Ministério Público não sustenta acusação de 19 crimes de corrupção a ex-deputado

O procurador do Ministério Público reconheceu ontem, em Figueiró dos Vinhos, ter «alguma dificuldade em suportar a acusação» relativamente aos 19 crimes de corrupção que são imputados ao ex-deputado do Partido Socialista, Carlos David Lopes.

Denis Alves começou as suas alegações finais dizendo que a acusação, do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), devia ser defendida pelo magistrado que a proferiu. Contudo, considerando-se um «humilde procurador da província», afirmou que «paulatinamente» conseguiu «navegar nas águas vertidas na acusação».

Referindo-se à base da acusação, a angariação ilícita de fundos para a campanha eleitoral autárquica de 2005, o procurador referiu-se ao facto das diversas testemunhas terem passado pelo tribunal para negar qualquer contacto ou doação de verbas, ao arguido Carlos Lopes, para aquele fim.

Denis Alves classificou os arguidos como pessoas com «alta craveira intelectual» para depois dizer que «há aqui qualquer coisa que me escapa». Fazendo referência a documentos apreendidos ao ex-deputado, o magistrado afirmou que: «então o arguido andou a gozar com tudo isto» ao ponto de «de usar folhas timbradas da Assembleia da República e inventar nomes de pessoas, de empresas, números de telefones, montantes doados e outras referências».

Daí que o procurador tenha tentado sensibilizar o coletivo de juízes para o «verdadeiro meio de prova» que é «o teor das escutas telefónicas transcritas na acusação» para além dos «documentos apreendidos com uma panóplia de referências».

Porém, o magistrado referiu-se ao facto dos alegados crimes terem ocorrido em 2005 e da acusação ter sido proferida em 2010, para, com base nas alterações entretanto introduzidas no Código Penal afirmar ter «alguma dificuldade em suportar a acusação relativamente aos 19 crimes de corrupção passiva».

Já quanto aos restantes crimes, de que é acusado o arguido, nomeadamente, tráfico de influências, peculato e falsificação de documentos (estes dois últimos em coautoria com os arguidos Pedro Lopes e Luís Silveirinha), o procurador não tem dúvidas que foram efetivamente praticados.

Referindo-se ao crime de peculato, em que os arguidos terão pago despesas da campanha eleitoral através das contas do Município, Denis Alves disse que «era perfeitamente viável que tal tivesse acontecido» até porque «eram pessoas que tinham acesso às contabilidades da campanha e da autarquia» tendo em conta as funções que exerciam em ambas as estruturas.

Por sua vez, o advogado de defesa de Carlos Lopes, começou por lamentar que o arguido já tivesse sido punido na opinião pública, uma vez que antes de conhecida a acusação do DCIAP tenha sido motivo de primeira página de jornais de âmbito nacional.

Magalhães e Silva disse, depois, que na acusação «não está descrito factualmente nenhum crime de corrupção» e adiantou que «não há nenhuma garantia» que os documentos apreendidos em casa do seu cliente, «sejam efetivamente pertença do próprio».

O advogado criticou, ainda, que «face à documentação apreendida e às escutas realizadas não foi feito o trabalho de casa» adiantando que o «Ministério Público ou a Polícia Judiciária devia ter-se instalado em Figueiró dos Vinhos» para averiguar os factos até à exaustão.

Magalhães e Silva ocupou parte do seu tempo de alegações finais falando da «legalidade ou eficácia» das escutas telefónicas como meio de prova, tendo procurado convencer o coletivo de juízes para a falta de produção de prova em sede de julgamento. Na sua opinião, «é preferível absolver com dúvidas o arguido» já que «o tribunal só pode concluir que não está provado» a ilicitude referida pela acusação.

Também os defensores de Pedro Lopes e Luis Silveirinha se basearam na falta de produção de prova para pedir a absolvição dos seus constituintes, uma vez que «fazer justiça tanto é condenar como absolver».

Para o advogado de Pedro Lopes, «cabia à acusação provar os factos» mas «o que foram trazidas a este tribunal foram meras considerações».

Também o defensor de Luis Silveirinha entende que «as escutas telefónicas não podem ser valoradas por si só» pelo que «afigura-se que não foi produzida prova quanto aos dois crimes de peculato e um de falsificação de documentos» de que o seu cliente é acusado, em coautoria com Carlos Lopes.

«A prova tem de ser da acusação e não se pode andar aqui com suposições» disse o advogado, adiantando que «a pena já os arguidos apanharam, ao ver os seus nomes enxovalhados nos jornais».

Durante parte da manhã, o coletivo de juízes ouviu diversas testemunhas de defesa, tendo Carlos Lopes não conseguido conter a sua emoção ao ouvir o depoimento de Paiva de Carvalho.

O ex-governador civil de Leiria não poupou a elogios ao seu antigo chefe de gabinete, referindo tratar-se de um «homem educado, humilde, generoso e sempre pronto a ajudar o seu semelhante». Paiva de Carvalho disse, ainda, que Carlos Lopes é uma «pessoa completamente íntegra» acrescentando que «nunca tive nenhum colaborador tão leal como ele». Disse, ainda, que «temos de ser na política o que somos na vida» mesmo que «não estejamos isentos que nos criem problemas», tal como «está a acontecer com o Carlos Lopes». «É muito triste estamos sujeitos a processos como estes», disse.

Outra das testemunhas abonatórias foi o atual presidente da Câmara Municipal de Figueiró dos Vinhos. Arrolado pelo arguido Luis Silveirinha, Rui Silva disse aquele «está entre os melhores funcionários da autarquia», sendo uma pessoa «educada, responsável, que sabe trabalhar em equipa».

Ao procurador do Ministério Público, o autarca social-democrata, disse ter sido vereador da oposição durante dois mandatos, e que «diga-se, em abono da verdade, que nunca notei nada de anormal», acrescentando que «sempre houve boa fé da parte de quem lá esteve e de quem lá está».

A leitura do acórdão ficou agendada para as 9:30 horas do dia 18 de novembro.

Orlando Cardoso | Diário de Leiria | Diário de Coimbra

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