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Robert Todd Carroll

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ciência*

Ciência é, antes de mais nada, um conjunto de métodos lógicos e empíricos que permitem a observação sistemática de fenômenos empíricos, a fim de compreendê-los. Acreditamos entender fenômenos empíricos quando temos uma teoria satisfatória que explique como funcionam, que padrões regulares seguem, ou por que se apresentam a nós como se apresentam. Explicações científicas são feitas em termos de fenômenos naturais em detrimento dos sobrenaturais, embora ciência em si não exija a aceitação ou a rejeição do sobrenatural.

A ciência é também o corpo organizado do conhecimento sobre o mundo empírico, que provém da aplicação do conjunto de métodos lógicos e empíricos citados acima.

A ciência consiste de várias ciências específicas, como biologia, física, química, geologia e astronomia, que são definidas pelo tipo e gama de fenômenos empíricos que investigam.

Para concluir, ciência é também a aplicação do conhecimento científico, como a alteração do arroz com genes do narciso e de bactérias para aumentar seu conteúdo de vitamina A.

os métodos lógicos e empíricos da ciência

Não existe um método científico único. Alguns dos métodos da ciência envolvem lógica, por exemplo, tirando conclusões ou deduções a partir de hipóteses, ou decidindo as implicações lógicas de relações causais em termos de condições necessárias ou suficientes. Alguns dos métodos são empíricos, como o de fazer observações, projetar experiências controladas, ou projetar instrumentos para usar na coleta de dados.

Métodos científicos são impessoais. Logo, o que quer que um cientista seja capaz de fazer como cientista, qualquer outro deve ser capaz de duplicar. Quando uma pessoa afirma medir ou observar algo através de algum método puramente subjetivo, o qual outros não podem duplicar, esta pessoa não está fazendo ciência. Quando cientistas não conseguem duplicar o trabalho de outro cientista é um sinal claro de que este errou, ou no projeto, ou na metodologia, ou na observação, ou nos cálculos ou na calibração.

fatos e teorias científicas

A ciência não assume saber a verdade sobre o mundo empírico a priori. Ela assume que deve descobrir seu conhecimento. Aqueles que afirmam saber a verdade empírica a priori (como os assim chamados criacionistas científicos) não podem estar falando sobre conhecimento científico. A ciência pressupõe uma ordem regular na natureza e assume que existam princípios fundamentais conforme os quais os fenômenos naturais funcionam. Assume que estes princípios ou leis são relativamente constantes. Mas ela não assume que possa saber a priori o que esses princípios sejam, ou o que a ordem real de qualquer conjunto de fenômenos empíricos seja.

Uma teoria científica é um conjunto unificado de princípios, conhecimento e métodos para explicar o comportamento de alguma gama específica de fenômenos empíricos. Teorias científicas tentam entender o mundo das experiências observadas e sensoriais. Tentam explicar como o mundo natural funciona.

Uma teoria científica deve ter algumas conseqüências lógicas que possamos testar contra fatos empíricos através de predições baseadas na teoria. Entretanto, a natureza exata do relacionamento entre uma teoria científica fazendo predições e sendo testada é algo sobre o que filósofos amplamente divergem (Kourany).

É verdade que algumas teorias científicas, quando são desenvolvidas e propostas pela primeira vez, são freqüentemente pouco mais que palpites baseados em informações limitadas. Por outro lado, teorias científicas maduras e bem desenvolvidas sistematicamente organizam o conhecimento e nos permitem explicar e prever uma ampla gama de eventos empíricos. Em ambos os casos, entretanto, uma característica deve estar presente para que a teoria seja científica. A característica distintiva de teorias científicas é que elas são "passíveis de ser experimentalmente testadas" (Popper, 40).

Ser capaz de testar uma teoria experimentalmente significa ser capaz de prever certas conseqüências observáveis ou mensuráveis a partir da teoria. Por exemplo, a partir de uma teoria sobre como os corpos físicos se movem um em relação ao outro, alguém prevê que um pêndulo deve seguir um determinado padrão de comportamento. Essa pessoa então monta um pêndulo e testa a hipótese de que eles se comportam da maneira prevista pela teoria. Se eles se comportarem assim, então a teoria está confirmada. Se não se comportarem da maneira prevista pela teoria, então ela foi refutada. (Isto assumindo que o comportamento previsto para o pêndulo foi corretamente deduzido a partir da sua teoria e que a sua experiência foi conduzida adequadamente).

O fato de que uma teoria tenha passado em um teste empírico, no entanto, não comprova a teoria. Quanto maior o número de testes rigorosos nos quais uma teoria passar, maior o seu grau de confirmação e mais razoável é a sua aceitação. Porém, confirmar não é o mesmo que provar logicamente ou matematicamente. Nenhuma teoria científica pode ser provada com absoluta certeza.

Além disso, quanto mais testes puderem ser feitos sobre a teoria, maior o seu conteúdo empírico (Popper, 112, 267). Uma teoria a partir da qual possam ser feitas muito poucas predições empíricas será difícil de testar e geralmente não será muito útil. Uma teoria útil é rica, ou seja, podem ser geradas muitas predições empíricas a partir dela, cada uma servindo como mais um teste da teoria. Porém, mesmo se uma teoria for muito rica e mesmo se passar por muitos testes rigorosos, é sempre possível que falhe no próximo. Ela poderia até mesmo falhar no mesmo teste pelo qual passou várias vezes no passado. Karl Popper chama esta característica das teorias científicas de "falseabilidade."

Uma conseqüência necessária para que afirmações científicas sejam falseáveis é que elas sejam também falíveis. Por exemplo, a teoria da relatividade especial de Einstein é aceita como "correta" no sentido de que "sua inclusão necessária nos cálculos leva a uma concordância excelente com as experiências" (Friedlander, 1972, 41). Isto não significa que a teoria seja infalivelmente certa. Fatos científicos, como as teorias científicas, também não são certezas infalíveis. Os fatos envolvem não apenas elementos perceptuais facilmente testáveis; eles também envolvem interpretação.

O famoso paleoantropologista e escritor científico Stephen Jay Gould nos lembra que, em ciência, 'fato' somente pode significar "confirmado até um grau tal que seria perverso negar uma concordância provisória" (Gould, 1983, 254). Entretanto, fatos e teorias são coisas diferentes, observa Gould, "e não degraus em uma hierarquia de certeza crescente. Fatos são os dados do mundo. Teorias são estruturas de idéias que explicam e interpretam os fatos." Nas palavras de Popper: "Teorias são redes lançadas para capturar o que nós chamamos de 'o mundo': para racionalizá-lo, explicá-lo e desvendá-lo. Nós nos empenhamos para tornar a rede cada vez mais fina.

Para o público desinformado, os fatos contrastam com as teorias. Os não-cientistas comumente usam o termo 'teoria' para se referir a uma especulação ou palpite baseados em informações ou conhecimentos limitados. Porém, quando nos referimos a uma teoria científica, não estamos nos referindo a uma especulação ou palpite, mas a uma explicação sistemática de alguma gama de fenômenos empíricos. No entanto, teorias científicas variam em grau de certeza do altamente improvável ao altamente provável. Isto é, há graus variáveis de provas e respaldo para diferentes teorias, ou seja, algumas são mais razoáveis para se aceitar que outras.

Existem, é claro, muito mais fatos que teorias, e assim que algo se estabelece como um fato científico (por exemplo, que a terra gira em torno do sol) não é provável que seja substituído por um "fato melhor" no futuro. Por outro lado, a história da ciência claramente mostra que teorias científicas não permanecem inalteradas para sempre. A história da ciência é, entre outras coisas, a história da teorização, testes, discussões, refinamentos, rejeições, substituições, mais teorizações, mais testes, etc. É a história de teorias funcionando bem por algum tempo, a ocorrência de anomalias (ou seja, a descoberta de novos fatos que não se encaixam nas teorias estabelecidas), e novas teorias sendo propostas e acabando por substituir as antigas parcialmente ou completamente.

Deveríamos nos lembrar que a ciência, como a define Jacob Bronowski, "é uma forma bem humana de conhecimento.... Cada julgamento na ciência se apoia na fronteira do erro.... A ciência é um tributo ao que podemos saber embora sejamos falíveis" (Bronowski, 374). "Um dos objetivos das ciências físicas," ele diz "era fazer um retrato fiel do mundo material. Uma das conquistas da física no século XX foi provar que este objetivo é inatingível" (353).

conhecimento científico

O conhecimento científico é o conhecimento humano, e os cientistas são seres humanos. Não são deuses, e a ciência não é infalível. Mesmo assim, o público em geral muitas vezes toma as afirmações científicas como verdades absolutas. Acham que, se algo não é uma certeza, não é científico, e se não é científico então qualquer outra visão não científica tem o mesmo valor. Esta concepção equivocada parece estar, pelo menos em parte, por trás da falta de entendimento generalizada sobre a natureza das teorias científicas.

Outro equívoco comum é o de pensar que, por serem baseadas na percepção humana, as teorias científicas são necessariamente relativas, logo não nos dizem realmente nada sobre o mundo real. A ciência, segundo alguns "pós-modernistas", não pode afirmar que nos dá um retrato fiel de como é realmente o mundo. Pode apenas nos dizer como ele se apresenta para os cientistas. Não existe uma coisa chamada verdade científica. Todas as teorias científicas são meras ficções. Porém, só porque não existe uma maneira única, verdadeira, final, divina de se ver a realidade, não quer dizer que não exista uma coisa chamada verdade científica. Quando a primeira bomba atômica explodiu exatamente como alguns cientistas previram que explodiria, mais um pouco da verdade sobre o mundo empírico foi revelada. Pouco a pouco estamos descobrindo o que é verdadeiro e o que é falso, testando empiricamente teorias científicas. Afirmar que aquelas teorias que tornam possível explorar o espaço são "apenas relativas" e "representam apenas uma perspectiva" da realidade é compreender de maneira profundamente equivocada a natureza da ciência e do conhecimento científico.

a ciência como uma vela na escuridão

A ciência é, como Carl Sagan a define, uma vela na escuridão. Ela lança uma luz sobre o mundo ao nosso redor e nos permite enxergar além das nossas superstições e medos, além da nossa ignorância e ilusões, e além do pensamento mágico dos nossos ancestrais, que justificavelmente lutavam por sua sobrevivência temendo e tentando dominar os poderes ocultos e sobrenaturais.

Jacob Bronowski colocou tudo em perspectiva em uma cena de sua versão televisiva de Ascent of Man. Me refito ao episódio sobre "Conhecimento e Certeza" onde ele foi a Auschwitz, caminhou para dentro de um lago onde as cinzas eram descarregadas, inclinou-se e colheu um punhado de lodo.

Dizem que a ciência vai desumanizar as pessoas e transformá-las em números. Isso é falso, tragicamente falso. Este é o campo de concentração e crematório de Auschwitz. É aqui que pessoas eram transformadas em números. Neste lago foram descarregadas as cinzas de uns 4 milhões de pessoas. E isso não foi feito pelo gás. Isso foi feito pela ignorância. Quando as pessoas acreditam ter o conhecimento absoluto, sem qualquer confirmação na realidade, é assim que se comportam. É isto que os homens fazem quando aspiram ao conhecimento dos deuses (374).

O segredo é saber como desenvolver confirmações na mundo real que evitem a predisposição para a confirmação, wishful thinking, auto-ilusão, pensamento seletivo, validação subjetiva , ser seduzido pelo reforço comunitário ou convencido por hipóteses ad hoc e raciocínio post hoc, assim como ter um ceticismo saudável e habilidade para aplicar a navalha de Occam quando necessário.

Veja verbetes relacionados sobre naturalismo, pseudociência, e as listadas no índice por assunto Lógica/Percepção & Ciência/Filosofia, e os listados em Junk Science e Pseudociência.


*Este material foi adaptado de Becoming a Critical Thinker, cap. 9, "Ciência e Pseudociência." Estou ciente de que 'ciência' pode também se referir a qualquer corpo sistemático de conhecimentos sobre algum objeto de estudo, e de que às vezes se referem à matemática e até à teologia como ciências. Este verbete não é, obviamente, uma tentativa de definir todos os possíveis usos do termo 'ciência'. Em alguns círculos, a ciência sobre a qual escrevo aqui é chamada de ciência natural. Não pretendo lançar nenhum debate a respeito do que é ou o que não é uma ciência 'de verdade' com este verbete, nem pretendo entrar em nenhuma questão "marginal" a respeito de se alguma disciplina ou atividade é ou não ciência.

leitura adicional

W. I. B. Beveridge, The Art of Scientific Investigation [A Arte da Investigação Científica] (New York: Vintage Books, 1957).

Jacob Bronowski, The Ascent of Man [A Escalada do Homem] (Boston: Little, Brown and Company, 1973). $23.96 

Irving M. Copi, Introduction to Logic [Introdução à Lógica] 10a ed. (Prentice Hall, 1998). $65.35

Michael W. Friedlander, The Conduct of Science [A Conduta da Ciência] (New Jersey: Prentice Hall, 1972). $28.00 

Martin Gardner, Science: Good, Bad and Bogus [Ciência: Boa, Ruim e Falsa] (Buffalo, N.Y.: Prometheus Books, 1981). $15.16 

Ronald Giere, Understanding Scientific Reasoning [Entendendo o Raciocínio Científico], 4a ed. (New York, Holt Rinehart, Winston: 1998). $36.50

Stephen Jay Gould, "Evolution as Fact and Theory," [Evolução como Fato e Teoria] em Hen's Teeth and Horse's Toes [Dentes de Galinha e Dedos dos Pés de Cavalo] (New York: W.W. Norton & Company, 1983). $10.36 

Stephen Jay Gould, "Piltdown Revisited," in The Panda's Thumb [O Polegar do Panda] (New York: W.W Norton and Company, 1982). $10.36 

Stephen Jay Gould, Ever Since Darwin [Desde Darwin] (New York: W.W. Norton & Company, 1979). $9.56 

Noretta Koertge, (Editor) A House Built on Sand : Exposing Postmodernist Myths About Science [Uma Casa de Areia: Expondo Mitos Pós-Modernos Sobre a Ciência] (Oxford University Press, 1998). $35.00

Janet A. Kourany, Scientific Knowledge: Basic Issues in the Philosophy of Science [Conhecimento Científico: Questões Básicas Sobre a Filosofia da Ciência], 2a. ed. (Belmont: Wadsworth Publishing Co., 1997). $50.95 

Thomas S. Kuhn. The Structure of Scientific Revolutions [A Estrutura das Revoluções Científicas]  3a. ed. (University of Chicago, 1996). $10.95

Karl R. Popper, The Logic of Scientific Discovery [A Lógica da Descoberta Científica] (New York: Harper Torchbooks, 1959). $24.95 

Carl Sagan, Broca's Brain [O Cérebro de Broca] (New York: Random House, 1979). $4.79  

Carl Sagan, The Demon-Haunted World: Science as a Candle in the Dark [O Mundo Assobrado Pelos Demônios: A Ciência Como uma Vela no Escuro] (New York:Random House, 1995). $11.20

Alan Sokal, e Jean Bricmont. Fashionable Nonsense: Postmodern Intellectuals' Abuse of Science [Bobagens na Moda: O Abuso da Ciência pelos Intelectuais Pós-Modernos] (St. Martin's Press, 1998). $16.10

©copyright 2000
Robert Todd Carroll

Traduzido por
Ronaldo Cordeiro

Última atualização: 2001-06-24

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