagarosamente deslizamos,
Nossos remos manobrados
Por bracitos inábeis
Enquanto frágeis mãos procuram, em vão,
Guiar nosso caminho sem destino.

Ah, cruéis Três! Numa hora destas
E por um tempo de sonho assim
Implorar uma história a quem
Não tem já fôlego para agitar sequer uma pequena folha!
Mas que pode o pobre solitário
Contra três imperiosas vozes?

A Primeira, ordena, implacável,
«Começa já.»
A Segunda, mais doce, pede:
«Tem de haver muita fantasia!»
E a terceira interrompe-me
Não mais do que uma vez em cada minuto.

Logo, ao súbito silêncio submetidas,
Na fantasia seguiram
A criança dos seus sonhos, pelo País
Das Maravilhas, fantásticas, diferentes,
Em conversa amena com pássaro e animal
Quase em tudo acreditando…

E, sempre que a história secava
As fontes da fantasia,
Eu, cansado, lhes pedia
Para pararmos:
«Fica para outra vez…»; «A outra vez é já!»
Ordenavam as alegres vozes.

Assim foi avançando a história do País das Maravilhas
E um a um, lentamente,
Se traçavam fantásticos sonhos.
Agora, a história está pronta…
E rumo a casa, tão felizes, vogávamos
Sob a intensa luz do poente…

Alice! Aceita esta ingénua história
E com tua mão carinhosa
Entrega-a ao mundo da infância
Onde místicas memórias se entrelaçam
Como coroas de flores raras, que um peregrino
Colhesse em longínqua Terra Prometida!

in Alice no País das Maravilhas.

posted by Luís Miguel Dias domingo, junho 29, 2003

MOLESKINE


Lewis Carroll
Charles Lutwidge Dodgson (self-portrait), May 1875.

“A exposição “Dreaming in Pictures: The Photography of Lewis Carroll”, patente no International Centre of Photography até 31 de Agosto, propõe-nos deixar de lado a obra literária de Lewis Carroll, mas sem abandonar o imaginário infantil que nos inspiram as suas fotografias – realizadas entre 1850 e 1870. Muitas das 72 imagens aqui reunidas têm como protagonistas as crianças que o inspiraram e a quem ele próprio contava as suas histórias, sem esquecer a sua pequena diva: Alice Lidell.
Como suporte às imagens, há também escritos e outro material recolhido para ajudar a entender como se apresentava e encarava a fotografia no tempo de Carroll.”

(texto in dn)


Lewis Carroll
Xie Kitchin, ca. 1875.


Lewis Carroll
Brook and Hugh Kitchin, 5 July 1876.


Lewis Carroll
Xie Kitchin (in Greek dress), 12 June 1873.


Exposição em Dreaming in Pictures: Photography of Lewis Carroll

posted by Luís Miguel Dias domingo, junho 29, 2003

sábado, junho 28, 2003

PINTURA


Titian. Self-Portrait. c.1550-1562.

Por motivos técnicos, as legendas das pinturas, não aparecem no local adequado. Pelo facto, pedimos desculpa.
No entanto, elas aqui ficam.

1. The Three Ages of Man, 1513-14.
2. Venus of Urbino, 1538.
3. The Concert, c. 1510.

posted by Luís Miguel Dias sábado, junho 28, 2003

LITERATURA



VERGÍLIO FERREIRA

"Nasceu em 1916 em Melo, serra da Estrela, e morreu em Lisboa em 1996. Depois de uma passagem pelo Seminário do Fundão, fez o liceu na Guarda e formou-se em Coimbra em Filologia Clássica.
Dedicou grande parte da vida ao ensino liceal. A sua proximidade inicial da corrente neo-realista foi cedendo o passo a uma forte marca de matriz existencialista que deixou vestígios nos sinais filosofantes e simbólicos de toda a restante, angustiada e extensa bibliografia ficcional e diarística do autor, sem dúvida um dos nossos mais importantes romancistas da segunda metade do século XX.
Publicou, entre muitos outros, os romances Manhã Submersa (1954), Aparição (1959, Prémio Camilo Castelo Branco da Sociedade Portuguesa de Escritores), Alegria Breve (1965), Nítido Nulo (1971), Rápida a Sombra (1975), Até ao Fim (1987). O Encontro é extraído do volume Contos (1979), que reúne narrativas publicadas em A Face Sangrenta (1953) e Apenas Homens (1972)."

Os Melhores Contos e Novelas Portugueses, Escolha de Vasco Graça Moura, Lisboa, Selecções do Reader´s Digest, 2003, p. 382.

posted by Luís Miguel Dias sábado, junho 28, 2003

CONTO

Obrigado, Nelson de Matos



O ENCONTRO

Vergílio Ferreira (1916-1996)

“AGORA A SERRA DESCIA A TODA A PRESSA para a aldeia. Depois, tranquila, alastrava devagar num grande vale, para subir ainda, suvemente lá ao longe. Quebrado de cansaço e quase de surpresa, o engenheiro parou um instante no alto de um penhasco, soprando o fumo largo do cigarro, olhando em roda o silêncio da tarde. Um grande vento de solidão e montanha embatia-lhe no peito, inchando-lhe a camisa desapertada, penetrando-o de grandeza e de um incerto pavor. Mas logo reagiu, metendo o passo batido pelo caminho pedregoso que se lhe abria adiante, resvalando pesadamente no cascalho. De um e de outro lado, num pavor de precipícios, duas ribeiras iam fugindo para o vale, longo tempo acompanhadas por filas de arvoredo que lhes caminhavam à beira. (…)

O Sol tombava já para as bandas do rio e o Gomes e o Coelho passeavam já, de cigarro aceso, ao longo da estrada quente. Até que os dois rapazes chegaram, carregados, mas frescos, como se tivessem dado apenas um passeio, conquanto o colete os abotoasse até acima e as ceroulas lhes prendessem as pernas com atilhos.
- São de bronze, vocês.
Ergueu o sobrolho num sorriso envolvente, falando todavia só para um, talvez por ser o mais velho, enquanto o outro, devagar, descarregava a mira e o tripé.
- A gente está habituada, Senhor Engenheiro. A vida da gente é bater mato.
Se bem que engenheiro tivesse reparado no riso transversal do moço, no olhar lento que trocara com o irmão, não se impressionou. E, com um gesto breve, disse apenas:
- Ponham aqui dentro. Ali.
O mais velho tomou outra vez a mira, o mais novo pousou a caixa com o teodolito. O engenheiro passou então o lenço pela testa, batendo ainda as botas cansadas pelo lajedo largo do balcão, para sacudir a poeira. Mas qundo os rapazes disseram «passe muito bem», apontou subitamente um dedo ao mais velho, numa resolução decisiva:
- Venha cá acima.
Embaraçado, o mais novo ficou-se a vê-los subir e resolveu-se enfim a esperar.
- Senhora Maria! Água quente! – berrou o engenheiro já do meio da escada. (…)

- Água quente, Senhora Maria?!
Abriu então a varanda e viu os dois irmãos olharem ainda atrás, lá de longe, ao dobrar da esquina. Diabo! Pois não estaria o caso arrumado? Ao menos por então? De resto, havia já um mês! Ah, que se se apanhasse em Lisboa. Farto de aldeia, caramba! Farto!
Ao alto ia esmorecendo o azul do céu, de baixo vinha o grulhar de uma das ribeiras, bandas de pinheiro amedrontavam de sombra toda a lergura da encosta. Na tarde sufocante, subia agora dos balcões da vizinhança um ruído cansado de conversas. E já tranquilo, com delícia, desapertando toda a camisa, o engenheiro enterrava os dedos nos cabelos do peito, quando de novo o assaltou a ânsia forte de Lisboa. Lembrou o Arcádia, a inglesa loura soprando novelos de fumo, de joelho atirado à frente por uma brecha do vestido. Ah, fora uma noite em cheio. Ela esperava o marido que tinha ido a Gibraltar com um carregamento de conservas.
- Hello, Helen! Tonight you are very very beautiful.
Era uma inglesa escolar, moída com esforço, mas a bela loura achara graça. Prometera voltar em Agosto… Arre, que já não podia mais. Veio de novo ao alto da escada, furioso:
- Essa água, caramba!
- Já vai, olha que coisa. Dê tempo ao tempo. Ora a fidalguia… (…)

Pareceu-lhe no entanto, ao entrar na Sociedade, que a malta do andar de baixo o olhara de um modo estranho. Por isso, a meio da escada, quando a impressão se lhe agravou ma´s nítida, volveu atrás, devagar, e atravessou o salão. Pôde então ouvir-se claramente a si próprio:
- Uma caixa de fósforos.
Voltou-se: os mesmos olhares trocados, as mesmas palavras oblíquas. Procurou rir galhardamente, com segurança:
- Ena! Parece que entrou o rei! À vontade, camaradas. Senhor Francisco: aí uma rodada a esta gente. Leve depois a conta. (…)

O engenheiro foi-se acomodando de camisa aberta, bateu largamente as palmas e, enquanto acendia o cigarro, contou que nesse dia andara pelos limites do Churrasco:
- Uma estopada amigo Gomes. Trago os pés que nem cepos.
- Foi dar-lhe. Isto quem não está habituado … Uma, duas, três, quatro, cinco; uma, duas, três … Isto são caminhos de cabras. Só quem já nasceu aqui.
Todos sorriram paternalmente para aquele corpo mimoso assim massacrado pela violência da montanha. Mas o engenheiro não gostou:
- Pois engana-se o meu amigo. Já fiz marcha de trinta quilómetros e mais.
O outro porém, sorridente, não se dava por convencido:
- Pois sim, não digo que não. Mas isso é outra coisa. Estradas direitas, caminho franco. Agora a serra … Quantas quer o Senhor Engenheiro?
E o engenheiro bateu o best na mesa, numa temeridade:
- Quatro! (…)

Tipos reles. Ah, Lisboa! Nascera na capital, criara-se na capital, mulheres havia-as aos centos. Para o inferno a Silvicultura, os levantamentos topográficos, aquela terra de bestas. Porque ele era um homem, não usava arma nenhuma e estava habituado a discutir tudo de frente. Tinha ali dois pulsos duros, treinados no boxe, no remo, prontos para uma porrada leal. Mas aqueles selvagens eram traiçoeiros, atacavam pelo escuro das noites, não tinham sequer a coragem de discutir claramente, para que uma pessoa enfim soubesse quando é que os tinha na mão. (…)

Calma, todavia, que diabo. Ao primeiro que lhe saltasse, era fácil entrar-lhe de bota ao estômago. Só não podia compreender poque é que aquelas bestas se metiam na vida dele. Era uma coisa absurda. Fizera justamente essa pergunta ao Gomes, quando este lhe tocou no assunto.
- Porque é, não sei. São assim. Lá têm as suas razões. É preciso saber lidar com esta gente, e o Senhor Figueiredo tenha cuidado. (…)

Soergueu-se, bruscamente, apoiado na mão aberta, o corpo todo em tremor. Mas ela vinha lenta, suspendendo-se algumas vezes, de ouvido agudo à escuta.
- Deita. Não há ninguém.
A rapariga, porém, sentou-se apenas e correu-lhe a mão pela testa:
-Vem a suar.
- Deita. (…)

- João! – disse bruscamente o mais novo, pondo-lhe a mão no ombro. – Achas que eu trabalhei muito mal?
O outro afastou-se da guarda da ponte, pôs-se. Tirou um cigarro do bolso, procurou fósforos, pelas algibeiras, estendeu atrás um braço ao irmão:
- Dá aí lume.”

Os Melhores Contos e Novelas Portugueses, Escolha de Vasco Graça Moura, Lisboa, Selecções do Reader´s Digest, 2003, p.p.351-361.

posted by Luís Miguel Dias sábado, junho 28, 2003

MÚSICA




“Tuve la idea de llevar Trilogy a su final lógico durante el “Dreamtour 2000” de TheCure; debíamos tocar los tres álbumes completos en una noche y hacer una película…” Robert Smith, The Cure

En directo frente a una multitud de personas durante dos inolvidables noches en el Tempodrom de Berlín en noviembre de 2002, uno de los grupos más aclamados tocaron tres de sus más admirados e influyentes álbumes: Pornography (1982), Disintegration (1989) y Bloodflowers (2000). El resultado es The Cure – Trilogy – Live in Berlin, que Eagle Vision lanzará en DVD y VHS el 2 de junio de 2003.

“Esta peculiar actuación en directo fue desde siempre una idea ambiciosa, e implicó mucha preparación física y mental”, explica Robert, “pero el resultado final lo ha merecido con creces. Para mí la realización de “Trilogy Show” no es solo la culminación de un sueño, sino además un tributo a la composición actual de la banda; la más dinámica, la más delicada, y la más potente… sin duda la mejor The Cure en la que he tocado jamás.”

DISCO UNO:
PORNOGRAPHY: One Hundred Years - A Short Term Effect - The Hanging Garden – Siamese Twins – The Figurehead - A Strange Day - Cold – Pornography

DISINTEGRATION: Plainsong - Pictures Of You - Closedown - Lovesong - Last Dance - Lullaby - Fascination Street - Prayers For Rain - The Same Deep Water As You - Disintegration - Homesick – Untitled

DISCO DOS:
BLOODFLOWERS: Out Of This World - Watching Me Fall - Where The Birds Always Sing - Maybe Someday - The Last Day Of Summer - There Is No If... - The Loudest Sound - 39 - Bloodflowers

ENCORE: If Only Tonight We Could Sleep - The Kiss

EXTRAS:
Entrevista con la banda (30 minutos en el disco 2) – 2 pistas ocultas – entrevistas ocultas (2 en el primer disco y 1 en el segundo).

www.dvdenlared.com

posted by Luís Miguel Dias sábado, junho 28, 2003

sexta-feira, junho 27, 2003

LIVROS

Por estes dias, descobrimos dentro de um livro que comprámos, um marcador branco que tinha impressas a azul, as seguintes afirmações:

" - «Um livro bom é um bom amigo.»

- «O livro é o mais assíduo, o mais interessante, o mais esclarecido e o menos importuno dos amigos.»

- «Ler é pensar três vezes.»

- «A leitura é um dos mais caudalosos canais de fertilização ideológica do espírito humano.»"

Não afirmava era, como nos ensinou um bom amigo, que "o livro é o único macho que não precisa de fêmea para se reproduzir."

posted by Luís Miguel Dias sexta-feira, junho 27, 2003

MUITOS PARABÉNS...



... E MUITAS FELICIDADES.

posted by Luís Miguel Dias sexta-feira, junho 27, 2003

LITERATURA



“Na maioria dos casos, a condição primordial da felicidade não consiste, decerto, em resolver as contradições, mas sim em fazê-las desaparecer, da mesma forma que se fecham os espaços nas longas avenidas. Assim como as relações visíveis se deslocam perante os nossos olhos, de maneira a formar-se uma imagem aparente em que as coisas mais próximas, iminentes, parecem grandes, mas em que, mais longe, até as coisas enormes se afiguram pequenas e o todo, enfim, se arredonda e aperfeiçoa completamente, assim também as relações invisíveis se deslocam mercê da inteligência e do sentimento, de modo a formarem inconscientemente qualquer coisa no interior da qual nos sentimos à vontade. É precisamente essa operação, pensou Ulrich, «que não consigo realizar como deve ser.»
Ficou um instante parado, numa grande poça de luz que lhe cortava o caminho. Talvez fosse esse clarão aos seus pés, talvez fossem também as árvores, nuas como vassouras, aos lados, que lhe avocaram, de súbito, uma rua de aldeia e veio acordar nele aquela monotonia da alma, hesitante entre a plenitude e a futilidade particular ao campo, que, desde a sua primeira aventura juvenil o incitara por mais de uma vez a repetir a tentativa. «tudo se torna tão simples», cogitou. «Os sentimentos adormecem, os pensamentos destacam-se uns dos outros como as nuvens após a tempestade e, de repente, a alma transforma-se num lindo céu límpido e azul! Mas se uma vaca surge de repente à beira da estrada, em face deste céu – o acontecimento é tão vivo que nada tem do outro mundo! Porém se uma nuvem peregrina fizer o mesmo sobre aquela zona, a erva escurece, um momento depois brilha de novo, nada se passou de extraordinário, e foi, no entanto, como que uma travessia de uma margem do oceano para a outra! Um velho perde o seu último dente: essa pequena ocorrência faz, na vida de todos os seus vizinhos, um corte, ao qual podem ligar as suas recordações! Os pássaros cantam todas as noites da mesma maneira, por cima da aldeia, quando vem o silêncio que acompanha o pôr do Sol: de cada vez é um acontecimento novo, como se o mundo não contasse mais do que sete dias de existência! No campo, os deuses descem ainda até aos homens, ali ainda somos alguém, ainda vivemos alguma coisa! Na cidade, onde surgem mais de mil acontecimentos nem sequer nos encontramos em estado de os relacionar connosco: assim começa a progressiva abstracção da vida, em que tanto se fala…»
Enquanto pensava isto sabia que esta evolução confere ao poder do homem uma extensão mil vezes maior; mesmo que a dilua dez vezes nos pormenores, ela cresce cem vezes no seu conjunto. Portanto ele não encarava a sério qualquer espécie de regresso. Veio-lhe de repente à ideia (tratava-se de um desses pensamentos à primeira vista deslocados e abstractos, que assumem muitas vezes na vida um significado imediato) que a lei dessa vida a que aspiramos, sobretudo quando nos vemos sobrecarregados de tarefas e sonhamos com a simplicidade, não era mais do que a lei da narração clássica! Dessa ordem simples que permite dizermos: «Depois disto passado, aconteceu isto!» Éa sucessão pura e simples, a reprodução da diversidade opressora da vida sob uma forma unidimensional, como diria um matemático, que nos tranquiliza; o alinhamento, ao longo de um fio, de tudo quanto se passou no espaço e no tempo, esse famoso «fio da narrativa», precisamente, com o qual acaba por se confundir o fio da vida. Feliz daquele que consegue dizer: «Quando», «Depois de», «Antes de»! Pode também acontecer-lhe alguma fatalidade, ver-se envolvido nos piores sofrimentos: desde que seja capaz de reproduzir os acontecimentos na sucessão do seu seguimento temporal, ele sente-o tão bem como sente o sol a brilhar sobre o seu ventre. Foi disto que o romance soube tirar um hábil partido; tanto faz que o viajante siga a cavalo através dos campos sob chuva a potes, como faça estalar neve debaixo das botas, o leitor está sempre confortável. Isto seria difícil de compreender se essa eterna habilidade de prestidigitação da arte narrativa, à qual até as amas recorrem para acalmar as criancinhas, se essa «perspectiva da inteligência», esse «encurtamento das distãncias» não fizesse já parte integrante da vida. (…)

Quando recomeçou a andar, enriquecido com esta descoberta recordou-se de que Goethe escrevera num ensaio sobre arte: «O homem não é um ser que ensina, mas sim um ser que age, vive e é eficiente!» Encolheu respeitosamente os ombros. «Se acaso o homem consegue hoje esquecer o pano de fundo brumoso da doutrina, da qual dependem todas as suas actividades, fá-lo, quando muito, como o comediante que ao tomar consciência do cenário e do esgar que faz, imagina estar a agir na realidade!» pensou. “

MUSIL, Robert (trad. DR. Mário Brga), “O Homem sem Qualidades”, II Vol., Lisboa, Edição «Livros do Brasil» Lisboa, s.d., p.p. 411-413.

posted by Luís Miguel Dias sexta-feira, junho 27, 2003

PINTURA



Retrato do Papa Paulo III com Dois Netos

Por JOÃO BÉNARD DA COSTA
Público, Sexta-feira, 20 de Junho de 2003


"3 - "Toda a pintura deve contar uma história", dizia Alberti. Nenhum pintor as contou melhor que Tiziano. Em 1543, Tiziano pintara Paulo III, no auge do seu pontificado, noutro retrato célebre de Capodimonte. Em 1546, durante a segunda e última visita do pintor a Roma, o Papa não lhe pediu retratos, mas o cardeal, seu neto e seu homónimo, insistiu em ser imortalizado por ele. Primeiro, pediu-lhe um retrato onde está sozinho, e onde foi pintado a meio corpo. Se o retrato (outro Tiziano de Capodimonte) é esplendoroso, é visível que o retratado não consegue competir com a púrpura das vestes.

Dúvidas houvesse, elas terminariam no retrato de família, também uma encomenda do neto. À esquerda, em pé, dedo em riste, ele tudo cuidou e tudo dispôs para ser a figura central, permitindo-se até dominar o avô, sentado. É o único que fita o espectador, enquanto o Papa e Ottavio praticam sem nos fitar. Mas Tiziano pintou outra pintura sob ou sobre a pintura encomendada. Como Paulo III e o futuro duque conversam, o cardeal ficou isolado, afastado do grupo. O Papa vira-lhe ostensivamente as costas e parece apenas prestar atenção ao neto mais novo, seu neto favorito. Olhando atentamente o quadro, é crescente a impressão que o cardeal está "off", pertencente a outra história. Já desaparece no escuro corredor da História. Numa análise célebre, Panofsky chamou a atenção para a pêndula (versão "miniaturizada" do relógio mecânico) que está quase no limite do quadro, junto ao cardeal. "Tempus edax rerum", "o tempo devorador de todas as coisas". E o primeiro a ser devorado foi o cardeal.

Mas foi também Panofsky quem falou de "uma acção física e de uma tensão emocional", até este quadro desconhecidas no reino do retrato.

A reprodução, aqui, não vale. Mas quem viu o original jamais esquecerá o olhar do velho, de uma lucidez cortante, como se não se conformasse com a inépcia de tais netos para o continuarem. Se ignora o cardeal, desconfia da elegância do duque, "cujo movimento obsequioso, quase rastejante, lhe confere o aspecto perigoso e imprevisível de uma mola tensa, aproximando o requinte do seu manejo, elegante e silencioso, do movimento dos felinos". O Papa sabe que vai morrer, que a sua obra está ameaçada (Carlos V forçou-o a interromper o concílio), mas sabe também que nenhum dos seus ambiciosos netos tem tamanho para a altura a que aspiram. Este retrato de família é um retrato de solidão. Este retrato de poder é um retrato de Lear, um Lear ainda mais trágico porque não se deixou enganar e não tem campo para a imensidade da sua visão.

4 - Há quantos anos, há quantos anos, sonhava eu ver-me na frente deste retrato inaudito, que não pára de contar histórias e é história da sua cena?

Os grandes pintores - disse um dia Tiziano - só precisam de três cores: o preto, o branco e o encarnado. O branco é o branco do Papa (a barba, o arminho, o interior da manga, a sotaina). Algo perpassa dele para as pernas de Ottavio, o neto amado, o neto traidor. Por isso, fora os sapatos, as meias, a gola e a pluma, tudo nele é castanho, cinzento ou preto, como castanha, cinzenta e preta é a cortina imensa que o jovem afastou para entrar. Mas a cor dominante é o encarnado, os vários tons de encarnado, que permitem também ver este quadro como uma premonição do impressionismo, ou, se não quisermos ir tão longe, do que Vélasquez fez das vestes de Inocêncio X no retrato das obsessões de Bacon.

Podem-se ficar horas só a olhar para o "camuccio" do Papa ou para o quase cor-de-rosa dos sapatos. São as graduações de encarnado que contam a história da traição, como se Tiziano adivinhasse com elas (ou nelas) o que se passou três anos depois e indirectamente foi causa da morte de Paulo III. Foi quando os netos o traíram em Parma e os dois Alessandros - o Papa e o cardeal - se viram pela última vez, no mais terrível dos encontros. Será esse afinal o encontro que Tiziano pintou?

Eu já tinha visto Carlos V na batalha de Mühlberg. Agora vi Paulo III, Papa Farnese, na Villa Carafa, em Roma. Abandonando-a, pouco depois, Tiziano escreveu a Aretino que nunca mais visitaria a cidade papal. "Vi em Roma o mais terrível." Foi isto que ele viu? Vê-se tanta coisa, pensa-se tanta coisa."

posted by Luís Miguel Dias sexta-feira, junho 27, 2003

quinta-feira, junho 26, 2003

CALAMIDADES



ARDE MADRID | Y no, esta vez no tiene que ver con los follones políticos de la Asamblea sino con un incendio que se ha declarado en en los alrededores del embalse madrileño de Picadas. El fuego afecta a masa arbolada, sobre todo pinos y encinas, próxima a una Zona Especial de Protección de Aves (EFE).

in www.elmundo.es

posted by Luís Miguel Dias quinta-feira, junho 26, 2003

CINEMA




"Ingmar Bergman was born in Uppsala on July 14th, 1918, in a family of priests and countrymen; his father, Erik, was a Lutheran pastor. Bergman spends his childhood following his father during his daily trips from one church to another through small Swedish towns. Later, Ingmar joins an University course about History of Literature (his final dissertation is about Strindberg) and gets involved in the student theatre. At the same time, he is very close to Maria, a young actress, and the two agree to rent a room together; the relationship is strongly opposed by his father, to the point that Ingmar rejects any kind of contact with his family for nearly four years. He is hired by the theatre of the Opera as assistant director, with no salary. A dancer of the theatre ballet takes care of him until he is finally hired and paid as a prompter. In this period, he also writes an opera and about twelve dramas. The theatre's director offers him the chance to perform a piece he wrote, clearly Strindberg-inspired, called Casper's death. Amongst the audience, some members of Svensk Filmindustri are positively struck by the drama, and decide to hire him."

in www.geocities.com/SunsetStrip/Venue/3825/bergman.html

posted by Luís Miguel Dias quinta-feira, junho 26, 2003

CINEMA

Logo, pelas 22h, no cineclube de Guimarães, será exibida uma das obras-primas de Ingmar Bergman: MORANGOS SILVESTRES (1957)


posted by Luís Miguel Dias quinta-feira, junho 26, 2003

quarta-feira, junho 25, 2003

No século XXI

Campeonato Europeu para Pessoas com Deficiência.

"Apesar dos bons resultados obtidos pela selecção lusa, nem tudo foram rosas durante o Europeu de Assen. A parte logística teve falhas e o atleta montijense Gabriel Potra considera mesmo que estes foram dos piores campeonatos da sua vida.

`Foi um dos piores campeonatos onde participei. Até fome e sede passámos... Cada garrafa de água custava três euros. Quanto à comida, as coisas também não correram bem. Passávamos o dia a sandes e só jantávamos, ora isso para um atleta não é bom. Também as habitações onde ficámos, num parque de campismo, não eram as melhores", lamenta Potra, que apesar das dificuldades acabou por ser, com três medalhas de ouro (200 e 400 metros amblíopes e estafeta 4x100 metros) o mais bem sucedido atleta português no Europeu."

in Público, 23 de Junho de 2003.


Sem palavras. Muitos parabéns aos atletas portugueses.


posted by Luís Miguel Dias quarta-feira, junho 25, 2003

MÚSICA

Na próxima sexta-feira, no Mosteiro São Bento da Vitória, Porto, pelas 22h, Rodrigo Leão.




“O último trabalho a solo "Alma Mater" é sem dúvida uma forte marca na carreira de Rodrigo Leão, um trabalho fortemente inspirado em grandes nomes como Michael Nyman ou Ryuichi Sakamoto (…)
Este disco é, sem dúvida, o resultado da maturidade musical e estética de Rodrigo Leão, cujo percurso começou com os lendários Sétima Legião, banda da qual foi membro fundador, tendo também passado pelos Madredeus - acabando por abandoná-los em 1994, mas onde deixou marcas evidentes, revisitadas e reelaboradas no seu projecto a solo.
Outra obra de referência na sua carreira foi, sem dúvida, "Os Poetas - Entre Nós e as Palavras" - projecto conjunto com o editor Manuel Hermínio Monteiro e que já fazia prenúncio de alguns dos caminhos a seguir.”

in http://attambur.com/Noticias/20012t/RodrigoLeaoAulaMagna.htm


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posted by Luís Miguel Dias
quarta-feira, junho 25, 2003

LITERATURA




“É muito fundo o poço do passado. Não seria melhor dizermos que é um poço sem fundo?
Sim, um poço sem fundo, se o passado a que nos referimos (e talvez só neste caso) é o da espécie humana, a enigmática essência de que fazem parte as nossas existências, naturalmente insatisfeitas e sobrenaturalmente desditosas. O mistério dessa enigmática essência abrange sem dúvida, o nosso próprio mistério – é o alfa e o ómega de todos os nossos problemas – ligado estreitamente a tudo o que dizemos, dando uma significação a todos os nossos esforços. Quanto mais fundo sondamos, quanto mais longe buscamos o mundo inferior do passdo, mais as remotas origens da humanidade, a sua história e a sua cultura se nos revelam imprescutáveis. Quanto mais longe nos aventuramos nas sondagens, mais distante nos parece o fundo do poço e, à medida que vamos descobrindo novos pontos de apoio e atingindo aparentes metas, mais longe temos de levar a nossa sonda, que se estira e aprofunda cada vez mais, como se tudo quanto encontramos de investigável estivesse preparado para zombar das nossas laboriosas pesquisas, tal como um navegador que segue ao longo da costa e não pode prever o termo da viagem. Após cada descoberta, ele avista inesperadamente, por trás de um promontório, outro promontório, e assim se vê forçado a cobrir novas distâncias.
Há portanto origens provisórias constituídas praticamente, efectivamente, pelos primórdios da tradição especial mantida por determinada comunidade, por um povo, ou uma simples crença de família, e a memória, embora certa de que as profundezas não estão suficientemente sondadas, fia-se nessas origens.
O jovem José, por exemplo, filho de Jacob e da formosa Raquel que tão cedo largou para o Oeste, viveu quando em Babel reinava Carigalzu, o Cassita, senhor das Quatro Regiões, rei da Suméria e da Acádia, altamente suave ao coração de Bel-Marduk, soberano severo e pomposo, cuja barba caía em canudos tão regularmente alinhados que lembravam uma legião de escudeiros em parada.
José viveu quando em Tebas, terra a que ele dava o nome de «Mizraim» e também de «Kemt, o Negro», Sua Santidade o bom Deus, cognominado «Amun está satisfeito», terceiro do mesmo nome, filho querido do próprio Sol, brilhava no horizonte do seu palácio, ofuscando os olhos maravilhados de seus vassalos nascidos no pó. Viveu na época em que Assur crescia em poderio, graças aos seus deuses e à grande estrada rente ao mar, que se estendia desde Gaza até aos desfiladeiros das montanhas de cedros, por onde as régias caravanas iam e vinham, da corte do País dos Rios à do Faraó, carregadas de lápis-lazúli e barras de ouro. (…)

Em conclusão, José (e pela quinta ou sexta vez repito o nome dele com prazer, porque há mistério nos nomes e estou em crer que o de José outorga poderes para evocar essa personalidade tão viva e tão falada noutras eras ainda que depois esmaecida pela voragem do tempo), José, por seu lado, considerava uma certa cidade da Babilónia Meridional chamada Uru, à qual na sua língua o nome Ur Kasdim, a Ur dos Caldeus, como o princípio de todas as coisas, isto é, de todas as coisas que lhe diziam respeito.”

MANN, Thomas (trad. Elisa Lopes Ribeiro), “José e Seus Irmãos”, I Vol., Lisboa, Edição «Livros do Brasil» Lisboa, s.d. p.p. 13-15.

posted by Luís Miguel Dias quarta-feira, junho 25, 2003

terça-feira, junho 24, 2003

MÚSICA


Study of Rachmaninoff's Hands, 1925.


Sergei Rachmaninoff (1873 - 1943) - Russian Composer.

"Sergei Rachmaninoff was born on April 1, 1873, on a large estate near the ancient city of Novgorod, Russia. His father was an army officer and his mother was a wealthy heiress. His father gambled, drank, and squandered his wife's money. He deserted his family when Sergei was nine years old.

By all accounts Young Sergei was a problem child, but had an extraordinary talent at the piano. At age nine he entered the College of Music in St. Petersburg, however because of his natural gift he did not bother to study. To solve his discipline problem Rachmaninoff moved to Moscow to live with Nikolai Zvereff of the Moscow Conservatory, one of the leading music teachers in Russia at the time. In 1892, Rachmaninoff graduated from the conservatory with high honors.

In 1909, Rachmaninoff made his first visit to the United States and received an enthusiastic welcome. Afterwards, he visited America once every season. Rachmaninoff died on March 28, 1943 only a few weeks after attaining his American citizenship, and only five days before his seventieth birthday. During his career Rachmaninoff wrote some 145 compositions."
in www.lucidcafe.com/library/96apr/rachmaninoff.html



posted by Luís Miguel Dias terça-feira, junho 24, 2003

MÚSICA

25 de Junho, pelas 21h30 – Grande Auditório da Casa das Artes - Famalicão



Luís Magalhães & Nina Schumann

OPERAÇÃO RACHMANINOFF

O segundo concerto de uma série de três dedicados ao compositor russo. Concertos pedagógicos comentados por Jorge Rodrigues.





posted by Luís Miguel Dias terça-feira, junho 24, 2003

CORRESPONDÊNCIA

Caro FMS No Quinto dos Impérios , só hoje (uma semana depois, desde já as nossas desculpas pois nas visitas que fazíamos ao vosso blogue, pensávamos ser ainda o vosso primeiro contributo) nos apercebemos do seu post acerca do salvamento dos dez livros.
Como já referimos anteriormente, a escolha é puramente subjectiva, condicionada antes de mais à idade de cada um, como se perceberá facilmente. O que queríamos com o repto (que só vocês se deram ao trabalho de responder), era criar uma espécie de tertúlia, onde cada um, tivesse a possibilidade de exprimir os seus gostos literários, e trocar algumas impressões sobre alguns autores que nos levaram aos nossos autores. Como referiu o seu colega de blogue, e parece-nos, bem, é que para chegar a Joyce se calhar temos que ler 50 livros antes.
Desde já concordamos consigo, no que diz respeito à dificuldade de elencar as obras. Pensamos também que vão sendo alternadas ao longo da vida. Relembre-se como respondeu Proust ao questionário. Mas também achamos que, podemos chegar cedo a um ou mais autores, e saber que são aqueles que nos acompanharão sempre ao longo da nossa viagem, aqui na Terra.
Onde não concordamos consigo (com todo o respeito), é quando diz que “jamais escolheria obras pelas quais já tenha passado os olhos. Mas, pronto, that’s just me!” Levanta um problema difícil de resolver. Arriscava assim tanto? Imagine que era apenas com esses dez livros (e lembre-se do desafio, só haveria dez livros) que não conhecia (embora conhecesse os autores), que teria de “reconstruir” e criar um mundo novo. Que valores teria reunidos? Que informação tinha reunida?
Cumprimentos.


Caro Mário Pires, Live Journal , desde já muito obrigado, por ter comentado os nossos pequenos contributos, para a discussão sobre os blogues. De uma forma geral, estamos de acordo com as suas observações. Voltaremos à discussão, brevemente.
Cumprimentos.


Veja-se também o que acrescenta o Almocreve das Petas , a esta discussão sobre a blogosfera.


Agradecimentos ao PM do Portugal dos Pequeninos , pela referência simpática que fez à A Montanha Mágica. Parabéns desde já pelo vosso blogue. Gostámos de ler a referência que fez ao novo livro de Mario Vargas Llosa, bem como os outros posts.
Cumprimentos.

posted by Luís Miguel Dias terça-feira, junho 24, 2003

segunda-feira, junho 23, 2003

FARÖ

Crónica
Porque sim

Daniel Sampaio


Eu estou bem, os outros é que não

Todos conhecemos pessoas assim. Não têm nenhuma consciência dos seus problemas e são incapazes de se pôr em causa. Defendem que não vale a pena comportarem-se de forma diferente do habitual, porque os outros é que têm de mudar. Muitas vezes pensam mesmo que tudo se organiza para as prejudicar e que estranhos acordos se fazem para as denegrir. Noutras ocasiões têm-se em alta conta e apenas se relacionam com aqueles que os consideram únicos ou excepcionais. Podem ter fantasias grandiosas e a necessidade permanente de serem admirados, não sendo raro exibam comportamentos arrogantes, sobretudo para com os mais fracos. Não sentem empatia pelos outros e usam-nos para atingir os seus próprios fins. Estão muitas vezes dominados por sentimentos de inveja, embora digam que também essa é uma questão de quem está próximo.
A grandeza que sempre querem mostrar esconde em certas ocasiões um sentimento de inadequação face ao mundo que os rodeia. Quando não conseguem disfarçar essa fraqueza, respondem com raiva intensa e ficam muito fragilizados, sentindo-se profundamente feridos e injustiçados.
As relações interpessoais destas pessoas tornam-se voláteis. Costumam começar com um intenso envolvimento e idealização do outro, a que depressa se segue a sua desvalorização e crítica, sem nunca se porem em causa.
Existem variantes interessantes dentro do mesmo tipo. Por exemplo, podem ser pessoas muito manipuladoras na sua forma de tentarem obter a atenção dos outros, mudando rápido os seus comportamentos para conseguirem o seu interesse. Ou podem ter um marcado desrespeito pelas normas sociais e pelos direitos dos indivíduos, incorrendo em comportamentos que levam a justiça a intervir. Nesse caso podem mentir sem escrúpulos ou repetir os actos ilegais sem qualquer remorso, continuando sem consciência das implicações que o seu comportamento está a ter nos outros. Acima de tudo, não sentem culpa e os comentários que recebem dos outros, com o intuito de os corrigir, não são tidos em conta sob nenhuma forma.
Ao contrário de outras pessoas que sofrem de sintomas psiquiátricos e que estão preocupados com os seus sintomas, sentidos como estranhos e perturbadores, os indivíduos que descrevemos acham que nada está mal nas suas vidas. Um doente com uma crise de pânico está esmagado com a ansiedade que sente e procura ajuda, um doente com depressão pode sentir-se tão mal que pensa no suicídio. Nas situações que referimos, quem precisa de ajuda ou de mudar são os outros.
Falamos afinal de perturbações da personalidade, uma característica diagnóstica das classificações psiquiátricas que tem vindo a aumentar e que tem mau prognóstico, pois como já vimos essas pessoas não se põem em causa nem sentem sofrimento. Entre nós, servem de exemplo ex-autarcas, dirigentes de clubes desportivos ou alguns chefes dispersos por vários locais, a que uma comunicação social cada vez mais sensacionalista dá espaço crescente. Ora convinha que os jornais, as rádios e a televisão percebessem que estas pessoas, pela sua frieza, capacidade de manipulação e falta de escrúpulos, são capazes de levar atrás de si muita gente, porque prometem, não se importam de não cumprir e além do mais se fazem de vítimas, não estando nada interessadas, no fundo, no bem-estar dos outros, já que só vivem para si próprias.
Não se trata de um problema apenas da psiquiatria, é uma questão de sobrevivência das comunidades a que precisamos dar importância."

in xis.

posted by Luís Miguel Dias segunda-feira, junho 23, 2003

domingo, junho 22, 2003

CINEMA



Sinopse

"Depois de ser despedido, Vincent, inventa um emprego na ONU, em Genebra. Finge estar sempre ocupado, sempre a caminho de mais uma reunião urgente, partilha apenas pequenos detalhes com a mulher, Muriel, e os três filhos. Passa os dias e as semanas na estrada, em parques de estacionamento, a aprender de cor documentos que lhe permitem continuar a ficção. Mentir a todos os que o rodeiam torna-se uma ocupação a tempo inteiro."

in www.atalantafilmes.pt



posted by Luís Miguel Dias domingo, junho 22, 2003

POESIA



XIII

El hombre aquel que allí habla en la esquina,
por qué bracea tanto?,
qué importa lo que dice?
Porque no importa es el aspar de brazos,
que si importara…
Y quien soy yo para medir los grados
de importancias ajenas?
Dios le conserve al hombre su entusiasmo!
Mientras así bracea,
de sí mesmo se olvida, y con los años
su agitación, mi calma,
irán a descansar al mismo lago
de aguas muertas estériles…
Bracea ciudadano!...
Es una gran gimnasia, y en la vida
lo que importa es vivir contento y sano.

Septiembre, 1907


VII

Cerré el libro que hablaba
de esencias, de existencias, de sustancias,
de acidentes y modos,
de causas y de efectos,
de materia y de forma,
de conceptos e ideas,
de nóumenos, fenómenos,
cosas en sí y en otras, opiniones,
hipótesis, teorías…
Cerré el libro y abrióse
a mis ojos el mundo.
Transpuesto había el sol ya la colina;
en el cielo esmaltábanse los álamos
y nacian entre ellos las estrellas;
la luna enjalbegaba el firmamento,
cuyo fulgor difuso
en las aguas del río se bañaba.
Y mirando a la luna, a la colina,
las estrellas, los álamos,
el río y el fulgor del firmamento
sentí la gran mentira
de esencias, de existencias, de sustancias,
de acidentes y modos,
de causa y de efectos,
de materia y de forma,
de conceptos e ideas,
de nóumenos, fenómenos,
cosas en sí y en otras, opiniones,
hipótesis, teorías;
esto es: palabras.
Sobre el libro cerrado
que yacia en la yerba
por la luna su pasta iluminada,
mas su interior a oscuras,
descansaba una rana
que iba rondando su nocturna ronda.
Oh, Kant, cuánto te admiro!

Abril o mayo, 1908.

UNAMUNO, Miguel de, “Rimas de Dentro”, Barcelona, Mondadori, 2000, p.p. 57, 58 e 69.

posted by Luís Miguel Dias domingo, junho 22, 2003

sábado, junho 21, 2003

SAUDAÇÃO

Recebemos um convite para visitar um novo blogue. Beco das Imagens.
Apresentam-se assim:

Aqui se desenha o início de uma aventura: registar num blog todas as informações que nos pareçam interessantes no mundo da Banda Desenhada e da Ilustração. Aproveitamos o segundo mês do Salão Lisboa para dar início ao projecto que há já uns tempos vimos pensando. Esperamos que gostem e, já agora, que digam coisas. O e-mail está aí para isso:becodasimagens@mail.pt

Bem vindas, Sara Figueiredo Costa e Sívia Moldes.

posted by Luís Miguel Dias sábado, junho 21, 2003

LITERATURA



O que me aconteceu nas minhas férias

(Para Elias Fawcett, 1978-1996)

“Fomos dar as úldimas braçadas: o Blapo bringou gom o seu dubarão insuflável e levava os «bracinhos» insufláveis bosdos. E quando xegou a aldura de nos fazermos à esdrada, o Baplo regusou-se a deixar figar o beixinho. Disse que queria levá-lo bara gasa e insdalá-lo num sago, no seu quardo… o beixinho ia ser o animal dele – em vez de um gão ou um gado!
No garro, eu disse:
- Bem, Baplo, esse garapau há-de dar um rigo ambiendador bara o deu quardo.
- Borquê? – berguntou ele.
- Borquê? Borque não darda gomeça a xeirar a beixe mordo.
- Não me imbordo.
- Borque não?
- Besundo-o gom greme.
- Ai sim? Que esbécie de greme, Baplo?
- Greme bara beixes.
Dodos soldámos uma boa gargalhada ao ouvir isdo. E eu disse:
- E os rados, Baplo? Se abarece um rado de noide?
- Não me imbordo.
- Borque não?
- Borque gausa do greme de beixe.
Mais gargalhadas.
- Borque é que não voldas ao Dead Man`s Landing, Baplo, e vais busgar o garankejo mordo? Era um bom gombanheiro bara o teu beixe.
Mas o meu bai disse que o Baplo já dinha o brado xeio, brimeiro o beixe, debois o rado.
Quando xegámos a gasa dele, o Baplo abresendou a mãe ao seu novo animal.
- Esde é o meu beixe. É bradeado. É bequeno. Esdá mordo. Veio do mar. Mora nesde sago.
Gomo se esdar mordo fosse só mais uma goisa de beixe, mais um dos seus adribudos. A mãe do Baplo figou dudo menos endusiasmada. Mas quando delefonámos na manhã seguinde, bara saber novidades, o Baplo disse que o seu beixe esdava ódimo. (…)

Era evidende que o Baplo ainda não gombreendia o que é a morde.
Mas quem gombreende?
A morde esdeve muito na minha gabeça no cerão; muido na minha gabeça. Bor causa do Iliaz. O Iliaz morreu, na Cidade de Londres. E bor isso a morde andou muido na minha gabeça.
O meu papá disse que no brincíbio do verão o Iliaz foi a gasa. Foi a gasa busgar o gasago, mas o esdava no garro do meu babá e o garro esdava noudro sídio a arranjar a baderia, edc., edc. díbigo do Iliaz, andar bela cidade adrás de um gasago. (…)

Foi a gaminho do aerobordo que surgiu o dema Iliaz: o dema da morde. O meu babá disse:
- Sendes-de diferende quanto a isso? Quando à morde?
Eu disse:
- Agora já gombreendo que as bessoas morrem.
O Jagob indromedeu-se e disse:
- Eu há anos que bercebi isso.
- Não seu idioda. – Disse eu. – Eu bercebia. Mas só agora é que gombreendi.
E o Jagob gongordou. Dambém ele dinha gombreendido.
Andes, eu sabia que os garankejos morrem e que os beixes morrem. Sabia que os velhos, gom dodas as suas dores emazelas, bodiam der razões bara se sentirem grados ande a bersbecdiva do fim. E glaro que, em dodo o mundo, um crante número de bessoas dem desadres, bassa fome, sangra, arde, leva bauladas, murros, fagadas, e gaem, gaem em crante número, em dodo o mundo. Mas a morde nunga dinha esdado dão berdo, onde não devia esdar. O Baplo, O Jagob, o Iliaz. Somos a juvendude. Não somos? (…)

As férias vieram e foram-se. As férias acabaram.
Adeus a tudo.
E foi isto o que aconteceu nas minhas férias.

New Yorker, 1997.”

AMIS, Martin (trad. Telma Costa), “Água Pesada”, Lisboa, Editorial Teorema Lda., 1998, p.p. 225-230.

posted by Luís Miguel Dias sábado, junho 21, 2003

MOLESKINE

Instituto do Mundo Árabe - Paris.



"L’Institut du monde arabe accueille "Icônes arabes, art chrétien du Levant", une exposition d’art sacré, qui témoigne des évolutions de la vie et de la foi des Chrétiens d’Orient au cours des siècles. Sont présentées 80 icônes des maîtres alépins, crétois ou palestiniens et des objets liturgiques (certains datant du IVe siècle) originaires de Syrie et du Liban, ainsi que des manuscrits enluminés, dont la plupart sont exposés pour la toute première fois."

in www.imarabe.org/temp/expo.html

posted by Luís Miguel Dias sábado, junho 21, 2003

sexta-feira, junho 20, 2003

EU RECUSO!


Duas notas diferentes:

1. Recuso, continuar a aceitar como um dado adquirido, todos os anos, os incêndios que dizimam a floresta portuguesa.
Como resolver o problema? Será que ninguém, neste santo país, reflecte e decide, sobre este grave problema?
Será que este grave problema, não poderá começar a ser prevenido, pelas forças armadas portuguesas? Não poderá, não deverá, ser esta uma das novas “vocações” dos militares (juntamente com outras organizações), defender a floresta portuguesa?

2. Recuso, continuar a ouvir e a ler, nos diversos órgãos de comunicação social, a expressão deficientes. Porque não dizem e não escrevem, pessoas portadoras de deficiência ou pessoas com deficiência?

posted by Luís Miguel Dias sexta-feira, junho 20, 2003

THE ISTANBUL MAGIC BY PINA BAUSCH

It was first in 1998 that International Istanbul Theatre Festival welcomed Tanztheater Wuppertal Pina Bausch, which is when “DER FENSTERPUTZER” (“The Window Washer”), with its choreography for Hong Kong, conquered the Istanbul audience. Pina Bausch revisited Istanbul in 2000, this time bringing along the Mediterranean warmth of the South European coast as beautifully embedded in “Masurca Fogo,” which she designed with Lisbon in mind… Thus, in 2002, it was not difficult for the Istanbul audience to remember “Masurca Fogo” while watching “Talk to Her” by Pedro Almodovar.

After these two brief visits to Istanbul, Pina Bausch’s longing for Istanbul must have reached to a level that, she decided to actualize the dream project of Istanbul Foundation for Culture and Arts by beginning to work on her choreography for this mysterious city. She brought along a team of 30 members to stay and work in Istanbul for a period of three weeks. She strolled down the streets, through marketplaces, through real people, related to them, spoke with them and listened to them… She took walks by the Bosphorus and the Golden Horn, in the districts as diversified as Kasýmpaþa, Moda, Fatih as well as the Princess Islands… In the meantime, an intensive and engaging process of rehearsals was on its course. The work continued in Wuppertal until March the 21st when The Istanbul Project had its world premiere there, which is typical of Bausch since she has always chosen Wuppertal for her premieres.



The Istanbul Project or “Ein Stück von Pina Bausch” (as the choreographer chooses to call each of her works until she specifies a title she is fully pleased with) greeted its first audience in The Wuppertal Opera. In its two acts, lasted three hours through an upsurge of emotions. The nine-minute outpouring of applause also indicated how truthful the intention was to connect with Istanbul as well as the process it successfully unfolded itself into the action over the stage. The Istanbul Project is not in the least a boast of history, neither a tourist attraction, nor folklore. It is a production at a level of intensity that cannot afford clichés. It intertwines a texture whose warp-and-woof consists of emotions, thoughts and images. The Crownless Queen of the Modern Dance is at the best of her expressionist style in terms of getting her meanings across to the audience. In order to communicate how both fragile and unrelenting, how mystical, and how erotic Istanbul could all be at once, as an aqua-city in her imagination, the choreographer seems to have chosen remarkable solos as her form of expression in dance… The mystical energy pervades through the performance. Then, one feels called to remember, in Bausch’s own words, that “There are some catchers that capture and absorb you. It’s such a chance to rest on the surface of this beautiful sea, but not to the point of drifting through… It is important to know which direction you will aim your course at. We are like Lilliputians in this giant city.” Bausch does not certainly fall short in making us smile by means of her brilliant capture of what we could call as “the typical us”…(...)

in www.istfest.org/tiyatro/default.asp?lang=en




posted by Luís Miguel Dias sexta-feira, junho 20, 2003

quinta-feira, junho 19, 2003

PINTURA

Por motivos técnicos, as legendas das pinturas, não aparecem no local adequado. Pelo facto pedimos desculpa. No entanto, aqui ficam:

1. Village Landscape in the Morning Light (Lonely Tree), 1823.
2. The Sea of Ice c. 1823-25.
3. Moon Rising over the Sea.



View from the Painter's Studio.

posted by Luís Miguel Dias quinta-feira, junho 19, 2003

CINEMA

Hoje pelas 21h e 45 m, no cineclube de Guimarães, “A Cidade de Deus”.



“«Foi um acerto de contas com a minha realidade, eu era revoltado. Com a vida, com a política brasileira, com a escravidão, com a colonização. Só não fui mais revoltado com os portugueses porque meus avós eram portugueses. Mas escrever sempre foi uma necessidade. Se não fosse a “Cidade de Deus” seria outra coisa. Está dentro de mim desde criança. (…)

Paulo Lins tem 44 anos. Viveu cerca de 30 anos na Cidade de Deus, uma favela na periferia do Rio de Janeiro. O livro que traduz esta experiência foi lançado no Brasil em 1997 e está agora a ser traduzido para dez línguas. O filme, baseado no livro e realizado por Fernando Meirelles, foi visto por milhões de espectadores (só no Brasil foram quatro milhões!). Vive desde sempre com as palavras. A literatura serve-lhe para reconstituir o seu universo. (…)

Vive agora ao lado de Copacabana, em Santa Teresa. Os seus filhos, que têm 22 e 14 anos, têm uma vida muito diferente da sua. O que significou para si poder dar aos seus filhos uma infância?

- É conseguir romper a barreira social. Hoje a minha filha é classe média, se comporta como classe média. Não sabe o que é favela, não conhece essa realidade. O garoto nasceu lá, ainda viveu um tempo lá. A mãe do meu filho e a mãe da minha filha são da favela. Mas a mãe da minha filha é também historiadora, ela se formou. A minha filha é uma burguesinha.

Diz isso com que tom? Com gosto?

- Com certeza. É muito bom ver teu filho tendo uma vida digna. Estudando, numa escola, comendo bem, sem problemas materiais. Só tem problemas existenciais.

É o luxo da classe média?

- É.”

in Dna, de 14 de Junho de 2003.

posted by Luís Miguel Dias quinta-feira, junho 19, 2003

PINTURA

Friedrich, Caspar David.

"The German romantic painter Caspar David Friedrich, b. Sept. 5, 1774, d. May 7, 1840, was one of the greatest exponents in European art of the symbolic landscape.

He studied at the Academy in Copenhagen (1794-98), and subsequently settled in Dresden, often traveling to other parts of Germany. Friedrich's landscapes are based entirely on those of northern Germany and are beautiful renderings of trees, hills, harbors, morning mists, and other light effects based on a close observation of nature.

Some of Friedrich's best-known paintings are expressions of a religious mysticism. In 1808 he exhibited one of his most controversial paintings, The Cross in the Mountains (Gemaldegalerie, Dresden), in which--for the first time in Christian art--an altarpiece was conceived in terms of a pure landscape. The cross, viewed obliquely from behind, is an insignificant element in the composition. More important are the dominant rays of the evening sun, which the artist said depicted the setting of the old, pre-Christian world. The mountain symbolizes an immovable faith, while the fir trees are an allegory of hope. Friedrich painted several other important compositions in which crosses dominate a landscape.

Even some of Friedrich's apparently nonsymbolic paintings contain inner meanings, clues to which are provided either by the artist's writings or those of his literary friends. For example, a landscape showing a ruined abbey in the snow, Abbey with Oak Trees (1810; Schloss Charlottenburg, Berlin), can be appreciated on one level as a bleak, winter scene, but the painter also intended the composition to represent both the church shaken by the Reformation and the transitoriness of earthly things."

in www.geocities.com/SoHo/Museum/4782/cdfriedrich.htm


Abbey in the Oakwood 1810.

posted by Luís Miguel Dias quinta-feira, junho 19, 2003

quarta-feira, junho 18, 2003

AGRADECIMENTO

Obrigado MEC.



FÉRIAS

"Entre os símbolos mais sugestivos das férias portuguesas, a gigantesca casca de melão meia-enterrada na areia, a plurissecular marmita de Papin que guarda o arroz de grelos da gula mais-que-cega das gaivotas e o barulho macaense de cartas «elefante Branco», completamente espaçado (à deslumbrante e impecável excepção dos oito, nove e dezes) ocupam lugares sobremaneira privilegiados.
Nada há, porém, de mais sugestivo que o dia da partida de uma típica família portuguesa para férias.
Quando o Sr. Antunes, típico português, entra em férias, vem sempre de chanatas, panamá e «fato-treino Freddy Perry». Às costas traz, na medida do possível (em Portugal esta medida é, como se sabe, muito grande), a casa inteira. Um português é, por definição, um ser apegado ao lar. É por isso que, quando vai para férias, não gosta de deixar o lar em casa.
A fase de preparação para a partida é sempre importante. Durante alguns dias, o sr. Antunes dedica-se afanosamente ao trabalho de tentar estofar o «Fiat 127» com a maior percentagem física do recheio doméstico, segundo o princípio nacionalmente consagrado de que tudo pode vir a dar jeito, porque nunca se sabe. Levar duas botijas de água quente para a Caparica (para o caso de uma derreter ao Sol), pode parecer estupidez, mas mais vale prevenir que remediar, e quem ri por último ri-se melhor (e durante uma eventual 5.ª Glaciação isto ainda é mais verdade). (…)

Liga a ignição e, passados uns minutos, ei-lo rodando alegremente na auto-estrada, à velocidade que o manual oficial Fiat assegura ser de «cruzeiro», feliz por saber que já não falta asssim tanto tempo para a excursão ser paralisada pela súbita expressão, da parte de todos os passageiros, de uma aflitiva vontade de fazer «uns chis-chis».
Aproveita-se a paragem para montar o primeiro piquenique do dia. Sabendo que leva mais de uma hora para o «camping-Gaz» aquecer o óleopara os rissóis de bacalhau e querendo fugir à pequena e média empresa familiar expressamente constituída para desfiar o escamudo, ele decide proceder à primeira verificação técnica da pressão dos pneus. (…)

Dá volta ao carro e contenta-se com o dar um bom pontapé em cada pneu - «está tudo O.K.» Com voz suave mas firme, dá instruções à esposa no sentido de lhe dar uma rápida passadela a ferro no fato de treino, vincado durante a viagem pelo assento do automóvel, isto apesar do revestimento especial de lã de carneiro e da protecção da almofadinha de napa.
Fica em fato de banho enquanto a mulher tenta ligar o ferro especial de campismo (comprado em Badajoz por um primo) à tomada do isqueiro do automóvel. Desloca os testículos do forro pegajoso do fato de banho várias vezes sucessivas, até se maçar.
Irritado, por conseguinte, grita à mulher: «Olha que os rissóis estão a arrefecer!» A mulher, já vítima de três pequenas mas desconcertantes descargas eléctricas, não consegue conter a raiva acumulada e responde-lhe de rajada: «Ó querido, mas se não há fogão, como é que tu queres que eu tenha os teus rissóis quentinhos?»
Esta ameaça de iminente insubordinação leva-o para junto dos filhos, que teme o julguem menos inteligente. Dá uma forte chapada na rapariga e um beijinho molhado no rapaz. (…)

Quatro horas depois, o homem já está novamente ao volante, embora com o carro ainda parado, tentando detectar eventuais folgas na condução com bruscos movimentos laterais para a esquerda e direita. («É assim que elas se deixam apanhar!») A mulher regressa de um riacho distante, já com o último carregamento de louça lavada. «Despacha-te», diz ele, levemente enternecido pela devoção da esposa, «se não, chegamos à Caparica a horas de jantar». (…)

Chegam, por fim, à Caparica. O lar permanente é já uma memória longínqua (Reboleira). Ele já não está embriagado, mas sim abatido sob uma ressaca que lhe parece transformar o fato de treino numa cinta de casca ressequida de porco-espinho na terceira idade. «Aqueles rissóis estavam inzeitados e deram-me cabo da ursa», diz ele, sem malícia, pois que sinceramente convencido. «Beb um digestivo», aconselha a esposa, passando-lhe o garrafão do bagaço, «enquanto eu mais a Rosa montamos a tenda». Entretanto o rapaz experimenta a sua primeira fantasia erótica, folheando um «Século Ilustrado».
«Monta-me primeiro uma lona, se fazes favor», pede ele, dirigindo-se para o pinhal onde viu desaparecer o filho, enquanto luta com a rolha do garrafão, propositadamente enterrada com toda a força no gargaglo para impedir excessiva evaporação.
Cansado da viagem, adormece, embalado pelo álcool e animado pela consciência tranquila de que amanhã estará realmente a passar as férias que merece. E que ainda tem, para mais, uns diazitos para gozar em Novembro. Com a família, evidentemente."

CARDOSO, Miguel Esteves, “A Causa das Coisas”, Lisboa, Assírio & Alvim, 1986, p.p. 101-104.

posted by Luís Miguel Dias quarta-feira, junho 18, 2003

SAUDAÇÃO

Seja muito bem vindo, Aviz. O senhor que por aí vagueia, debaixo desse sol lancinante, pode ecxclamar: "Então é aqui que se deita o sol que ilumina o resto do mundo." Antunes da Silva dixit na sua obra Suão. (citámos de cor, por isso a expressão pode não ser textualmente assim, pelo facto, pedimos desculpa).
Obrigado pelo link. Cumprimentos.


fotografia in LINDO!


posted by Luís Miguel Dias quarta-feira, junho 18, 2003

terça-feira, junho 17, 2003

FOTOGRAFIA



“Helena Almeida (Lisboa, 1934). Se trata de una de las artistas más interesantes del panorama contemporáneo portugués. En sus obras convierte su cuerpo en un instrumento de mediación para la creación de imágenes, de espacios... "Mi obra es mi cuerpo, mi cuerpo es mi obra", nos dice la artista. Sus fotografías conjugan los elementos plásticos como el dibujo y la pintura, con la presencia de la artista, jugando con la idea de bidimensionalidad.
En los años setenta se consolida como artista capaz de hacer confluir eficazmente varias disciplinas. Desde ese momento, su trabajo se caracteriza por una acertada hibridación de distintos medios artísticos: fotografía, escenografía, performance y pintura. En sus obras vemos la forma en que su cuerpo, o parte de él, se encuentra alterado por manchas de pintura de color que se superponen a la fotografía en blanco y negro, sugiriendo de esta forma una relación física entre la fotografía y las líneas y colores de la pintura. Muchas de sus obras están compuestas de varias fotografías que representan una acción de gran capacidad narrativa y poética.
Los colores empleados por la artista nunca son casuales. Por el contrario, suelen llevar un mensaje implícito: el azul simboliza espacio (Tela habitada, 1976, y Estudo para um enriquecimento interior, 1977), el color blanco, pureza y purificación (Perdão, 1993), el negro, densidad y ausencia de luz (Negro agudo, 1983) y el rojo, drama y composición (Sin título, 1994-1995).
Helena Almeida realizó un gran número de exposiciones individuales y colectivas en Portugal, Bélgica, Francia, Italia, Suiza, Japón o Inglaterra.”

in www.cgac.org/esp/expo/archivo/almeid.html


Helena Almeida, Tela Habitada, 1976.

“Desde hace más de veinte años, Helena Almeida ocupa una posición estética que podemos considerar única en el arte contemporáneo. Aunque, a primera vista, sus obras se suscriben, aparentemente, a géneros estéticos familiares y códigos modernistas de representación - reproducción fotográfica, montaje y diseño, que combina con el color y los rasgos tradicionales de la pintura- pronto se vuelve obvio que estos códigos se contaminan sutilmente unos a otros. Así, nos movemos más allá de cualquier noción segura de categorías puras o de identidades determinadas: es más, somos arrastrados hacia un espacio imaginario, de fronteras permeables y cambiantes. Esta necesidad de derribar los códigos de representación existentes puede ser vista como parte de la búsqueda de un nuevo comienzo, en el sentido descrito por Edward Said: "Comenzar es hacer o producir diferencia; pero la diferencia es el resultado de combinar lo ya familiar con la última innovación del trabajo de la humanidad en la lengua.”

in www.casamerica.es/pag/1998/199805helena/expo05.htm



Seduzir


posted by Luís Miguel Dias terça-feira, junho 17, 2003

POESIA

O PRIMEIRO REI DE PORTUGAL

Oleosas cartas deslizam, indiferentes à violência das jogadas e da terra cuspida. É sempre em brancas toalhas de azevinho que poisam os rituais. No calor da fogueira, pequenas pinhas como flores, ainda em inocentes bosques mansos. Nossos olhos pela noite, a revelação.
A um canto, o avô sorri quando lhe perguntam se conheceu o primeiro rei de Portugal.


NOCTURNAS PORTAS

Portas, imensas e nocturnas portas, quando o que desejamos é um rasgão luminoso.


MARK ROTHKO

Mede a tapeçaria como quem entra no santuário e quebra o espelho de uma ausência. Suas cores são um milagre. De púrpura violácea, de púrpura escarlate, de púrpura carmesim.
Assim o manto do seu encontro. Feito de romãs e sinos de oiro. Da matéria dos holocaustos.

Para José Tolentino de Mendonça

OLIVEIRA, Mário Rui de, “O Vento da Noite”, Lisboa, Assírio & Alvim, 2002.


O PASSARINHO DO RIO AZUL

Depois da Longa Marcha realizou-se na China, uma grande batalha contra os pássaros que exterminavam a colheita de arroz das planícies do Rio Azul. Estudantes e soldados passaram dias e noites, dispersos pelos campos da imensa região, a bater com seixos em latas e bidões ou esfregando canas de bambu, para que o ruído e o estrépito amedrontassem as pequenas ou maiores, criaturas volantes e elas, assim, não poisassem em terra. Uma enorme nuvem de pássaros assustados permaneceu no ar durante sete dias e depois, desfalecidos, caíram nos precipícios ou aforam-se nas águas dos rios. Somente um pequeno pássaro chegou a Pequim, entrando numa janela aberta do mosteiro onde, desterrados, viveram os eunucos há alguns anos. Também eles, um dia, varridos da grande prisão que era a casa imperial. Agora sobrevivia apenas um no convento. O seu último companheiro tinha morrido. Era muito velho, pois ainda tinha servido a mãe imperatriz, Tseu-hi, morta em 1909. Foram quatrocentos os eunucos e agora restava apenas um. Aquele passarinho vem poisar, precisamente, no bordo da sua tigela de arroz. E então, vendo talvez nestas penas a sua antiga patroa, com gestos humildes e reverentes, volta a servir. Abre o bico do pássaro e mete-lhe um grão de arroz. Assim, até perceber que estava saciado. E depois adormeceram, ele sobre a esteira e o passarinho a seu lado, mortalmente cansados.


A POESIA MAIS BELA

Lá para os lados de Torre Pedrera, um poeta de província, na tarde de 14 de Julho de 1969, adormeceu numa praia. Sonhou que Dante lhe mostrava o seu poema mais belo.

Sou um homem solitário
como uma árvore
dentro de uma árvore sentado

Era um poema que nunca tinha escrito.

GUERRA, Tonino, “Histórias para uma Noite de Calmaria (trad. Mário Rui de Oliveira), Lisboa, Assírio & Alvim, 2002, p.p. 43 e 49.

posted by Luís Miguel Dias terça-feira, junho 17, 2003

CINEMA

Hoje, pela 01h30, no canal Hollywood, Deserto Vermelho, de Michelangelo Antonioni e Tonino Guerra.






Giuliana - “- Conheci uma rapariga.
Corrado - Onde?
- Lá.
- No hospital?
- Estava muito mal. Queria ter tudo.
- Tudo o quê?
- O médico disse-lhe que devia aprender a amar. A amar uma pessoa, ou uma coisa. O marido, o filho, um trabalho, talvez até um cão. Mas não. Marido, filho, trabalho, cães, árvores, rios…
- Não te disse o que sentia?
- Sentia que lhe faltava o chão. Tinha sempre a impressão de estar a escorregar por um plano inclinado, de ir para baixo, de estar quase a afogar-se. E de não ter nada.
- Nem o marido?
- Não, nem o marido. E além disso o marido não estava…
- Nem sequer o filho?
- Ele sim. Mas esta rapariga não tinha filhos. Quando saiu do hospital estava em tal estado que se perguntava quem era. Precisava que alguém lhe explicasse. Eu. Agora está curada.” (…)




Filho – “Porque é que não me contas uma história?
Mãe (Giuliana) – Já contei todas as que sei.
- Então conta-me a de ontem.
- Qual?
- Aquela da praia.
- Ouve, não queres descansar um bocado? Depois conto-te.
Era uma vez uma menina que vivia numa ilha. Aborrecia-se de estar com os crescidos, e as crianças da idade dela metiam-lhe medo pois brincavam aos crescidos. Por isso estava sempre sozinha, entre os albatrozes, as gaivotas e os coelhos selvagens.
Tinha descoberto uma pequena praia longe da aldeia, onde o mar era transparente e a areia cor de rosa. Gostava muito daquele canto. A natureza tinha cores lindas, e não havia barulho. Ia-se embora quando o sol se punha.
Uma manhã, apareceu um veleiro no mar. Os barcos que passavam por ali eram diferentes. Mas este era mesmo um veleiro. Daqueles que correm os mares e as tempestades de todo o mundo. E também quem sabe, fora do mundo.
Visto de longe, parecia esplêndido. Mas, visto de perto, parecia misterioso. Não se ouvia ninguém a bordo. Parou alguns minutos, e depois começou a virar e afastou-se. Silenciosamente, como tinha chegado.
A menina estava habituada às coisas estranhas dos homens e não se admirou. Mas, quando voltou à beira-mar, eis que…

[ouve-se cantar]

Um mistério ainda vá, mas dois já são demais. Quem cantava? A praia estava deserta, como sempre. Mas a voz estava lá. Ora perto, ora ao longe. A certa altura, parecia que vinha do mar.
Numa pequena baía, havia muitas rochas. Não se tinha apercebido, mas pareciam de carne. E a voz, naquele ponto, era muito doce.

Filho – Mas quem é que cantava?
Mãe (Giuliana) – Cantavam todos. Todos.” (…)

in Deserto Vermelho.

posted by Luís Miguel Dias terça-feira, junho 17, 2003

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What Heaven Looks Like: Part 4 e Krapp's Last Tape (2006) A rare chance to see the sell out performance of Samuel Beckett's critically acclaimed play, starring Nobel Laureate Harold Pinter via entrada como last tapes outrora dias felizes e agora MALONE meurt________

São horas, Senhor. O Verão alongou-se muito.
Pousa sobre os relógios de sol as tuas sombras
E larga os ventos por sobre as campinas.


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