O novo chefe não gosta de mim…

Há alguns meses “ganhei” um novo chefe. Na primeira reunião de equipe ele fala: “Senhorita, preciso que você vá a uma reunião na diretoria, mas já sabe as regras: tome nota, mas não fale nada”. Apesar de ele não ter olhado diretamente, entendi que a mensagem era pra mim, pois era a única mulher na reunião (mas como assim ele se referia a mim com um impessoal “senhorita”, sem sequer olhar nos meus olhos, e ainda me manda ficar quieta?????). Imediatamente eu decidi que o novo chefe não gostava de mim. E não só isso, ele não gostava de mim por eu ser mulher, por eu ser jovem, enfim, por eu ser eu. Como consequencia, decidi que também não gostava do novo chefe. E mais, não gostava porque ele era machista, preconceituoso e antiquado.

Nosso primeiro mês de trabalho foi caótico: se ele fazia alguma crítica ao meu trabalho, ela era interpretada como confirmação de que ele não gostava de mim. Se ele elogiasse, estava tentando ser politicamente correto… Ele nunca me dizia diretamente o que queria ou pensava, não me olhava nos olhos ao fazer um pedido e ficava em silêncio quando eu dizia alguma coisa, como se não quisesse ouvir ou não estivesse lá muito interessado. Frustrada, procurei meu antigo chefe, contei o que se passava e disse que queria ser transferida, ao que ele respondeu “Bárbara, pode ser que seu novo chefe seja tudo isso que você acha e pode ser que ele realmente não goste de você. Mas pode ser que ele não seja machista, preconceituoso nem antiquado. Pode ser que ele não consiga se expressar bem em inglês (realmente inglês não é a primeira língua dele… nem a minha), pode ser que ele nunca tenha trabalhado com mulheres (de fato, como ele vinha da área de engenharia do Banco, havia pouquíssimas mulheres na equipe dele), pode ser que na cultura dele olhar as pessoas nos olhos seja indelicado, falar diretamente seja considerado agressivo, e a capacidade de ouvir seja mais importante que a capacidade de falar. Tente analisar as atidudes dele a partir do ponto de vista DELE.”

Que atire a primeira pedra quem nunca disse (ou pensou) “meu chefe não gosta de mim”.  Essa sensação é ainda mais comum quando o comportamento do chefe, fundamentado numa cultura diferente, se choca com aquilo que consideramos “normal”.  O princípio básico de quem trabalha em um ambiente multicultural é evitar as generalizações…. mas, quebrando a regra, aí vão algumas dicas gerais – baseadas na minha experiência pessoal e, portanto, aberta a críticas – para quem precisa se adaptar a essas situações:

1. Comunique: Certifique-se que você compreendeu exatamente o que seu interlocutor quis dizer (e que você também foi compreendido), ainda que isso signifique que você tenha que fazer perguntas ou pedir que ele/ela repita. Essa regra é ainda mais importante quando a comunicação ocorre em um idioma estrangeiro para um ou ambos os lados. E lembre-se: tão importante quanto saber falar é saber ouvir.
2. Seja flexível: Todo ambiente de trabalho requer flexibilidade, mas ela é ainda mais importante em um abiente multicultural, onde há constante necessidade de adaptação.
3. Seja tolerante: Procure compreender as atitudes do outro pelo ponto de vista dele e não o julgue.
4. Seja “culturally-aware”: Culturas diferentes demandam e valorizam comportamentos distintos. Procure conhecer e respeitar a cultura do outro e, na medida do possível, adapte-se a ela.
5. Não generalize e evite estereótipos: A cultura influencia apenas parcialmente as atitudes, enquanto estereótipos são muitas vezes baseados em idéias erradas, pra não dizer preconceituosas.Por isso, procure compreender o outro como indivíduo e não espere que todas as pessoas de uma mesma cultura ajam da mesma forma.
6. Crie relações de confiança: certas culturas valorizam a relação horizontal e a crítica direta; outras valorizam a hierarquia e desencorajam o confronto. Independentemente do tipo de cultura em que você trabalha, tente desenvolver relações de confiança, para que todos se sintam confortáveis para dar e receber críticas.

Por fim, esqueça o velho ditado “trate os outros como você gostaria de ser tratado”. Num ambiente multicultural é preciso tratar as pessoas de maneira diferenciada. Você pode achar que olhar nos olhos é sinal de sinceridade, outros podem achar que é agressividade. Você pode achar que tratar o outro pelo primeiro nome é sinal de confiança, outros de desrespeito. Você pode valorizar o diálogo, outros valorizam o silêncio. Dessa forma, ainda que você se esqueça de todas as regras acima, lembre-se desta: Trate os outros como ELES gostariam de ser tratados.

Ah! Eu e o novo chefe estamos muito bem, obrigada.

Até semana quem vem!

Bárbara