quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Introdução a Ciência do Direito 2 - Escola de Interpretação do Direito

ESCOLAS DE INTERPRETAÇÃO DO DIREITO

1)       ESCOLA EXEGÉTICA/ LEGALISTA/ CODICISTA/ RACIONALISTA ( Séc. XIX, F. Laurent)

- Influenciou a Escola Pandeccista na Alemanha.

CARACTERÍSTICAS:

A)     DOGMATISMO LEGAL – A lei é absoluta, qualquer ato ocorrido no meio social estaria previsto pela lei, o Direito seria portanto, completo e aplicável a qualquer caso;

B)     SUBORDINAÇÃO À MENS LEGIS – a interpretação estaria subordinada à vontade do legislador, defendia-se a auto-suficiência dos Códigos;

C)     ESTADO COMO ÚNICO AUTOR DO DIREITO – O Direito seria o conjunto de normas emanadas e positivadas pelo Estado, sem sofrer as influências das circunstancias sociais, políticas e econômicas.

- Para a Escola Exegética o magistrado deveria exercer somente a função de aplicar a lei, em detrimento de seus conceitos pessoas e valorativos;

CRÍTICAS:

- Dizer que só a lei é o Direito, é recusar a fonte do Direito que é o costume (autêntica e genuína expressão dos valores sociais);

- Relegou a segundo plano a investigação do ESPÍRITO DA LEI (vontade da lei);

- Com as mutações sociais o Poder Judiciário passou a adaptar o texto dos Códigos às necessidades do tempo.

2)       ESCOLA DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA DE SALEILLES (final do Séc. XIX)

CARACTERÍSTICAS:

A)     ADAPTAÇÃO DA LETRA DA LEI – a lei não deveria ficar adstrita à vontade do legislador, deveria ser adaptada ao mundo fático;

B)     DIREITO INTERAGINDO COM A REALIDADE HISTÓRICA E SOCIAL – O Direito escrito, positivado deve interagir com a realidade social. Se a sociedade evolui e o Direito fica estático, este perde a sua força.

- Para a Escola da Evolução Histórica o Direito é ditado e construído pelas circunstâncias históricas, o trabalho do intérprete é DAR VIDA AOS CÓDIGOS;

- Consciência de que o Direito estático impede o progresso em vez de promover o bem estar social;

- A interpretação deve ser atualizadora e adaptativa, não devendo, portanto, alterar ou modificar o espírito da lei;

- O Poder Judiciário não pode criar ou alterar o Direito, apenas revelar novos aspectos da Lei.

CRÍTICAS:

- Não apresentou soluções para as lacunas da lei. Como atualizar ou adaptar uma lei inexistente?

3)       ESCOLA DA LIVRE INVESTIGAÇÃO DE GÊNY.

- Escola conciliadora, uniu princípios da Escola Exegética com as necessidades do mundo contemporâneo;

- Sua proposta não visa à exclusão da lei nem diminuí-la, afirma-se: “Além do Código Civil, mas através do Código Civil”.

- Não admitia a infalibilidade dos Códigos como professava a Escola Exegética;

- Para Gêny não se deve deformar a lei, mas ao contrário, reproduzir a intenção do legislador no momento de sua decisão;

- Reconheceu que a lei apresentava lacunas, não correspondendo aos fatos supervenientes, e que os intérpretes deveriam reconhecê-las na obra legislativa e procurar por outro meio preenche-las e supri-las;

- Fez a conciliação entre os dois elementos fundamentais do Direito:

DADO (não é criado pelo legislador, elaborado pela própria existência humana, como a realidade econômica, política, social, racial, demográfica, moral, cultural)

CONSTRUÍDO (operação lógica que subordina os fatos a uma ordem de fins, considerando o DADO é que o legislador elabora, constrói o seu arcabouço de regras jurídicas)

- Para a Escola da Livre Investigação quando a lei não reflete a realidade atual o intérprete deve realizar um trabalho com bases científicas envolvendo os novos fatos sociais.

- Ocorre uma certa independência do texto legal, utilizando-se dos costumes (praeter legem) e da analogia para solucionar os conflitos;

- Liberdade do juiz tem limite na índole do sistema positivo em vigor, o trabalho de pesquisa do intérprete, só inova na medida em que integra ou completa o sistema existente, mas sem alterar o significado fundamental da lei;

- Influenciou o Código Suíço de 1907 em seu artigo 1º: "Aplica-se a lei a todas as questões de Direito para as quais ela, segundo a sua letra ou interpretação, contém um dispositivo específico. Deve o juiz quando não encontra preceito legal apropriado, decidir de acordo com o Direito Consuetudinário, e na falta deste, segundo a regra que ele próprio estabeleceria se fora legislador".

- Base orientadora do intérprete estava na idéia de justiça;

- A Contribuição de Gêny alcançou imensa repercussão em vários países, foi um passo à frente no estudo da ciência do Direito, mas não findou a complexidade da matéria.

4)       ESCOLA DO DIREITO LIVRE (início do Séc. XX)

- Foi iniciada por Hermann Kantorowicz (com o pseudônimo de Gnaeus Flavius) através da publicação em 1906 da ousada A Luta pela Ciência do Direito;

- Defende a plena liberdade do juiz no momento de decidir os litígios, podendo, até mesmo, confrontar o que reza a lei;
- Espécie de “Direito Natural Rejuvenescido”;

CARACTERÍSTICAS:
A)     REPÚDIO À DOUTRINA DE SUFICIÊNCIA ABSOLUTA DA LEI;
B)     O JUIZ DEVE REALIZAR UM TRABALHO CRIADOR E PESSOAL NA AUSÊNCIA OU INSUFICIÊNCIA DA LEI;
C)     TESE DE QUE A FUNÇÃO DO EXEGETA DEVE APROXIMAR-SE DA ATIVIDADE LEGISLATIVA.
- “Justiça pelo Código, ou apesar do Código”;
- Para Kantorowicz, haja ou não lei que reja o caso, cabe ao juiz julgar segundo os ditames da ciência e de sua consciência;
- O Direito Positivo não deve ser apenas imposto pelo Estado e formado por dogmas inquestionáveis;
- O juiz pode decidir não apenas através da ciência jurídica, mas também por sua convicção pessoal;
- Função do legislador realizada pelo magistrado;
- O que deve prevalecer é o direito justo, quer na falta de previsão legal, quer contra a própria lei;
- Liberação do intérprete da submissão absoluta dos textos legais, podendo até mesmo decidir contra legem quando o texto da lei não favorecer aos ideais de justiça;

5)       DIREITO ALTERNATIVO OU USO ALTERNATIVO DO DIREITO

- Manifestação atual da Escola do Direito Livre (Direito achado nas ruas)
- Através desse Movimento, tenta-se fazer com que as leis injustas não sejam aplicadas, com a finalidade de se alcançar o bem comum e a diminuição das desigualdades, devendo o magistrado, para isso, se utilizar de valores éticos e morais na hora de aplicar o Direito ao caso concreto.
- Tenta-se amenizar os desequilíbrios das classes sociais impedindo que a lei seja instrumento de dominação pelos mais fortes, principalmente no que se refere ao aspecto econômico;
- Aplicação de um Direito extra-dogmático ou para-estatal, para se ter decisões mais justas;
- Pressuposto de que o Direito criado pelo Estado (positivado) não atende às necessidades da sociedade;
- Conflito com o Direito Positivado em face das deficiências do aparato estatal;
Ex: Em Pernambuco, uma senhora roubou alimentos numa feira. A sentença do juiz foi no sentido de condená-la a cantar o Hino Nacional todo dia durante o período de um ano, sob o argumento de que, com isso, ela iria respeitar o país e não voltaria a roubar.

CRÍTICAS:
- Desprezo do “valor segurança”;
- A ordem jurídica deixaria de ser um todo, perdendo a sua unicidade e consistência;
- Dá margem à incerteza jurídica e improvisação, os críticos, não obstante, não defendem o imobilismo e a submissão total à literalidade da lei.

CONCLUSÃO:

A lei, em verdade, jamais será fonte exclusiva do direito, em termos objetivos. A par de sua vagueza e ambigüidade, ela concorre com a paralela produção teórico-doutrinária dos juristas, que se encarregam, assim, de convalidar por outras vias a faceta contraditória do direito. E essa convalidação por outras vias também ocorre diante de leis bastante claras, mas rejeitadas, em havendo interesse e clima para diferentes construções fático-normativas.
É evidente que o grupo social também participa do contexto jurídico, em tema de conteúdo. Aceitando e professando a ideologia dominante, a ideologia dos grupos encastelados no poder de persuasão; ou germinando, por sua conta e risco, outras idéias e valores, também os governados conseguem ratificar ou retificar o direito.
Ainda que modernas e atualizadas, as teorias jurídicas não conseguem PADRONIZAR a conduta do intérprete emocionalmente predisposto a indicar a solução mais justa e compatível com suas próprias expectativas ideológicas e um certo grau de liberdade ocasionalmente desfrutado. Quer dizer: ele, o intérprete, as conhece muito bem, e sabe que, não raro, essas teorias apontam para caminhos divergentes; ou que, por sua vagueza e ambigüidade, ora permitem o sim, ora permitem o não — tal como ocorre com as leis, costumes, razão, justiça, eqüidade e bom senso.
Em suma, nenhuma dogmática jurídica consegue eliminar o que está fora do seu alcance: a dialética do tempo; a lógica jurídica de busca das premissas; a biografia do intérprete; o mistério das palavras; o poder econômico; a força política; os sentimentos éticos e preconceitos inseridos no grupo social. Estes ingredientes é que ajudam a forjar o direito em sua concretude. Nada disso, entretanto, invalida o esforço de identificação e aperfeiçoamento das regras de hermenêutica jurídica. Construídas historicamente, elas permanecem válidas como subsídio retórico a quem se despe da força bruta para, com honestidade intelectual, contribuir com seu próprio gesto para o direito que repute possível e justo, em clima de liberdade e responsabilidade socialmente compartilhadas.



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