quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Naquela Mesa

Naquela Mesa
Composição: Sérgio Bittencourt

Naquela mesa ele sentava sempreE me dizia sempre, o que é viver melhor.Naquela mesa ele contava histórias,Que hoje na memória eu guardo e sei de cor.
Naquela mesa ele juntava genteE contava contente o que fez de manhã.E nos seus olhos era tanto brilho,Que mais que seu filho, eu fiquei seu fã.
Eu não sabia que doía tantoUma mesa no canto, uma casa e um jardim.Se eu soubesse o quanto doi a vida,Essa dor tão doída não doía assim.
Agora resta uma mesa na salaE hoje ninguem mais fala no seu bandolim.Naquela mesa tá faltando eleE a saudade dele tá doendo em mim.


Ultimamente me dei conta do quanto me tocava o coração a letra dessa música, especialmente quando cantada na voz forte, grave e nostálgica de Nelson Gonçalves.
Durante alguns dias parei para observar como meus filhos reagiam corporalmente e emocionalmente aos meus carinhos e atenção.
Voltei a escutar Naquela Mesa por diversas vezes como instrumento na descoberta dos meus próprios sentimentos.
Percebi que eu estava com saudade. Mas como ter saudade do que você não teve? Meu pai não me contava histórias, não viveu comigo e não me disse como é viver melhor.
Pois é. O sentimento é assim, quase sem lógica.
Nos momentos de insegurança me pego com saudade de um pai.
Foi nesse contexto que uma outra música me chamou a atenção: Pai, de Fábio Jr.:

Pai!Pode ser que daqui a algum tempoHaja tempo prá gente ser maisMuito mais que dois grandes amigosPai e filho talvez...
Pai!Pode ser que daí você sintaQualquer coisa entreEsses vinte ou trintaLongos anos em busca de paz...
Pai!Pode crer, eu tô bemEu vou indoTô tentando, vivendo e pedindoCom loucura prá você renascer...
Pai!Eu não faço questão de ser tudoSó não quero e não vou ficar mudoPrá falar de amorPrá você...
Pai!Senta aqui que o jantar tá na mesaFala um pouco tua voz tá tão presaNos ensine esse jogo da vidaOnde a vida só paga prá ver...
Pai!Me perdoa essa insegurançaQue eu não sou maisAquela criançaQue um dia morrendo de medoNos teus braços você fez segredoNos teus passos você foi mais eu...
Pai!Eu cresci e não houve outro jeitoQuero só recostar no teu peitoPrá pedir prá você ir lá em casaE brincar de vovô com meu filhoNo tapete da sala de estarAh! Ah! Ah!...
Pai!Você foi meu herói meu bandidoHoje é maisMuito mais que um amigoNem você nem ninguém tá sozinhoVocê faz parte desse caminhoQue hoje eu sigo em pazPai! Paz!...

Minha saudade do que não tive não passou. Não sei se passará. Não sei se carência passa.
Só que hoje também sou pai e tenho a oportunidade de sentar à mesa e dizer aos meus filhos o que é viver melhor, que dá para ser mais que bons amigos, dá pra ser pai e filho(a).
Filha e filhos. Amo vocês.

domingo, 17 de outubro de 2010

O Monge e o Executivo

O Monge e o Executivo
Anotações e reflexão pessoal sobre o famoso
livro de James C. Hunter


Passado o primeiro turno da eleição de 2010, eu me encontrava cansado e, vislumbrando a chegada de um final de semana prolongado, visitei uma livraria no shopping com o intuito de comprar jornais diários e algumas revistas para uma leitura descompromissada e relaxante.
Fiquei um bom tempo em frente às prateleiras onde estão localizados os jornais e periódicos e praticamente nada me chamou a atenção.
Decidi passear pela livraria vendo os títulos em exposição.
Naquele momento tive a sensação de não saber direito o que estava fazendo.
Meus olhos bateram meio sem querer no livro “O Monge e o Executivo”. Um amigo já tinha recomendado a sua leitura.
Parei e li seu subtítulo: “Uma história sobre a essência da liderança”.
Logo me interessei, pois o resultado eleitoral tinha confirmado um sentimento que vinha crescendo em mim desde 2007, qual seja, o de que os nossos representantes políticos locais têm mais Poder que liderança, por isso mesmo vulneráveis.
Comprei o livro sem sequer observar seu índice (raramente faço isso!).
Ao iniciar a leitura fácil, agradável e simples logo relembrei que “nada é por acaso”, que “coincidências não existem” (cansei de ouvir isso de Pierre Weill). Percebi neste momento que cada um de nós tem seu Semeão.
Eu realmente precisava ler aquilo, pois me identifiquei bastante com John, quando concluiu que sua vida era aparentemente muito boa e cheia de satisfações, mas se chocou ao perceber que as coisas não são como parecem ser.
Esse trecho do livro, mormente no trecho em que ele constata sua realidade com esposa e filhos, me fez chorar.
Daí por diante devorei as páginas como uma fome incrível de mais informações sobre mim mesmo (neste momento eu já tinha esquecido da eleição).
Descobri que sou arrogante, impontual, desobediente, que não sei ouvir, que corro mais atrás de poder que da liderança de mim mesmo, que resisto a mudanças, que tinha esquecido que Jesus é o melhor modelo de homem e liderança a ser seguido, que é necessário amar e servir os que estão ao meu redor, que liderar exige atenção às necessidades dos liderados, que servir implica em sacrifício, que intenções sem ações é igual a nada.
Como querer liderar desta forma?
Por fim, descobri ou relembrei que eu não estava condenado permanecer assim por toda vida, muito menos podia atribuir a alguém a responsabilidade por aquele diagnóstico, aquilo dizia respeito às escolhas que fiz até então e o futuro dependia das novas escolhas que eu faria.
Terminei de ler o livro com uma vontade enorme de realizar coisas que permaneçam para além de meu estágio nesta terra e com uma vontade enorme de sentir o prazer que John sentiu no abraço relatado na última página.
Quando voltei meu olhar para fora de mim, pensei alto: o político que buscar seguir o modelo de liderança proposto no livro poderá receber como recompensa a felicidade e o abraço do povo.


quarta-feira, 25 de agosto de 2010

TRISTE FIM DE POLICARPO E NARCIZO

Aracaju, 19 de Agosto de 1986

Meu caro Senador (...omissis...)

É com todo o respeito que dirijo-me ao amigo para, diante das dificuldades do momento, afirmar que lastimavelmente estou chegando a conclusão que o homem não vale somente bem que faz ou pode fazer. Nem mesmo por ser sério e fiel aos amigos. O exemplo de ontem na Assembléia, é prova disso. Lá estão envolvidos um seu compadre, um aliado e um quem o grupo ajudou eleger.
Além da vitória o governador conseguiu injetar no eleitorado uma injeção de esperança de ganhar as eleições através de métodos pouco recomendáveis, mas para muitos válidos. Feio é perder. Argumentam.
Como o Senador tem se demorado pouco em Aracaju, talvez não esteja sabendo de tudo. Existe pressões junto ao Deputado (...omissis...) para que a vaga a ser aberta na chapa do PMDB, por seu intermédio, não lhe pertença. No caso, não seja minha conforme o combinado.
Em isso acontecendo o Senador vai me perdoar. Não posso elogiar e votar em quem me rejeita.
Terei que reunir os amigos, como fiz quando acertamos a minha candidatura, pedir-lhes desculpas, liberá-los, e contar um pouco da minha história política a partir de 1982, quando fui sacrificado a última hora.
O Senador será vítima mesmo antes de eleger o governador. Em quem confiar para o futuro?
Uma outra coisa Senador, fazer o esforço que o senhor está fazendo e incluir meu nome na lista apenas por incluir, não satisfaz. Já disse e repito. Não quero que me vistam de Deputado e me coloquem na Assembléia como se fosse um boneco. Quero sim, condições para disputa.
Existem pessoas para quem o dinheiro é tudo. Não me incluo entre estas graças a Deus. Contudo acho que é chegado o momento de pensar. Pelo menos colocar o meu trabalho, a minha voz e a minha experiência a serviço de quem os valorize. Fazer ou tentar fazer o mal também é uma forma de valorização. Infelizmente.
Depois de anos e anos de elogios e promessas não cumpridas, estou a receber como prêmio o forte “incentivo” da descredibilidade: “ele não tem condições”. “Quem Narcizo não tem condições”. Isso e mais alguma coisa.
Porque a minha falta de condições não foi vista quando o outro lado estava me oferecendo o Céu com todas as Estrelas? Não aceitei para resguardar o sentimento de seriedade e fidelidade. E agora chego a conclusão que valeu muito pouco. Só satisfaz a mim mesmo. Nem mesmo aos filhos e noras. Imagine aos demais.
Diante da incerteza reunir os meus e expliquei o que está acontecendo. Revolta geral. Acomodei-os com um pedido sentimental: não quero revolta nem ressentimentos. Se vocês puderem me fazer um favor, mesmo depois de minha morte, enquanto existir um (...omissis...) candidato votem e onde eu estiver serei grato a vocês.
A resposta foi positiva, mas acompanhada de lágrimas, o que já é muito para minha idade. Entre os exemplos contei para eles os lances de minha ida para a Secretaria extraordinária, os motivos pelos quais fui afastado da última vez e a conversa com o (...omissis...) depois de tudo, ou mais precisamente no dia em que ele, aniversariando, cumprimentei-o pelo telefone.

- Deputado, parabéns pelo aniversário.
- Muito obrigado, fiquei feliz você ter telefonado. Não quero lhe perder.
- Tudo bem.
- Conversaremos em Aracaju.

Uma tarde, na Vila Cristina, ao ser recebido com um aperto de mão, travamos a seguinte conversa.

- É bem que dava pra você.
- É tarde doutor, não adianta mais.
- Adianta porque eu fico lhe devendo uma reparação. Quis que o (...omissis...) me desse uma Secretaria para você, ele não me atendeu.
- Não doutor, fico como assessor.
- Mas não se preocupe, na próxima o compromisso é meu. Tem muita gente aí que só pensa no poder depois que chega lá esquece.
- Disso o senhor já sabe a muito tempo.

Passaram-se os dias e no apartamento da Barão de Maruim, a noite, não recebi um convite, mas a comunicação de que seria indicado para a Secretaria de Educação. Falamos dos planos políticos e ouvi as queixas de (...omissis...). E finalmente a promessa. Na próxima é você. Estou cansado de ajudar a quem não presta.
No dia em que (...omissis...) mandou me convidar para conversar. Procurei o (...omissis...) – o Senador não estava em Sergipe – e disse-lhe do convite. A resposta foi, vá. Você não vai se comprometer vai ouvi-lo.
Fui ouvi, ri, tomei cafezinho e sair. Volto depois, e não voltei mais.
Desculpe-me Senador, ter que fazer esse relato. Mas ele foi e é necessário neste momento para os meus filhos, que respeito as amizades acima de tudo.
Contudo, depois de explicar a eles o seu sofrimento, que bem os conheço, na medida que me é confiado, tenho um pedido a fazer: por favor não me convide a ficar com quem me rejeita ou me unir com quem em mim não acredita. Sou humano como qualquer outro, não sou gênio.
Não estou zangado. Estou sentido. Reflita e qualquer que seja a sua decisão esteja certo que é para sempre o penhor de minha gratidão ao amigo.


Narcizo Machado
* Esta carta escrita pelo meu tio Narcizo Machado me foi cedida pelos meus primos Narcizo Machado Filho e Naercio Machado.

sábado, 10 de julho de 2010

E agora José?

E Agora José?

(Carlos Drummond De Andrade)
E agora, josé?
A festa acabou,
A luz apagou,
O povo sumiu,
A noite esfriou,
E agora, josé?
E agora, você?
Você que é sem nome,
Que zomba dos outros,
Você que faz versos,
Que ama, protesta?
E agora, josé?

Está sem mulher,
Está sem carinho,
Está sem discurso,
Já não pode beber,
Já não pode fumar,
Cuspir já não pode,
A noite esfriou,
O dia não veio,
O bonde não veio,
O riso não veio
Não veio a utopia
E tudo acabou
E tudo fugiu
E tudo mofou,
E agora, josé?

Sua doce palavra,
Seu instante de febre,
Sua gula e jejum,
Sua biblioteca,
Sua lavra de ouro,
Seu terno de vidro,
Sua incoerência,
Seu ódio - e agora?

Com a chave na mão
Quer abrir a porta,
Não existe porta;
Quer morrer no mar,
Mas o mar secou;
Quer ir para minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
Se você gemesse,
Se você tocasse
A valsa vienense,
Se você dormisse,
Se você cansasse,
Se você morresse...
Mas você não morre,
Você é duro, josé!

Sozinho no escuro
Qual bicho-do-mato,
Sem teogonia,
Sem parede nua
Para se encostar,
Sem cavalo preto
Que fuja a galope,
Você marcha, josé!
José, para onde?

Você marcha José, José para onde?
Marcha José, José para onde?
José para onde?
Para onde?

E agora José?
José para onde?
E agora José?
Para onde?