quarta-feira, janeiro 10, 2007

ATIVIDADES ECONÔMICAS

“As atividades econômicas, no início do povoamento de Boa Saúde, eram relacionadas com a sobrevivência, através do extrativismo rural e do cultivo da terra. Os primeiros habitantes caçavam, pescavam e extraíam madeira para o consumo, além de praticarem a agricultura de subsistência e a criação de animais.

O Extrativismo Rural

Durante muito tempo a caça contribuiu para a alimentação das famílias, de maneira bastante significativa. Atualmente, essa atividade quase não existe mais em Boa Saúde e na maioria dos municípios do Estado, devido aos desmatamentos e à não preservação da fauna. Muitos animais foram extintos e outros estão em fase de extinção.
Os instrumentos de caça mais utilizados eram: a espingarda de soca, que utilizava chumbo, pólvora, bucha e espoleta, depois substituída pela de cartucho, para caças maiores, e armadilhas como o “fojo” e o “quixó”, para animais pequenos como o preá. Usava-se, ainda, a “arapuca”, sendo mais apropriada para pegar pássaros. Era comum o uso do “bodoque” e da “baladeira”, além da prática de “faxiar”, principalmente, rolinhas. As caças mais encontradas e preferidas eram: tatu, peba, preá, tejuaçú, camaleão e pássaros, principalmente nambu, rolinha e jacu.
No passado existia, com frequência, nos sítios, a criação de abelhas em cortiços, um tipo de colméia feita com duas telhas e argila, toras de madeira ôca ou caixote, que ficava pendurada nos galhos das árvores, principalmente dos cajueiros. Criava-se abelha jandaíra, cujo mel tem propriedades medicinais. Um dos principais criadores de abelhas era o Senhor Faustino Alexandre. Era comum as pessoas extraírem, nas matas, mel de mosquito e mel de uruçu, um tipo de abelha silvestre.
A pesca era outra atividade que muito contribuía para o sustento das famílias, no interior. Pescava-se nos rios e lagoas uma variedade de peixes de água doce, além de pitu e camarão. Atualmente, essa atividade quase não existe mais, com exceção dos municípios onde existem grandes açudes ou barragens. Os peixes encontrados com maior freqüência eram: traíra, curimatã, cará, jundiá e piaba. Os instrumentos de pesca mais utilizados eram: anzol, tarrafa e landuá. Na pesca da piaba era comum o uso de uma garrafa, com o fundo furado, na qual utilizava-se farinha de mandioca como isca.
A natureza, além da caça e da pesca, possibilitava outra atividade muito significativa para a sobrevivência das famílias, no passado: a extração da madeira para construção de casas, abrigos e cercados para os animais, além da fabricação de móveis e da utilização como lenha e carvão.

A Agricultura

Como em todo o Agreste Potiguar, em Boa Saúde, ainda hoje, a agricultura de subsistência é praticada nas médias e pequenas propriedades, quase sempre em solos inadequados. A organização e distribuição dos trabalhos é feita pelos pequenos produtores e seus familiares. Segundo os Censos Agropecuários realizados pelo IBGE, em 1970, no município de Boa Saúde, 88,56% das pessoas ocupadas na agricultura, eram membros não remunerados das famílias dos pequenos produtores; em 1980, esse percentual representava 82,07% e, em 1985, 88,62%. Os pequenos produtores, geralmente, não recebem incentivos do governo e muitos se obrigam a trabalhar em estabelecimentos maiores para garantir a sobrevivência da família.
Na agricultura de subsistência, os agricultores procuram retirar da terra tudo o que é possível para atender às necessidades da família. Em Boa Saúde, como na maioria dos municípios da região, as principais culturas de subsistência são: o milho e o feijão, que quase não geram excedentes para a comercialização, e a mandioca, produzida, também, com fins comerciais, principalmente sob a forma de farinha e goma.
A mandioca era cultivada pelos índios em quase todas as regiões do Brasil e o seu uso foi assimilado pelos colonizadores.
A farinha de mandioca no século XVII, depois do trigo, era o alimento mais importante do Nordeste, chegando a ser obrigatório o cultivo da mandioca, pelos senhores de engenho, por ocasião da dominação holandesa e, depois, por D.Pedro II. Além da farinha, como no passado, ainda hoje são consumidos: o beiju, a tapioca, o carimã, dentre outros alimentos à base de mandioca.
A fabricação da farinha de mandioca, ao longo do tempo, sofreu poucas alterações. Depois de arrancada e transportada para a casa de farinha, a mandioca é descascada, geralmente pelas mulheres auxiliadas pelas crianças. Em seguida, é colocada na cevadeira para ser triturada ou moída e, depois, prensada para tirar a mandicueira, um líquido tóxico. Na fase seguinte, a massa é retirada da prensa e peneirada para poder ser secada ao forno, ficando pronta a farinha.
A casa de farinha possui três peças fundamentais: a cevadeira, a prensa e o forno, atualmente movidas a eletricidade, mas que no passado eram movimentadas manualmente.
A produção de farinha chama-se farinhada. A utilização da casa de farinha pelo próprio dono durava até seis meses e, somente depois, é que era cedida aos outros produtores. O arrendamento da casa de farinha, ainda hoje, é feito pelo sistema de conga, que consiste no pagamento com um percentual da farinha produzida. A medida usada era a cuia de cinco litros. Atualmente, se usa mais o quilo.
O armazenamento da farinha era feito em saca, confeccionada com palha de carnaúba, em caixão de madeira e, quando se tratava de grande quantidade, em paiol. Transformava-se um cômodo da casa em paiol, geralmente um quarto, revestindo o piso e as paredes com esteiras de palha de carnaúba, fazendo-se o isolamento térmico e colocando-se a farinha, armazenada a granel.
Desde o passado, a casa de farinha tem sido uma presença marcante em Boa Saúde. Contam os moradores mais antigos que no povoado existiram três casas de farinha e que o funcionamento das mesmas durava até seis meses sem parar. Atualmente, existem várias casas de farinha no município, mas a produção de farinha diminuiu. Em 1970, segundo dados do IBGE, foram produzidas 664 toneladas de farinha, enquanto que, em 1985, a produção foi de 324 toneladas, o que representa uma queda de 51,20% do produto beneficiado. Vem aumentando a área plantada e a produção de mandioca no município, mas os produtores preferem vender o produto “in-natura”.
Além do milho, do feijão e da mandioca, o município de Boa Saúde produz, ainda, o algodão herbáceo e a castanha de caju.
A cultura do algodão no Rio Grande do Norte se desenvolveu inicialmente no agreste e no oeste, atingindo depois outras regiões do Estado, que, a partir de 1860, passou a exportar o algodão beneficiado através de usinas que surgiram nas principais áreas de cultivo.
Denominado de “ouro branco”, o algodão foi um dos principais responsáveis pelo crescimento da economia do Estado, da segunda metade do século XIX até o início do século XX.
Não se sabe ao certo quando foi iniciada a cultura do algodão em Boa Saúde. Contam os moradores mais antigos que na década de 1930 existiram, no povoado, duas descaroçadeiras de algodão. Uma localizada do outro lado do rio Trairi, que teria pertencido ao Senhor João Cipriano e outra na atual Praça Nossa Senhora da Saúde, que pertenceu ao Senhor João Teixeira e cujo administrador era o Senhor Otto Hackradt.
Para os médios e pequenos agricultores, o roçado de algodão era como se fosse, uma espécie de avalista; possibilitava-lhes comprar “fiado”, bem como contrair outros compromissos financeiros, inclusive empréstimos a particulares, para serem pagos por ocasião da safra.
Segundo dados do IBGE, a produção de algodão do município de Boa Saúde, em 1975, foi de 275 toneladas; em 1980, foi de 315 toneladas e, em l996 foi de, apenas, 02 toneladas. Essa queda tão drástica da produção teve como principal causa a praga do bicudo, que dizimou, quase totalmente, a cultura do algodão no Estado, perdendo os agricultores e o setor agrícola uma de suas principais fontes de renda.
A castanha de caju, a partir de l970, vem se tornando uma das principais fontes de renda do setor agrícola do município de Boa Saúde. De uma produção de 41 toneladas, naquele ano, passou para 85 toneladas em 1975, 180 toneladas em 1980 e, 193 toneladas em 1996. A produção de castanha de caju vem aumentando e compensando, de certa forma, a queda que a economia do município sofreu com a redução da cultura do algodão.

Condições do Produtor Rural

Em 1970, de um total de 471 produtores rurais existentes no município de Boa Saúde, 60,72% eram proprietários das terras, enquanto o restante estava produzindo na condição de arrendatário, parceiro e ocupante. Dez anos depois, a quantidade de produtores rurais aumentou para 802, sendo que, em termos percentuais, os proprietários representavam 63,72 % desse total. Em 1995, o total de produtores rurais passou para 1.139, com um percentual de 60% destes sendo proprietários das terras. Verifica-se que ocorreu um aumento significativo dos produtores, na condição de proprietários das terras, passando de 286 em 1970 para 683 em l995, representando um acréscimo de 58,13%, no período de vinte e cinco anos.
Quanto ao tamanho dos estabelecimentos agrícolas no município, predomina a pequena propriedade, com menos de 20 hectares, que em 1970 representava 78.77% do total das propriedades com, apenas, 16,31% da área total dos estabelecimentos. Em 1980, as propriedades com menos de 20 hectares correspondiam a 87,50% do total dos estabelecimentos, com 24,30% da área total. Em 1985, os estabelecimentos rurais com menos de 20 hectares representavam 88,62, com 17,25% da área total, verificando-se a predominância da pequena propriedade, de forma mais acentuada, onde as práticas agrícolas utilizadas são, ainda, muito tradicionais.
Nos dias atuais, como no passado, na agricultura de subsistência predomina o uso de instrumentos de trabalho manuais. Em 1980, 97% dos agricultores que responderam ao censo agrícola, no município de Boa Saúde, utilizavam força animal e, 39,06% força mecânica. No ano de 1985, a utilização da força manual representou 98,41% e, a força mecânica 57,56%, verificando-se um aumento do uso de máquinas na agricultura.
Nos desmatamentos das áreas a serem cultivadas, usava-se a foice e o machado para cortar as árvores, e a chibanca e a picareta para arrancar as raízes. Era comum a prática de queimar a vegetação depois de cortada e destocada (arrancada a raiz), sendo que se faziam queimadas sem arrancar os troncos das arvores, o que dificultava os tratos da lavoura. Usava-se o arado ou campinadeira, puxados por boi ou cavalo, para preparar a terra antes do plantio, e, depois, para limpar o mato, entre uma fileira e outra da plantação. A enxada era utilizada, como ainda hoje, para fazer as covas para o plantio e para as limpas. Era usada, também, para fazer leirões, uma espécie de lombadas de terra, destinados, principalmente, ao plantio de batata doce.
O trator vem sendo utilizado para preparar a terra destinada ao plantio. São poucos os proprietários que possuem este tipo de máquina agrícola no município, mas uma parte dos pequenos produtores têm acesso à mesma, contratando horas de trabalho ou através da cessão pelo poder municipal.
Quanto ao uso de fertilizantes, em 1970, do total de agricultores que responderam ao censo agrícola, 97,10% faziam adubação orgânica e, apenas 2,9% adubação química. Em relação ao ano de 1980, verifica-se que houve uma grande mudança neste sentido: do total de agricultores que utilizavam fertilizantes, 69,66% usavam adubo orgânico e 47,94%, adubo químico. Em 1985, 100% dos produtores rurais que responderam ao censo agrícola utilizavam adubação orgânica e 56,25 %, adubação química.

A Pecuária

A criação de gado, como nos referimos antes, começou no agreste para depois se expandir, atingindo regiões mais distantes, contribuindo para o povoamento do sertão e o crescimento da economia do Estado.
No começo do povoamento de Boa Saúde e redondezas, algumas fazendas de gado se estabeleceram, cedendo espaço, também, à agricultura. Adquirida a terra, inicialmente, através do sistema de data, depois de acostumar o gado ao novo pasto, cabia ao vaqueiro amansar e ferrar os bezerros, curar bicheiras, extinguir cobras e morcegos, cavar cacimbas e bebedouros na falta de poços no rio.
No passado, como ainda acontece nos dias de hoje, os pequenos produtores rurais são, ao mesmo tempo, criadores e agricultores. Criam animais e praticam a agricultura de subsistência e, assim, uma atividade complementa a outra. A agricultura fornece produtos, restos da plantação e subprodutos como a palha e o sabugo do milho, a casca do feijão e da mandioca, etc., que servem como alimento para a criação, por ocasião da estiagem e, por outro lado, a pecuária fornece os animais de tração para o cultivo da terra e para o transporte de pessoas e de mercadorias.
Quanto à pecuária do município, os dados existentes sobre os rebanhos são os seguintes:


Ano Bovino Suíno Eqüino Asinino Muar Ovino Caprino
1970 3.624 410 356 281 139 645 330
1980 6.052 737 328 345 90 558 279
1997 6.446 720 267 154 64 1.200 366

Fontes: IBGE - Censos Agropecuários, 1970/80
IDEMA - Anuário Estatístico do Rio Grande do Norte, 1998


O Comércio

Boa Saúde na década de 1920 contava com umas poucas casas de comércio, incluindo uma padaria pertencente ao Senhor José Rodrigues de Carvalho, que depois passou a residir em Santa Cruz
No início da década de 1930, existia uma concorrida feira e, a partir daí, o desenvolvimento da cultura do algodão e a sua comercialização assumiu tamanha importância que o povoado chegou a ter duas descaroçadeiras (unidades de beneficiamento do produto) e vários estabelecimentos comerciais. Os moradores mais antigos de Boa Saúde lembram que os principais comerciantes daquela época eram: José Fernandes, Faustino Ferreira, Antônio Constantino, Alfredo Jorge, João Jorge, José Heronides da Câmara, José Calazans Ribeiro, Otto Hackradt.
Na década de 1940, Boa Saúde contava com os seguintes comerciantes: Luiz Filgueira, Severino Dias de Paiva (Bidu), Lídio José da Costa (Lídio Jorge), João Vicente, Manoel Teixeira de Souza (Nezinho), Sebastião Cleodon de Medeiros e Joaquim Cleodon de Medeiros.
O comércio de gasolina teve início em 1945, por iniciativa do comerciante Sebastião Cleodon, que mantinha, sempre, uma reserva de duas ou três latas de 20 litros do produto, para atender eventualidades de falta de combustível nos poucos veículos que transitavam por Boa Saúde. Com o aumento da procura, o estoque passou para dois ou três tambores de 200 litros e a venda de gasolina neste sistema durou 36 anos. Em 1981, foi implantado o primeiro posto de gasolina em Boa Saúde, pelo Senhor Mário
Cordeiro de Oliveira, até hoje existente e de sua propriedade.
Nas décadas de 1950 e de 1960, Boa Saúde contava com uma farmácia, pertencente ao Senhor Otacílio Barbosa da Silva, três lojas de tecidos, de propriedade dos senhores: Severino Dias de Paiva (Bidu), Luiz Filgueira e Lídio José da Costa (Lídio Jorge) e outros estabelecimentos comerciais, pertencentes aos senhores: Sebastião Cleodon de Medeiros, Joaquim Cleodon de Medeiros, Severino Boia, José Vicente, Antônio Matias da Silva, Vidal Matias da Silva, Antônio Patrício, Antônio Félix Neto (Domício), Francisco Dias Vieira (Chico de Penina), Manoel Honorato, Fausto José da Costa, Agenor Ferreira Xavier.
Dos estabelecimentos comerciais mais antigos, permanecem apenas três: o que pertenceu ao Senhor Sebastião Cleodon de Medeiros, que continua com a Senhora Josefa Nunes de Medeiros; o que pertenceu ao Senhor Francisco Dias Vieira, que continua com a Senhora Penina Dias Vieira e o que pertenceu ao Senhor Lídio José da Costa, que continua com Alfredo José da Costa.
De acordo com os dados do IBGE sobre o comércio varejista em Boa Saúde, no ano de 1970 existiam 24 casas de comércio. Dez anos depois, passou a existir 84 e, a partir daí, tem aumentado significativamente o número de estabelecimentos comerciais no município”.

Texto do Livro: BOA SAÚDE – Origem e História
Autores: José Alaí de Souza e Maria de Deus Souza de Araújo

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