Práticas de Desenho
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O desenho contemporâneo.
O exercício da realidade. A imagem como ficção.
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[Notas de aula]
No confronto directo das imagens, o desenho reserva o espaço de «especulação» relativamente ao entendimento das coisas e do mundo. “ Quem desenha procura qualquer coisa que não pode obter de outra forma.” Os problemas levantados pela contemporaneidade obrigaram de algum modo o artista a tomar posições, fazer opções, definir estratégias. No fundo o desenho realiza o projecto contemporâneo nas sucessivas pressões exercidas pelas constantes mudanças, e estratégias.
Ao longo do século XX, sobretudo a partir dos anos 60, as concepções e usos do desenho passaram por diversas transformações, quer ao nível do conceito, aquilo que se entende hoje por desenho, quer ao nível da disciplina, ou o estatuto da disciplina.
Os anos 60 conduziram à desmaterialização do objecto artístico, ao esvaziamento da carga emotiva do desenho. Este esvaziamento levou à distinção e clareza das marcas e dos materiais, conduzindo ao esfriamento do gesto e à racionalização do desenho.
No minimalismo o desenho passa de algum modo a ocupar a essência do trabalho e do projecto minimalista. Não só está presente no processo como acaba por ocupar-se ele próprio, do espaço de afirmação da própria ideia de minimalismo.
Na década seguinte o desenho enfatiza alguns procedimentos do legado minimalista, levando até ao limite do processo mental. Não obstante toda a exploração de novas prestações materiais e de vocabulário no desenho, na aproximação ao quotidiano.
A Land art explorou a paisagem pelo desenho, não como género, mas como suporte de marcas (Walkscapes) que decorrem de toda uma investigação feita a partir do desenho e produzida na paisagem.
A identificação «clássica» do desenho com a linha e o gesto e a pintura com a mancha e a cor, não foi apenas classificada de redutora, mas sobretudo já não fazia sentido numa época em que o principio da oposição entre disciplinas tinha sido completamente superado pelas novas investigações no campo da arte.
Na década de oitenta e seguintes, o desenho passou de algum modo a ocupar um espaço comum às diferentes disciplinas, marcando decisivamente o percurso do desenho contemporâneo.
Nos últimos anos, muitos artistas exploraram o vocabulário formal típico do desenho, em suportes e materiais convencionais da pintura, da fotografia, do vídeo, da escultura, ou das novas tecnologias.
A intenção com que faz o desenho determina a sua legibilidade enquanto desenho. Para Bruce Nauman, “desenhar equivale a pensar, […] os desenhos são feitos com a mesma intenção com que se escreve, são notas que se tomam”. Independentemente do objecto final o desenho está sempre presente até ao ponto de rotura, ponto a partir do qual se manifesta a intenção, ser ou não ser um desenho.
Parece sintomático de parte substancial dos desenhos contemporâneos esta questão da intenção. A intenção implica uma tomada de posição, uma estratégia de desenvolvimento do desenho, no sentido de tornar absolutamente claro aquilo que o artista pensa.
Quando Molina escreve sobre a posição do desenhador contemporâneo, fá-lo no sentido de entender o comportamento (actual) de quem desenha. Utiliza igualmente a palavra estratégia, como a que melhor define o comportamento ou as actuações do desenhador contemporâneo.
O termo estratégia não é lido num sentido negativo, calculista para o aproveitamento com êxito de determinadas acções, mas estratégia no sentido da resolução de uma situação pontual, que obriga a tomar posições imediatas. “A estratégia vincula-se mais na acção de desenhar do que ao próprio desenho.”
Parece existir, ainda, segundo Molina um carácter trágico que se desencadeia em quem desenha e que de algum modo o conduz num processo em que os resultados são quase sempre incertos.
De resto o desenho parece estar associado a esta espécie de fatalidade. Mais uma folha menos uma folha para desenhar, e não necessariamente mais um desenho, ou menos um desenho.
“A necessidade de ver «o cenário» e «o teatro de operações» em função de movimentos, é também uma imagem clarificadora da acção do artista”.
De algum modo mostra a quem desenha, a forma como encontra o sentido do desenho, quer no processo, quer em função dos problemas decorrentes do próprio enunciado. Este processo desenvolve-se naturalmente nos desenhos e a partir dos desenhos, cujas referências são sempre outros desenhos.
Com o desenho digital alterou-se definitivamente a relação do artista com a obra, do artista com o suporte e esvaziou por completo a carga emotiva e processual do desenho. A relação com o desenho é agora mediada pela simulação do próprio desenho, os materiais são a simulação dos próprios materiais, os gestos são simulação dos próprios gestos. A relação do desenhador com o desenho, faz-se agora a partir de actuações previsíveis e possíveis de determinar à priori.
A reclamada autonomia do desenho coloca hoje o discurso do desenho a um nível que naturalmente já não é apenas do desenho. Para alguns críticos e historiadores, o que falamos agora relativamente ao desenho, não se refere exactamente ao desenho, mas em ultima instância, a uma espécie de sucedâneo do próprio desenho.
A autonomia do desenho relativamente às outras artes, e às outras disciplinas, parece ter afastado definitivamente o desenho dos aspectos de carácter funcional e de disciplina; e a contemporaneidade alterou definitivamente a (nossa) relação com o desenho.
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Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto
2009,JSM
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http://www.newarttv.com/index.php?id=210
http://www.timknowles.co.uk/Work/TreeDrawings/tabid/265/Default.aspx
http://www.ilikedrawing.co.uk/
http://artscenecal.com/ArticlesFile/Archive/Articles2005/Articles1105/OMunozA.html
http://www.marcelvaneeden.nl/archief133.html
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