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Vargas e o Sindicalismo Oficial

Não raramente nos deparamos com notícias sobre greves deflagradas nos mais diversos setores de nossa economia. O movimento paredista muitas vezes é a mais eficaz arma dos sindicatos profissionais na busca por melhores condições de trabalho, na eterna luta entre o capital e o trabalho. A presente questão permite então, uma pequena indagação: como surgiu a legislação e os movimentos sindicais no Brasil e qual a sua ligação com a chamada “Era Vargas”?

Ao contrário do que ocorreu na Europa, onde as entidades sindicais começaram a surgir e se organizar a partir da Revolução Industrial, no Brasil, somente no final do século XIX e início do século XX é que os trabalhadores passaram a se unir em associações para a defesa de seus interesses.

Pois bem, antes do golpe de 1930 tivemos os decretos Decreto nº 979, de 6 de janeiro de 1903 e o Decreto nº 1.637, de 5 de janeiro de 1907, que, a grosso modo, imprimiram aos sindicatos o seu sentido cooperativista, mas também garantiram a pluridade sindical, bem como regularam a criação de sindicatos tendo como base a profissão, através dos critérios da similaridade e da conexidade, abrangendo empregados e empregadores, além de trabalhadores autônomos.

Da proclamação ao início da década de 1920 no século XX, a República brasileira foi a expressão da oligarquia dos grandes fazendeiros. São Paulo e Minas Gerais dominavam o cenário político em nível federal com a política do café com leite, pela qual ora o presidente era paulista (café), ora era mineiro (leite). Com a Primeira Guerra Mundial o Brasil sofreu imediatos e profundos revezes, visto que a economia do país era totalmente dependente do mercado externo. A partir deste período a desvalorização da moeda brasileira dificultou a importação produtos manufaturados. Além disso, a guerra agravou a crise cafeeira, fatos que serviram para incentivar um início de crescimento industrial no país.

Tenentes exigiam mudanças e os novos empresários não viam com muita satisfação a hegemonia dos latifundiários e uma nova força, vista como um novo e forte problema surgia junto com a industrialização: o operariado. A industrialização gerou algumas conseqüências diretas, como o crescimento da urbanização e o surgimento de toda uma série de ideologias que justificavam e embasavam a luta do operariado por dias melhores: o anarquismo, o comunismo e o socialismo, fato que incomodava as elites urbanas e rurais.

Com a quebra da política do “Café com Leite” por parte do Presidente Washington Luiz, que não indicou um candidato mineiro para a sua a sua sucessão e com o assassinato de João Pessoa, um dos líderes mais proeminentes da oposição, Getúlio Vargas assume o poder com poderes discricionários absolutos. Através do Decreto n. 19.770, de 19/3/1931, Vargas criou uma estrutura sindical oficial, também chamada corporativista, baseada no sindicato único (embora ainda não obrigatório), submetido ao reconhecimento pelo Estado e compreendido como órgão colaborador deste.

A evolução dos ideais do sindicalismo oficial ou corporativo sofreu um pequeno interregno de dois anos, entre 1934 e 1935, eis que com a Carta Constitucional de 1934, voltou a florescer no Brasil uma maior liberdade e autonomia sindicais, expressada, principalmente, pela pluralidade sindical, plenamente acolhida por esta Constituição. Entretanto, um fato histórico importante na história política brasileira veio a influenciar decisivamente a legislação sindical no país, possibilitando ao governo federal retomar o controle pleno sobre as ações trabalhistas: a Intentona Comunista de 1935.

O sucesso da revolução de 1930, com a posse de Getúlio Vargas, coincidiu com a busca mundial por regimes políticos radicais, de esquerda e de direita, retirando o espaço para o desenvolvimento de doutrinas liberais. Seguindo essa tendência, dentro do “tenentismo” e fora dele, surgiram “Legiões” inspiradas nos agrupamentos paramilitares europeus, como os “camisas negras” do fascismo italiano ou os “camisas pardas” do nazismo alemão.

Paralelamente a tais movimentos, reinava insatisfação nos quartéis pela deterioração salarial, um clima perigoso, na medida em que a impaciência da jovem oficialidade encontrava eco entre alguns oficiais superiores. Além disso, modificações no regulamento militar reintroduziram um dispositivo que existia na Primeira República, pelo qual, completados dez anos na ativa, os militares que não tivessem atingido o oficialato seriam automaticamente jubilados, com o afastamento definitivo da vida militar. Tal fato gerou outra fonte de atritos, criando um ambiente propício para aliciamento dos prejudicados interessados na revogação da medida, notadamente na região nordeste do país. Foi dentro desse clima que se desenvolveu a conspiração comunista que levaria aos levantes de novembro de 1935.

Intentona é uma palavra que veio do castelhano, significando intento louco, ou plano insensato. Foi o nome usado para designar o levante militar deflagrado pelo Partido Comunista Brasileiro em 1935, tendo como objetivo a tomada do poder. O movimento previa, em sua primeira etapa, a instalação de um governo nacional revolucionário sob a chefia de Luís Carlos Prestes. A eclosão do levante se deu no Rio Grande do Norte e depois em Pernambuco, mas a etapa mais importante foi a sublevação da Vila Militar no Rio de Janeiro, um complexo de quartéis que representavam o centro nervoso das forças incumbidas de garantir a segurança nacional. Entretanto, a revolta durou apenas alguns dias, visto que o Governo Vargas esmagou o referido movimento, “restituindo a ordem” rapidamente.

A presença dos revoltosos e sua possível, embora não provável, ameaça, serviu como uma luva aos intentos de Vargas, que decretou Estado de Sítio em 1935. Todos os movimentos dos comunistas eram monitorados pelo Governo através de informantes, mas muitos deles não foram evitados para que existisse a possibilidade de criar pânico através de uma “ameaça comunista” que, de fato, não existia.

Isto ocorria porque o mandato presidencial que havia sido dado a Getúlio Vargas pelos constituintes de 1933 expiraria em 1937 e a campanha presidencial já havia começado. Em uma tranqüilidade que beirava o absurdo, Vargas articulou a candidatura de seu sucessor ao mesmo tempo em que, com o chefe do Estado Maior, General Góis Monteiro e do Ministro da Guerra, General Dutra, montava um golpe para permanecer no poder.

O Congresso Nacional, sentindo as manobras de Vargas impede-o de renovar o Estado de Sítio. Para forçar a situação surge, em um passe de mágica, um documento que continha um plano supostamente comunista que tinha por objetivo o assassinato de personalidades a fim de tomar o poder. Era o Plano Cohen. Parte deste documento forjado chegou a ser divulgado na imprensa para que ficasse claro que o país estaria em perigo e que somente Vargas seria capaz de salvar o Brasil de ameaça tão nefasta.

No dia 10 de novembro de 1937, sob o argumento da necessidade de se colocar fim às agitações, Vargas decretou o fechamento do Congresso e anunciou uma nova Constituição , dando início a um regime ditatorial denominado “Estado Novo”.

Com a ditadura estadonovista o governo federal retomou o seu controle pleno sobre as ações trabalhistas mediante uma legislação dirigida preferencialmente às lideranças políticas e operárias adversárias da gestão oficial. O modelo oficial corporativista é então implementado no Brasil com toda a sua força através da Constituição de 1937 e do Decreto n. 1.402, de 5.7.1939. A essa altura já se tornara juridicamente explicito o que fora prática institucional desde 1935: a inviabilidade de coexistência de qualquer outro sindicato com o sindicalismo oficial.

É fato na história da legislação sindical brasileira, portanto, que as normas que regulavam os movimentos sociais emergentes jamais surgiram para atender aos anseios de uma classe operária, ou mesmo tiveram sua gênese no seio destes movimentos. Sem sombra de dúvida, a legislação que regulou os primeiros grupos sociais de trabalhadores brasileiros minimamente organizados, surgiu, de cima para baixo, para que tais movimentos se mantivessem sob o controle do Estado ditatorial, preservando o poder nas mãos de Getúlio Vargas e os interesses dos empresários da época.

Julian Faria.

2 comentários

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  2. uma bosta , um lixo



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