• Marcela Bourroul
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criança falando (Foto: shutterstock)

Nas primeiras vezes, você acha que seu filho se enrolou na hora de formar a frase e acabou tropeçando nas palavras. Depois de um tempo, você percebe que ele sabe exatamente o que quer dizer, mas tem dificuldade de verbalizar. Até que a própria criança começa a se irritar com sua fala. Essa situação pode ser um indício de gagueira infantil.

Estima-se que esse problema atinja cerca de 2% da população mundial e na maior parte dos casos aparece ainda na infância. Isso porque, ao contrário do que muita gente pensa, a gagueira não é uma questão emocional. Ela é uma deficiência neurológica que resulta em dificuldade para controlar a parte motora da fala. “A pessoa que gagueja sabe exatamente o que quer falar, tem segurança sobre o que quer dizer, mas o cérebro encontra dificuldade em transformar o pensamento – que é abstrato e está pronto - em ato motor”, explica Ignês Ribeiro, fonoaudióloga e diretora educacional do Instituto Brasileiro de Fluência (IBF). Segundo a especialista, estudos já mostraram que a insegurança ou a timidez são a consequência da gagueira, não a causa. As pessoas que desenvolvem gagueira depois de adultos geralmente passaram por algum trauma ou acidente.

Quem tem gagueira pode até ter dias piores e melhores em relação à intensidade, mas ela é observada sempre, afirma Ignês. Fatores como hereditariedade, possíveis dificuldades na hora do parto, contato com produtos tóxicos e infecções não tratadas de forma adequada são possíveis desencadeadores de gagueira persistente.

Gagueira é uma fala rompida, que se caracteriza por mais de duas repetições de sons, sílabas ou palavras monossilábicas; bloqueios (impedimento da articulação do som); prolongamentos de um som acima do esperado e pausas inadequadas no texto falado.

Outro mito comum quando o assunto é gagueira é a ideia do “espera que passa”. De acordo com Eliana Rocha, diretora clínica do IBF, a intervenção precoce é fundamental. Como nem todos os pediatras estão aptos a diagnosticar a gagueira, o ideal é que os pais procurem uma fonoaudióloga especializada se desconfiarem de que algo não vai bem. “Se o tratamento começar cedo, a chance de o problema sumir é grande”, diz Eliana.

Tratamento

A gagueira costuma aparecer entre os 2 e 6 anos e os meninos estão mais sujeitos ao problema - eles são cerca de quatro vezes mais propensos a ter gagueira. Depois do diagnóstico, o tratamento consiste em informar os pais para que entendam o problema e criem um ambiente favorável para o desenvolvimento da criança (como não se afobar - ou cobrar demais - para que a criança fale corretamente, nem a corrigir o tempo todo) e, se necessário, exercícios para trabalhar a fala.

“Os pais são fundamentais para ajudar os filhos. Além de muita paciência, é importante que os pais passem a falar mais devagar e construam frases simples, por exemplo”, afirma Eliana. Em seu consultório, ela já atendeu crianças que apresentaram melhora considerável depois de uma ou duas sessões apenas por meio das orientações passadas aos pais. Mas cada caso é um caso.

Ignês explica que o tratamento mais longo, feito com o fonoaudiólogo, tem por objetivo estimular regiões que deveriam estar naturalmente habilitadas para controlar os aspectos motores da fala, mas que estão com dificuldade em executar essa tarefa. “Isso é feito por meio de exercícios específicos, do uso de ferramentas tecnológicas (como softwares que alteram o feedback auditivo), pela reorganização do padrão de fala do paciente, entre outros”, explica.

Apesar de a gagueira não afetar o desempenho intelectual da criança, ela pode desmotivá-la na escola, caso os professores não saibam lidar com a dificuldade, além de ser motivo de bullying entre os colegas e se tornar um obstáculo à socialização. Por isso, o quanto antes diagnosticada, melhor será a qualidade de vida da criança.

Outra fonte: Anelise Junqueira, presidente do IBF