segunda-feira, 19 de novembro de 2007

A Favor da Liberdade

A Favor da Liberdade

Jorge Pinheiro

Li recentemente na revista on-line No, a indignação de um articulista sobre a decisão do ministro Marco Aurélio Mello, membro do Supremo Tribunal Federal, por ter revogado a prisão preventiva de Salvatore Cacciola, dono do Banco Marka. A mídia não somente tem criticado este caso, como também a soltura de Luiz Estevão, ex-senador da República e mais recentemente o do Rei das Quentinhas.

A opinião pública não entende, a razão que leva um magistrado à conceder habeas corpus em situações como estas.

Antes de mais nada, há necessidade de explicar à população, que uma pessoa só pode ser presa em duas situações. A primeira, em flagrante delito, ou seja, quando acabou de cometer a infração e é perseguido ou é encontrado com elementos que levem a crer ser o autor do crime, a segunda só por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente.

Não há dúvida nenhuma ser a prisão um mal necessário, porém a regra geral é evitar o enclausuramento. Em geral, a prisão de uma pessoa serve como exemplo e satisfação para a sociedade.

A prisão preventiva que foi decretada para as pessoas citadas acima, foi uma medida excepcional, e o magistrado deve ter baseado a decretação, na garantia da ordem pública, na preservação da instrução criminal e na fiel execução da futura pena à ser aplicada.

As decisões de um juiz estão sujeitas à revisão, logo estas pessoas recorreram aos juízos competentes e solicitaram uma ordem de habeas corpus, e foram concedidos os respectivos alvarás de soltura.

A maioria da população fica sem entender o processo. A Constituição Federal garante que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, isto é, uma pessoa deve recorrer em todas as instâncias do judiciário, e só será considerada culpada se na última instância ela perder e não tiver mais condições de recurso.

A Carta Magna de 1988, em seu artigo 5°, inciso LVII, encerra o princípio da inocência. Até prova o contrário, todos são inocentes. Em um país, ávido para pertencer ao primeiro mundo, não pode adotar o sentido inverso, isto é, todos são culpados, até prova em contrário.

Salvatore Cacciola passou 37 dias detido e foi denunciado por gestão fraudulenta e peculato. O decreto de prisão preventiva foi baseado em uma conversa telefônica, onde houve a suposta tentativa de influenciar os membros do Ministério Público e também solicitava ao seu advogado um aceleramento de um processo contra determinado Procurador da República.

Luiz Estevão ficou detido por um único dia na carceragem, em virtude de ter lesado mais de mil pessoas em um consórcio de carros. Responde o processo criminal por formação de quadrilha, peculato, corrupção passiva, falsidade ideológica, estelionato. Além de ser acusado de está envolvido no esquema da construção do Tribunal Regional do Trabalho em São Paulo.

No caso Cacciola, o ministro Marco Aurério Mello concedeu uma liminar em habeas corpus e este poderá aguardar em liberdade, até o julgamento do mérito. Por ser estrangeiro, sem dúvida nenhuma ficou mais tempo no cárcere, em virtude de um dos fundamentos da prisão preventiva é a segurança da aplicação da pena, não sendo brasileiro poderia evadir-se.

O ministro Marco Aurélio é um dos magistrados mais respeitados do Supremo Tribunal Federal, em virtude da sua coragem e lucidez, e tem tomado decisões de vanguarda, daí ser elogiado pela nova magistratura do Distrito Federal. A revogação da prisão preventiva e a conseqüente ordem de habeas corpus foi baseada no excesso de prazo da escuta telefônica e o risco de se ausentar-se do país considerou como inerente a toda investigação criminal.

O ex-Senador da República Luiz Estevão está proibido de se ausentar do país, por determinação do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, porém o magistrado Fernando Tourinho Neto concedeu a liminar no habeas corpus e o colocou fora do cárcere.

A questão do problema é se os acusados preenchiam os pressupostos processuais e a admissibilidade da prisão preventiva. É indubitável este preenchimento, porém a fundamentação que é prevista na lei processual penal, não tinha sido devidamente cumprida, conforme entendimento das instâncias superiores.

Devemos levar em consideração o segundo maior bem do ser humano, que é a liberdade. Como diriam os romanos, o jus libertatis é um bem jurídico primordial. Não esqueçamos que Rudolph Hess, vice-führer do 3° Reich da Alemanha Nazista, foi condenado a prisão perpétua pelo Tribunal de Nürenberg, e o cumprimento da pena foi em um castelo, com criadagem e tudo, porém não podia em momento algum sair do castelo, apesar de ter toda uma mordomia a seu serviço. Nem por isso vivia feliz.

O magistrado no seu dia a dia corre sérios perigos. Há a possibilidade de ficar insensível com as situações rotineiras dos males da humanidade, de dar uma sentença precipitada e conseqüentemente com exageros.

Ainda bem, que a maioria da magistratura utiliza o princípio do favor libertatis, ou seja, a favor da liberdade. E o Supremo Tribunal Federal como guardião da Constituição protege o princípio do contraditório, da ampla defesa, do direito de liberdade princípios estes primordiais e essenciais em qualquer país civilizado.

Publicação: “Jornal O Liberal 29 de julho de 2000. Opinião – Atualidades”

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