Amor Selvagem

Então. Antes de mais nada, permitam-me apresentar-lhes Rosemary Rogers (se é que tem alguém aqui que, como eu, não sabia disso):

Rosemary é considerada a rainha do romance histórico como o conhecemos hoje – ou seja, aqueles escritos por escritoras contemporâneas. Seus livros foram best-sellers absolutos nos anos 70. Um sucesso, pelo que soube, indiscutível.

Amor Selvagem (ou Sweet Savage Love) é seu romance de estréia e foi publicado em 1974. De certa forma, o romance reflete todo aquele comportamento desvairado e promíscuo que foi característico da época.

Mas vamos ao seu mote: Amor Selvagem conta, basicamente, a história de Virginie “Ginny” Brandon. Franco-americana, filha de senador, ela vai à América morar com o pai. Este, uma raposa política e um safado de marca maior, acha que está tudo bem mandar a filha e a mulher numa caravana para o México (então em plena Revolução) escondendo na diligência que as levará um carregamento imenso de ouro.

Para guiar a caravana, ele contrata dois guias, que o senador nem desconfia que estão a serviço da Revolução e planejam roubar todo o ouro. Um desses homens é Steve Morgan, um ex-oficial do Exército Americano que em priscas eras foi amante da mulher do senador Brandon e de mais meio milhão de mulheres na América. Por causa de uma dessas mulheres, ele mata um superior seu e é condenado à morte, sendo salvo no último minuto para tornar-se espião, envolvendo-se na causa mexicana. Os caminhos dos Brandon e de Morgan reencontram-se nessa caravana.

Steve Morgan é um mulherengo inveterado, a pessoa que mais se acha neste planeta, e que quando não está em missão está com alguma mulher. Ou várias ao mesmo tempo. Ele é bruto, rude, cruel. E conhece Ginny antes de assumir a caravana, quando por engano ela entra em seu quarto e ele a confunde com uma prostituta.

Resumindo a ópera, a estonteantemente bela Ginny e o fora-da-lei Steve vão, à medida que a caravana avança, envolvendo-se num relacionamento de amor e ódio que culmina com o defloramento de Virginie e, mais tarde, com o sequestro desta pelo espião, já que ela o reconhece durante o roubo do ouro. A partir daí, ele leva a refém oeste afora, exibindo-a como sua amante em bordéis e lugares de reputação duvidosa. Ginny, por sua vez, sente uma atração irresistível por Steve ao mesmo tempo em que o repele, em reações que beiram a histeria.

Nada neste romance é doce, como o título original diz. Amor Selvagem leva às últimas consequências a acepção da palavra “selvagem”: o estilo de Rosemary Rogers é cru, selvagem mesmo, perturbador. O ambiente e as situações são sujas, promíscuas e retratadas sem amenidades. E a descrição de época é feita minuciosamente, e se o leitor se sente jogado para dentro da história, o mérito é todo da autora.

Eu fui avançando a leitura, ora chocada com as atitudes de Steve (que muitas vezes toma Ginny à força, embora ela acabe ‘gostando’ depois – Síndrome de Estocolmo, talvez?), e ficando com outras mulheres nas barbas de Ginny; mas ao mesmo tempo ria com algumas situações. Quando você pensa que Steve não é capaz de mais nada, ele se supera. E Ginny, à medida que vai avançando na trama, vai se transformando muito e é interessante acompanhar isso. E um livro que provoca várias sensações no decorrer da leitura não pode, definitivamente, ser ruim.

O problema é que Rosemary Rogers carrega demais em suas tintas. Em determinado momento da trama, o clímax ocorre e Steve é preso. Ginny irá degradar-se até o nível mais baixo para salvar aquele que ela agora admite amar. E, a partir daí, a violência chega a níveis insuportáveis, pelo menos pra mim. Apesar de todo o choque, até este momento eu estava gostando muito do livro, achando-o ousado e cru. Não estava conseguindo parar de ler! Mas a partir da prisão de Morgan – ou melhor, até um pouco depois – eu não consegui avançar.

Já li livros policiais com cenas fortes: tortura, assassinatos, estupros. Mas isso que eu li em Amor Selvagem superou todas as expectativas. Eu me senti mal. Talvez por afetar diretamente – e de uma maneira brutal e cruel demais – os protagonistas, de quem estava gostando. Steve sofre. Ginny sofre muito mais, de uma maneira muito mais pesada. E se tem algo que me deixa realmente perturbada é a violência contra a mulher. Eu me lembrei de Os Homens Que Não Amavam as Mulheres, de Stieg Larsson. Quem leu, sabe do que estou falando. É aquela malfadada cena multiplicada por cem. E, ao contrário de Lisbeth Salander, que reage mais tarde, Ginny Brandon não tem outra escolha que não submeter-se. Doloroso demais, ao menos para mim.

Não vou dizer que não foi com dor no coração que eu abandonei este livro. Folheei mais um pouco, fui lendo pedaços aqui e ali, mas o que li não me agradou nada. E desisti da leitura. Vai levar um tempo até que eu esqueça todo esse clima pesado do romance. Não foi por falta de vontade nem de tentativa, ou por não estar gostando. Pelo contrário! Talvez eu esteja sensível demais.

Ou talvez eu mesma esteja levando muito a fundo essa história de ler por escapismo.

UPDATE: Eu já sabia, mas esqueci de dizer: esse livro é o primeiro de uma série. Eis a ordem:

  1. Sweet Savage Love (1974)
  2. Dark Fires (1975)
  3. Wicked Loving Lies (1976)
  4. Lost Love, Last Love (1980)
  5. Bound by Desire (1988)
  6. Savage Desire (2000)

Somente Amor Selvagem foi publicado no Brasil.

UPDATE 2: Teimosa como eu sou, adivinhem? Terminei o livro. E não sei até agora classificá-lo: se excelente, por toda a perturbação que me causou, ou horrível, por causa desta mesma perturbação. Fica sem classificação, por enquanto.

Sobre MizLilian

Uma incógnita, uma explosão, talvez paixão. Quem? Só uma pessoa, uma coisa à toa, ou não.
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16 respostas para Amor Selvagem

  1. Lariane disse:

    eu já sabia dos acontecimentos futuros, por isso nunca o li; Tem uma série com a continuação desse livro… E o outro livro q peguei dessa autora não gostei…

    • Glécia Maria de Carvalho Sousa disse:

      Lariane, estou louca para continuar lendo essa série ,mas onde moro não foi possível ter acesso. Como você conseguiu obter outros livros dessa autora?
      Agradeço qualquer informação!

  2. Dee disse:

    Ui, medinho!

    Nem gosto de livro assim. De violência, já basta a vida real.
    Ou os livros policiais, claro.

  3. É acho que não iria gostar também se é assim, cada um tem seu limiite, eu abandonei Quando os Adams saíram de casa – por que começou a ficar muito perturbador um grupo de crianças torturando uma mulher. Nem me fala da cena de Os homens que não amavam as mulheres, acabei de ler, mas o livro é muito bom, vou começar o 2º.

    Bjus

  4. Dee disse:

    Cláudia, esse eu li TODO, mas fiquei uns dias super deprimida! Ele me deixou tããããão… como dizer?… desanimada com a vida. Levou toda a minha alegria de viver. Depois eu melhorei, claro, mas foram dias negros.

  5. Bruna Britti disse:

    Xiii, eu ainda to indecisa quanto a ler ou não. (mas de qualquer forma teria que caçar num sebo). A Carícia do Vento segue um pouco o estilo, mas é como eu te falei, do modo que vc me descreveu, acho que Carícia é bem mais leve. Quando a autora é boa mesmo consegue passar esse sentimento p/ gente, seja de ódio ou amor. Quando li o da Janet foi como se eu tivesse lá, sofrendo com a moçinha. (tá certo q quis tacar o livrio na parede depois). Mas mesmo assim, to achando esse forte demais. O.o Será q o povo da época desses romances não ficou chocado não? rsrs

  6. Lucy disse:

    É UMA PENA QUE VC NÃO TENHA TERMINADO A LEITURA ,POIS É UM LIVRO FASCINANTE,E REALMENTE NOS ENVOLVEMOS DE TAL FORMA COM O CASAL,QUE QUANDO CHEGA NESSA PARTE DO LIVRO VÁRIOS TIPOS DE EMOÇÕES NOS ENVOLVE,É IMPOSSÍVEL FICAR IMUNE A ESSA HISTÓRIA.TENHO MAIS ALGUNS DESSA SAGA EM ESPANHOL E POSSO TE DIZER QUE A PAIXÃO SEGUE COM A MESMA INTENSIDADE,SÓ QUE COM ACONTECIMENTOS MENOS TURBULENTOS PELOS QUAIS PRINCIPALMENTE GINNY PASSOU.
    É UM LIVRO MARAVILHOSO E COM UM PÚBLICO QUE VEM CRESCENDO MUITO NA INTERNET.
    QUANDO VC ESTIVER SE SENTINDO MAIS INSPIRADA, DE UMA NOVA CHANCE A ESSA LEITURA, ELA MERECE.

    • Incrível, esse livro. Eu li todo ano desde a primeira vez, em 95. Em 2006 me mudei de cidade e perdi o livro na mudança. Ninguém deveria abandonar essa leitura, muitas vezes a gente tem que superar as dificuldades pra emergir mais forte. Foi o que aconteceu com a Ginny. Ao contrário do que eu li nos comentários, acho que o sofrimento é da vida e a história se passa durante a revolução do México. Não podia ser diferente. A carga de violência é suportável e superável, se você tiver fé e espírito de superação. Queria demais baixar o livro e ler as sequências. Alguém tem alguma dica???

  7. Malu Mota disse:

    Lembro que li este livro há vários anos atrás, era bem novinha ainda… choque, humor e paixão, dentre outros sentimentos se mesclavam de acordo com o decorrer da leitura. Queria MUITO que os demais livros que compõem a série fossem traduzidos e lançados por aqui também. =) Achei sua resenha muito boa, por sinal.

  8. Glécia Maria de Carvalho Sousa disse:

    Adorei ler este livro!
    Gostaria de saber se seria possivel ler a continuação dessa série de livros.

    • MizLilian disse:

      Glécia, o único jeito de você ler é rezar pra que publiquem. Eu não conheço nem quem tenha feito essas traduções de internet. Só existem traduções para o espanhol ou o original em inglês.

  9. Glécia Maria de Carvalho Sousa disse:

    Caso um milgre aconteça, deixe-me informada, por favor.
    Obrigada!!

  10. Olha, tenho que dizer que fiquei chocada com sua descrição do livro. Nunca havia ouvido falar nele, tampouco na autora, mas me perturba saber que existe gente que consegue admirar isso tudo. Esse tipo de violência contra a mulher que não é questionada nem superada na literatura me deixa fula da vida, e fico ainda mais estarrecida quando a personagem parece gostar desse tipo de coisa. Para mim, isso gera um incômodo muito grande porque cria uma aceitação velada desse tipo de abuso. Muita gente lê e acaba considerando isso normal ou aceitável, ou até mesmo desejável. Que mundo é esse? Assim como vejo milhares de livros voltados para adolcescentes com protagonistas que se rebaixam para agradar um carinha que nem dá bola para elas (ou muitas vezes até as ofendem na intenção de mantê-las afastadas) e acho ridículo, ver livros voltados para mulheres adultas que curtem esse tipo de relacionamento abusivo em nome do “amor” ou de uma “paixão desenfreada” me faz pensar que ainda hoje o que faz sucesso é ver uma mulher ser degredada, apesar de todos os avanços nos direitos femininos.

    Adorei sua sinceridade – me fez pensar bem no assunto.

    Beijos,

    Jaqueline (@ja_santana)

  11. Daiane de paula disse:

    Olá… Gostei mto da definição do livro e sua história! Escrevi um livro tambem chamado amor selvagem beem antes de conhcer a obra de Rosemary…nossas histórias são bem diferentes! Mas é forte e marcante igualmente! Gostaria de conversar mais sobre livros…entre no meu e-mail para que possamos trocar idéias! É daiane_aspasia@hotmail.com…..mtos beijsss day

  12. Pra mim esse é o melhor livro de romance que ja li!!! E olha q ja li muuuuiiitos!!! Ta certo que a autora exagera na parte em que Ginny é usada por alguns homens, mas o conjunto da obra em si supera essas passagens trágicas. O que acho mais interessante no livro é como a mocinha amadurece no decorrer da história, a transformação é nítida e te faz evoluir junto com a personagem. Ja o mocinho, que tem uma personalidade dura e cruel, vai aos poucos se rendendo aos encantos da mocinha. Para uqe isso aconteça ambos sofrem muito, e apesar da forma que Steve a trata, pra mim ele sempre gostou dela. Li na adolescência, e apesar disso não me senti chocada. Adoro livros intensos, prefiro esses aos água com açucar, principalmente quando o mocinho depois de fazer a mocinha sofrer se arrepende e admite seu amor!!! Acho lindo…. Super recomendo!! Nesse mesmo estilo li A Carícia do Vento… AMEI!!!! Gostaria de sugestões de livros nesse estilo… BJOSSS!!!

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