sábado, 8 de janeiro de 2022

LIÇÃO 03 – UMA LEMBRANÇA ALEGRE!

 

LIÇÃO 03 – UMA LEMBRANÇA ALEGRE!

 

INTRODUÇÃO

No presente estudo, estaremos iniciando a longa e proveitosa análise do abrangente e rico trecho de Fp 1:3-11. Tendo em vista a enormidade de tal perícope, decidimos analisá-la em três lições distintas. Na presente lição, estudaremos os vv. 3 a 5, a parte onde encontramos a ação de graças de Paulo.

 

1. GRAÇAS, AO LEMBRAR DOS CRENTES FILIPENSES

A primeira tarefa sobre a qual nos debruçaremos neste estudo é a análise da sentença do v. 3, “Dou graças ao meu Deus todas as vezes que me lembro de vós”. Era comum, nas missivas antigas, que a saudação fosse seguida por alguma expressão de estima da parte do escritor pelos destinatários da mesma, normalmente com alguma expressão de ação de graças aos Céus ou aos deuses, por motivo da boa saúde ou da fortuna dos endereçados, com a expressão do desejo que essa situação perdurasse. Assim sendo, pode-se ver que Paulo usou essa forma literária; contudo, mostrou-se sincero, não querendo apenas copiar uma forma costumeira, de forma mecânica. Tal forma literária aparece ainda aqui, incluindo uma palavra geral de apreciação, dirigida a Deus e em memória aos leitores originais do apóstolo, pois esses leitores lhe eram uma bênção e eram reputados como importantes para ele.

Além disto, temos aqui uma lição preciosa: ao se lembrar dos crentes filipenses, o apóstolo pode dar graças a Deus. Sem dúvida alguma, atitude nem sempre presente em nossos dias, uma vez que, na maioria dos casos os pastores apascentam “gemendo” (cf. Hb 12:17). Triste, mas inegável realidade!

 

2. DOU GRAÇAS AO MEU DEUS

Importante notar que Paulo acrescentou, aqui, o termo pessoal “meu Deus”, tal como o faz também em At  27:33; Rm 1:8 e Fm 4. Em seu isolamento, no cárcere, ele se sentia mais cônscio ainda de suas relações íntimas com Deus, bem como do quanto dependia do Senhor. Sem dúvida, é o desenvolvimento espiritual que leva o crente a ter esse ponto de vista sobre Deus. Para a maioria das pessoas, a ideia de Deus é apenas um conceito abstrato. É extremamente difícil alguém amar a Deus dessa maneira. É na Pessoa de Cristo, que se torna pessoal cada vez mais para nós, que aprendemos a amar a Deus; e então a alma pode subir de nível, passando a contemplar e a amar a Deus diretamente; mas essa não é uma experiência comum. É certo que todos os homens podem amar a outros homens; e isso e uma maneira indireta de amar a Deus, conforme Mt 25:35.

Necessário, ainda, analisar a expressão “por tudo”, pois tal forma de agradecimento é incomum. Trata-se, portanto, de mais um ensino prático, pois a esmagadora maioria dos fundadores de Igrejas locais e de seus pastores podem lembrar-se de muitas coisas desagradáveis acerca das pessoas com quem tem estado associados, como suas desavenças, seus conflitos, suas maledicências, suas criticas injustas, suas incompreensões, suas indiferenças, sua falta de apreciação, sua ausência de dedicação e de busca espiritual verdadeiras. Não é o caso de Paulo, que dá graças por tudo. Um grande e desafiador ensino!

 

3. POR TUDO QUE RECORDO DE VÓS

Necessário analisarmos a expressão “que recordo de vós”, pois o grego diz, literalmente, “em cada memória”, na forma nominal μνείᾳ mneía, embora algumas traduções digam “em toda a minha memória”, que encerra a mesma ideia. Essa memória era daquilo que Paulo se lembrava daqueles crentes, e talvez aluda à “sua oração a Deus”, na qual ele se lembrara de orar por eles. Dessa maneira é que a frase é usada em 1Ts 1:2. Alguns opinam que devemos entender aqui “por vossa gentil lembrança”, como se Paulo quisesse fazer alusão à dádiva que os filipenses lhe tinham enviado. Assim, pode-se imaginar o sentimento daquelas pessoas “comuns”, ao serem informadas de que o homem que suportava a carga inteira das primeiras Igrejas em seu coração se sentia grato, em cada oportunidade que se lembrava delas. É algo magnífico que cada um de nós saiba que está sendo lembrado por alguma influência inconsciente. Tal lembrança, ao invés de fomentar nosso orgulho tolo, tende antes por despertar em nós uma humildade agradecida, do que se originam uma nova coragem e uma nova aspiração. Todos sabemos com que senso de gratidão recebemos qualquer pequena recomendação de um ou de outro, o que evidencia o fato que tomaram consciência de nossa existência, e nela vêem algo de importante. Quão mutuamente dependentes somos nós, uns dos outros! De fato, existe aquela redenção que nos leva de volta, através de amigos íntimos e entes amados, até Cristo, a quem podemos ver, e até Deus, a Quem não podemos ver. Como alguém já asseverou, “a gratidão é a memória do coração”. 

 

4. FAZENDO SÚPLICAS POR TODOS VÓS

Paulo afirma que suas orações em favor dos crentes de Filipos incluía toda a Comunidade dos remidos, pois ele diz que elas eram “por todos vós” (ARA). Paulo declara a seus leitores, em linguagem enfática, que orava incessantemente em favor deles, e que jamais deixou de incluí-los em suas petições. A expressão “todos vós” ocorre também no v. 7 (por duas vezes) e no v. 8, ambos deste capitulo; ou seja, por nada menos de quatro vezes nesta breve secção, que enfatiza o quanto ele incluía a todos em seus pensamentos, em suas memórias e em suas orações. Esta atitude se harmoniza perfeitamente com o fato que o crescimento e a maturidade espiritual devem envolver o corpo inteiro, visto que um membro não pode desenvolver-se sozinho, enquanto outros permaneçam na estagnação, porquanto isso produziria uma monstruosidade. Nada há de formal nessa forte ênfase sobre o quanto o apóstolo Paulo orava pelos crentes filipenses. Antes, há aqui uma expressão espontânea. Ora, a oração se escuda na confiança que Deus entra em contato com os homens, que Deus Se interessa por eles, e que as circunstâncias podem ser modificadas ou melhoradas através da oração; e a oração é um ato criador, porquanto se vale dos poderes criadores de Deus, e não dos poderes humanos. Paulo cria nesse fato real, não apenas de maneira teórica; por essa razão, era homem de oração; ele falava sobre e praticava oração!

A mesma palavra grega, δέησις déesis, é usada para “oração” e “súplica”. A primeira menção, oração, se refere de modo geral a todas as orações, e a segunda, súplica, se refere particularmente aos pedidos específicos do apóstolo. Pode-se observar o artigo definido, no original grego, que acompanha a segunda menção dessa palavra, definindo-a como pedidos específicos. Essa mesma distinção entre geral e particular aparece no trecho de Ef 6:18, embora ali figurem termos gregos diferentes. Assim sendo, podemos dizer que uma súplica é um pedido especifico, contido dentro de uma oração.

 

5. ORAÇÕES E SÚPLICAS ACOMPANHADAS DE ALEGRIA!

Além disto, o sentimento de Paulo, ao lembrar-se deles diante de Deus, com orações e súplica, era de alegria. Temos aqui um ponto muito interessante em Filipenses. Paulo afirma que suas orações e súplicas pelos destinatários da Carta, havia um adicional inusitado, elas eram acompanhadas de “alegria”. A expressão “com alegria”, sem dúvidas, é uma das notas chaves da presente Epístola, pois conforme largamente aceito, a súmula desta Carta é “Regozijo-me, regozijai-vos”.

No grego temos o vocábulo χαρά chará, “alegria”, “estado de regozijo”, também usado para indicar um “banquete” ou um “banquete festivo”, ou ainda para indicar a pessoa ou a coisa que causava alegria (cf. Fp 4:1). No trecho de Hb 12:2 vemos que Cristo suportou tudo quanto sofreu a fim de atingir esse “estado de regozijo”.

O fato que a “alegria” é uma das notas chaves desta Epístola se torna ainda mais significativo quando nos lembramos que ela foi escrita estando seu autor encarcerado. Paulo e Silas entoaram hinos de louvor, estando aprisionados em Filipos (At 16:25). Mas, afinal de contas, a “alegria” é um dos aspectos do fruto do Espírito Santo, é uma graça cristã, implantada pelo Espírito de Deus na alma crente. De conformidade com a definição neotestamentária, trata-se de um senso de bem-estar e felicidade, que independe de quaisquer condições terrenas e físicas, sobre as quais circunstâncias a alegria terrena normalmente se alicerça.

Podemos ver aqui três passos no desenvolvimento do pensamento: primeiro, o apóstolo jamais se lembrava deles senão com um senso de ação de graças; segundo, ele se recordava deles de cada vez que orava; e, terceiro, essa lembrança sempre foi uma fonte de alegria para ele mesmo, levando-o a mostrar-se grato para com Deus!

.

6. PELA VOSSA COOPERAÇÃO A FAVOR DO EVANGELHO

A palavra “cooperação”, no grego κοινωνία koinonía, é a mesma palavra muitas vezes traduzida por “comunhão”, e aqui se refere às ofertas em dinheiro que os crentes filipenses tinham enviado ao apóstolo, e talvez também inclua o modo como haviam labutado ao seu lado. Mas isso é um conceito por demais limitado, pois tal termo tem o sentido básico de “compartilhar”, e, portanto, de “ter associação”; mas também envolve as ideias de “generosidade”, de “altruísmo”, de onde se derivam ainda as ideias de “compartilhar de algo”, como de uma “oferta” ou “dádiva” (cf. Rm 15:26). Assim sendo, uma vez que esta Carta aos Filipenses era essencialmente a expressão da gratidão de Paulo pela oferta em dinheiro que lhe tinham enviado  (cf. Fp 4:10,14), é evidente que  essa ideia  está incluída  aqui, 

embora não seja a única ideia em foco. Afinal, sabemos que os crentes filipenses tinham feito ainda mais em prol de Paulo do que isso, e a comunhão deles com ele era mais do que meramente financeira. Portanto, além de referir-se à participação em suas possessões, ele alude, também, à comunhão que eles tinham uns com os outros, como crentes que eram, bem como a comunhão que tinham todos eles “em Cristo”, e ainda, alude a como isso se manifestava na cooperação deles com Paulo, no Evangelho, porquanto o ajudavam com suas ofertas em dinheiro e trabalhavam lado a lado com ele.

 

7. DESDE O PRIMEIRO DIA ATÉ AGORA

A narrativa de At 16 mostra-nos como Paulo nem bem iniciara seus labores em Filipos e como desde os primórdios da Igreja ali já vários ajudadores ardorosos se tinham aliado a ele. E aquele entusiasmo original não se baseava em algum capricho ou impulso passageiro. Os crentes filipenses conservaram a mesma atitude para com ele. Paulo obteve seus primeiros convertidos da Europa naquela cidade. Até hoje o Evangelho não desapareceu de todo naquela cidade. A graça de Deus, portanto, se mostrou permanente, honrado aos primeiros esforços de Paulo e de seus amigos de Filipos, juntamente com Silas. E note-se que Paulo reconhece o valor positivo daqueles crentes filipenses. Mais do que isso ainda, Paulo se mostrava entusiasmado acerca de qualquer bem que encontrava nos crentes filipenses. Ora, todas essas coisas constituem lições concernentes a atitude que deveríamos ter no tocante a outras pessoas, e como essa atitude deveria governar nossas ações para com elas.

Por fim, precisamos notar que a frase “até agora”, serve para denotar a perseverança dos crentes filipenses. Ora, sabemos quão rara é a excelência de seguir a Deus imediatamente depois de sermos chamados por Ele, perseverando com constância até ao fim. Pois existem muitos lentos e atrasados na obediência, ao passo que há outros que ficam aquém através do descuido e da inconstância. Assim, as palavras de Paulo servem de preciosa lição: não é suficiente começar bem; é necessário perseverar!

 

8. NO QUE CONCERNE AO EVANGELHO

Por derradeiro, um outro aspecto ainda a ser observado nesta perícope é que os cristãos filipenses tinham se mostrado perseverantes “no que concerne ao Evangelho” (numa tradução livre). Ou seja, eles se mostraram perseverantes quanto ao apoio aos ministros do Evangelho, operando com eles na propagação da mensagem cristã, mantendo comunhão com o mesmo Cristo acerca de Quem fala o Evangelho, permitindo que essa mensagem transforme seu intimo.

Assim, temos aqui mais uma preciosa lição: trata-se de grave defeito o fato de que a maioria das pessoas se esmera em serem pontuais, presentes, dedicados e cuidadosos no que concerne às atividades da vida; no entanto, a maioria destes se mostra negligente, relapso, reticente e omisso no que concerne às coisas espirituais, ou seja, na “propagação do Evangelho”.

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

Lição 02 - PAULO E TIMÓTEO, SERVOS DE JESUS CRISTO

LIÇÃO 02 – PAULO E TIMÓTEO, SERVOS DE JESUS CRISTO

 

INTRODUÇÃO

Hoje, estudaremos os vv. 1 e 2 do primeiro capítulo da Carta aos Filipenses. Ainda que os presentes vv, sejam, apenas, o endereçamento e a saudação da Carta, com certeza serão momentos proveitosos e edificantes.

 

1. PAULO E TIMÓTEO, SERVOS DE JESUS CRISTO

Muitos elementos são comuns nas introduções das epístolas paulinas. Mas aqui temos aqui a inclusão de dois nomes, do próprio Paulo e de Timóteo como servos (gr. δοῦλοι doûloi). Paulo não escreve aos crentes em Filipos de sua posição de apóstolo, mas de sua posição ao lado deles, em jugo com eles no serviço ao Senhor. Importante observar que nas outras epístolas escritas na prisão (Efésios, Colossenses e Filemom), Paulo se considera um apóstolo. Aqui, ele começa intitulando a si mesmo e a Timóteo de servos. Esse título confirma Timóteo (Fp 2:19-23), Epafrodito (Fp 2:25-30) e Paulo (Fp 3:7-9) como indivíduos que demonstram a mesma atitude de um servo de Cristo (Fp 2:5-8), o que serve para demonstrar que a verdadeira liderança no Corpo de Cristo é uma questão funcional e não de honraria, pois todos somos, e devemos ser, servos de Cristo!

A inclusão do nome de Timóteo aqui também merece análise. Seu nome é associado ao de Paulo aqui, na segunda epistola aos Coríntios e nas duas epistolas aos Tessalonicenses. Timóteo ajudou o apóstolo na fundação da Igreja de Filipos (cf. At 16:1,13 e 17:14). Duas visitas de Timóteo a Filipos são registradas, em At 19:22 e 20:3,4. Por esta altura dos acontecimentos, Timóteo estava se preparando para fazer sua terceira visita ali (cf. Fp 2:19). Sua única participação nesta Epístola aparece na introdução e na saudação, e também em Fp 2:19. É possível que Timóteo tenha sido o amanuense de Paulo nesta Epístola, como também seu portador, embora a maioria dos eruditos atribua essas funções a Epafrodito (cf. Fp 4:18). Parece que nesse tempo Lucas se encontrava em companhia de Paulo (cf. Cl 4:14), não sabendo nós por qual motivo ele não é mencionado aqui. É possível que quando esta Epístola foi escrita, ele já houvesse deixado a localidade. Lucas também estivera associado a Paulo em Filipos. Naturalmente, se a presente Epístola foi escrita em uma prisão diferente, em uma outra cidade, diferente daquela prisão e cidade associadas a escrita da Epístola aos Colossenses, então Lucas não estaria mais em companhia de Paulo.

Outra expressão de destaque é o adjetivo santos (gr. ἁγίοις hagíois), indicando aqueles que são separados para Deus e refere-se a todos os cristãos em Filipos. Trata-se não apenas de mera formalidade vocativa, mas de característica essencial, pois é exatamente assim que Deus nos vê, santos!

Temos, ainda, a palavra bispos (gr. ἐπισκόποις episkópois, verbete que remete àqueles que cuidavam do bem-estar espiritual da Igreja local ou de um grupo de Igrejas locais), possível sinônimo de anciãos e presbíteros em outras passagens, (At 20:17 e Tt 1:5,7, respectivamente). Eram os principais administradores da Igreja. Por derradeiro, encontramos o vocábulo διακόνοις diakónois, diáconos) que alude aos que serviam à congregação em funções especiais no culto. Eram responsáveis por tratar das questões materiais da Igreja (At 6:1-7). A menção desses dois grupos sugere que a Igreja de Filipos havia crescido consideravelmente desde a primeira visita de Paulo (At 16:12-34), ocasião em que a Igreja foi fundada.

 

2. SOMENTE PASTORES E DIÁCONOS?

Embora este não seja o grande tema da Carta aos Filipenses, cremos ser este o momento oportuno para enfatizar que o NT não se ocupa em descrever de forma detalhada as peculiaridades das funções eclesiais desenvolvidas no primeiro século, uma vez que naqueles tempos não havia o sentido eclesiástico que esses termos assumiram posteriormente, pois não se referiam a qualquer “posição clerical” em oposição ao “corpo laico”. Contudo, desde o principio indicavam ofícios e funções formais no seio da Igreja local e até entre congregações gentílicas.

Precisamos notar que o precedente do governo eclesiástico na Igreja tinha por modelo a sinagoga, que contava com vários oficiais, como se pode depreender de Mt 4:23 e Lc 4:33. Ora, Paulo, sendo judeu, naturalmente padronizou o corpo liderante das Igrejas cristãs locais segundo o estilo geral das sinagogas judaicas. Os líderes dessas sinagogas eram os “anciãos”, havendo em cada sinagoga vários deles, e não apenas um. Entre eles, como primeiro entre iguais, havia o “principal” da sinagoga (cf. Mc 4:22; At 13:15 e 18:8). Era este último quem supervisionava as reuniões de culto, mormente para certificar-se que as corretas tradições estavam sendo seguidas. Também havia um “assistente” (cf. Lc 4:20), que cuidava dos rolos, trazendo-os para serem lidos e castigando aos membros culpados com açoites, além de ter o dever de ensinar as crianças a ler. Também havia aquele que dispensava as esmolas (papel assumido pelos “diáconos” nas Igrejas locais cristãs), embora também fosse um líder espiritual. Finalmente, havia o “intérprete”, uma espécie de mestre-escola, cuja função era a de parafrasear os livros da lei e dos profetas, traduzindo-os para o aramaico vernáculo, que se tornou o idioma popular na Palestina após o exílio babilônico. Pode-se ver como, em termos gerais, a Igreja cristã tomou por modelo os oficiais das sinagogas judaicas.

 

3. GRAÇA E PAZ DA PARTE DO PAI E DO SENHOR JESUS

Esta parte da saudação é comum a todas as epístolas paulinas, e os seus elementos são normalmente inclusos novamente nas bênçãos finais. Segundo alguns estudiosos, podemos ver nessa saudação simples uma indicação sobre a maneira de viver, sobre certo ponto de vista da vida, como a própria antítese do secularismo moderno, que aflige tanto o mundo como a Igreja cristã da era moderna: a maneira cristã de viver, estabelecida desde a eternidade, de conformidade com nossa transformação segundo a imagem de Cristo, o que requer entrega absoluta do ser e da personalidade próprias a Deus, uma visão contínua da grandeza do chamamento cristão. Por isso é que somos “escravos” de Cristo Jesus e de Deus, nosso Pai. Isso requer a manutenção da relação a uma comunidade ímpar, a Igreja, “em Cristo”, todos os quais têm comunhão espiritual com o Senhor. Há também o dom do poder e do amor, a saber, da “graça”, que vem da parte de Deus, por intermédio de Cristo Jesus, em Quem recebemos todas as bênçãos espirituais vindas de Deus Pai.

quarta-feira, 18 de agosto de 2021

LIÇÃO 01 – INTRODUÇÃO E ESBOÇO DA CARTA AOS FILIPENSES

INTRODUÇÃO

No presente estudo, iniciaremos uma análise textual da Carta de Paulo aos Filipenses. Sem dúvidas, serão oportunidades ímpares de estudarmos esta, que é uma das mais maravilhosas Epístolas da pena fecunda do apóstolo dos gentios!

1. A IGREJA EM FILIPOS

A Igreja Cristã em Filipos teve sua origem com os próprios esforços de Paulo, durante a sua chamada segunda viagem missionária (cf. At 16:12-40. Tendo ouvido o chamado “Passa a Macedônia e ajuda-nos” (At 16:9), Paulo alterou os seus planos tencionados de continuar labutando na Ásia Menor; e foi assim que nasceu a missão européia e a Igreja Cristã no continente europeu. Já que a segunda viagem missionária tem sido datada entre 48 e 51 d.C., a visita a Filipos deve ter ocorrido no início desse período.

Policarpo, em sua epistola aos Filipenses (3:2), indicou que o apóstolo dos gentios havia escrito diversas cartas para eles. Embora não tenhamos como saber quantas dessas cartas foram escritas por Paulo, tem sido quase universalmente aceito que nossa epístola canônica aos Filipenses representa uma ou mais das cartas genuínas do apostolo Paulo àquela comunidade cristã.

Embora Paulo houvesse sido encarcerado e tivesse sofrido várias indignidades na cidade de Filipos, parece que ele nutria afeição toda especial pelos membros da Igreja Cristã dali. A sua Epístola aos Filipenses é a mais pessoal e espontânea de todas as missivas que conhecemos, saídas da pena de Paulo. Nessa Epístola transparece um afeto que parece jamais ter sido perturbado por conflitos e disputas, especialmente acerca da questão legalista, o que se verifica em diversas outras das epistolas paulinas. Não obstante, podemos considerar a passagem de Fp 3:1 e ss., que encerra uma advertência acerca dos perigos do legalismo.

Ordinariamente, Paulo se mantinha independente das Igrejas locais, do ponto de vista financeiro, provavelmente devido ao fato que anteriormente havia perseguido a Igreja de Cristo, o que o levou a acreditar que não deveria servir de fardo para os crentes, mas antes, deveria prestar-lhes um serviço gratuito, abundante e voluntário. Não obstante, Paulo não rejeitou alguma ajuda financeira dos crentes de Filipos, mas recebeu, pelo menos por duas vezes, algum dinheiro, quando se encontrava na cidade próxima de Tessalônica (cf. Fp 4:10). Mais tarde, quando Paulo se encontrava aprisionado, os crentes filipenses se lembraram novamente dele, e, através de Epafrodito, um dos membros daquela Igreja, uma vez mais lhe enviaram uma demonstração palpável de seu amor cristão. Foi assim que, no retorno de Epafrodito a Filipos, o apóstolo lhes enviou a Epístola aos Filipenses, a qual é, essencialmente, uma missiva de agradecimento; mas Paulo também se aproveitou do ensejo para dissertar sobre vários temas, que ele julgou serem benéficos aos seus leitores, segundo se depreende de Fp 2:25-28.

2. AUTORIA

Os quatro grandes livros clássicos de Paulo são as Epístolas aos Romanos, aos Gálatas e 1 e 2 aos Coríntios. Praticamente nenhum erudito tem duvidado da autenticidade desses quatro livros do NT. como obras genuinamente paulinas. Elas são tão semelhantes entre si, no que diz respeito ao estilo, ao vocabulário, à estrutura das sentenças e a todas as demais considerações literárias que é necessário aceitar ou rejeitar juntamente todas elas. Por esse motivo, pouquíssimos estudiosos têm provocado qualquer debate em torno da autoria dessas quatro epistolas. Além dessas quatro, outras cinco Epístolas têm sido aceitas como paulinas, com pouca disputa, a saber, Filipenses, Colossenses, 1 e 2 aos Tessalonicenses e Filemom.

Esta Epístola aos Filipenses é aceita como paulina por quase todos os eruditos, embora alguns deles pensem que ela representa mais de uma epístola, sendo realmente uma composição de peças da correspondência paulina, mais ou menos as de 1 e 2 aos Coríntios são tidas como representantes de pelo menos quatro missivas, mas que chegaram até nós agrupadas em apenas duas epístolas.

Dentre as treze epístolas neotestamentárias aceitas como paulinas, sete delas foram escritas na prisão: Filipenses, Efésios, Colossenses, Filemom, 1 e 2 Timóteo e Tito, embora seja quase certo que nem todas as sete foram escritas da mesma cidade, e por ocasião do mesmo período de aprisionamento.

A própria epistola aos Filipenses (1:1) reivindica a autoria paulina. Timóteo é ali apresentado como um de seus associados, o que sabemos estar de conformidade com a vida de Paulo (cf. Fp 1:1 e 2:19). Além disso, as referências ao seu aprisionamento concordam com aquilo que sabemos ser verdade, acerca dos sofrimentos de Paulo (Fp 1:7). O autor também se refere, de forma muito natural à sua anterior pregação na Macedônia (cf. Fp 4:15), bem como ao fato que os crentes de Filipos lhe tinham enviado dádivas (cf. Fp 4:10 e 2:25-28), o que não é um elemento que um forjador tivesse querido incluir, porquanto ordinariamente era costume de Paulo viver independentemente das Igrejas, quanto ao aspecto financeiro. O conteúdo geral, o estilo e o vocabulário dessa Epístola, tudo aponta para a autoria paulina.

3. TEMAS PRINCIPAIS DA CARTA

A Carta aos Filipenses não pode ser reduzida a uma apresentação de sequência lógica, porque se trataria de uma composição de várias missivas, de forma um tanto frouxa, que abordam diversos temas. Trata-se da mais pessoal das epístolas escritas por Paulo, a mais reveladora da emotividade do apóstolo dos gentios. Temos aqui uma combinação de notas pessoais, explosões de advertência, de ação de graças e de ternura, reflexões profundas e denúncias extremamente amargas.

1. O tema da alegria aparece de maneira mais pronunciada nesta epístola do que em qualquer outro dos escritos de Paulo. Isso pode parecer-nos estranho, considerando-se as circunstâncias tão adversas sob as quais ela foi redigida, pois Paulo se encontrava aprisionado, e pairavam tão graves ameaças sobre ele que ele já pensava que o martírio era uma delas.  Porém, no capítulo final desta epístola Paulo diz-nos como já havia aprendido a estar contente, nas diversas vicissitudes da vida. Seria uma espécie de estoicismo cristão, produzido por uma vida de intensos e constantes sofrimentos, que o apóstolo sempre atribuía à vontade de Deus, como acompanhamento necessário tanto para a propagação do Evangelho como para o desenvolvimento espiritual do crente (cf. Fp 1:3,4; 1:25; 2:1,2,16-18,28; 3:1,3; 4:1,4,5,10).

2. A razão dos sofrimentos e o triunfo deles sobre os mesmos é outro dos temas centrais desta epístola. O martírio de Paulo era considerado como algo possível, embora ele esperasse que o seu ministério se prolongasse algum tempo mais, não para sua própria vantagem e alegria, mas para vantagem deles. Sobre isso se manifesta a maior parte do primeiro capítulo, além dos trechos de Fp 2:15,17 e 4:1. Paulo pensava que os crentes de Filipos continuariam a enfrentar perigos similares aqueles que ele mesmo tinha de enfrentar, como perseguições e vários sofrimentos e abusos, incluindo a própria morte (Fp 1:27-30). Não obstante, Paulo diz que os sofrimentos dos crentes fomentam o progresso do Evangelho (Fp 1:12).

3. Paulo sustenta nesta epístola a sua esperança no retorno de Cristo Jesus para breve. Ele foi capaz de olvidar os seus sofrimentos em vista da fé que a parousia (a segunda vinda de Jesus) haveria de apagar de vez a agonia do ódio e da hostilidade dos homens, soerguendo os crentes ao nível da glória de Cristo. Ele sabia que a sua morte ocorreria antes disso (Fp 1:23), mas mesmo assim continuava embalando a esperança que a segunda vinda de Cristo se verificasse durante sua vida terrena (cf. Fp 1:6,10; 2:10,11,16; 3:20,21 e 4:5).

4. Havia ainda a necessidade de exortar a Igreja em Filipos à coesão e à humildade, que consiste da participação na atitude mental de Cristo; e isso levou Paulo a compor sua mais profunda declaração concernente à humanidade de Cristo, à Sua missão humana, à Sua humilhação, ao Seu triunfo em Sua missão terrena e à Sua exaltação aos lugares celestiais, que redundara em Sua supremacia sobre tudo quanto há na criação. Entre as epístolas de Paulo, essa é a mais completa afirmativa sobre esse assunto (cf. Fp 2:1-11). Nenhuma outra passagem paulina pode comparar-se com essa, sobre a humanidade de Jesus Cristo.

5. A advertência contra os legalistas ocupa a primeira porção do terceiro capítulo desta epístola, sendo uma das declarações mais amargas de Paulo acerca desses inimigos do Evangelho, o que também constituía um dos principais problemas que havia na Igreja cristã primitiva.

6. Essa necessidade de assim pronunciar-se contra o legalismo, levou o apóstolo Paulo a expressar sua própria dedicação suprema à Cristo, o seu alvo e os seus propósitos na vida, seus anelos espirituais mais profundos, tudo o que viera a fazer parte de sua vida, quando ele repelira o tipo de fé religiosa que caracterizava os legalistas, os quais se orgulhavam em diversas relações humanas, como a descendência física ou como as realizações religiosas. Não podemos ocultar que há certo aspecto apologético nesta secção (3:4-16), porquanto Paulo repreendeu aqueles que continuavam confiando em uma forma de ufania humana, a qual anteriormente o caracterizara como intenso fariseu que ele fora. Essa atitude errônea agora parecia atrair a certos crentes, que se imaginavam “perfeitos”, assim enganando-se a si mesmos. Paulo nos mostra, na presente secção, que nem mesmo ele podia reivindicar qualquer coisa semelhante à perfeição nesta vida; antes, continuava a esforçar-se em direção ao alvo ideal e elevadíssimo, que ainda não havia atingido.

7. O trecho de Fp 4:10-20 constituiria a carta de agradecimento. Os crentes de Filipos, em mais de uma ocasião, em contraste com tantas outras Igrejas da época apostólica, haviam enviado algum dinheiro a Paulo, a fim de ajudá-lo em suas situações financeiras tão estreitas. Portanto, aqueles crentes haviam dado o exemplo de como a Igreja Cristã, em qualquer era, deve interessar-se por suprir ativamente as necessidades daqueles que “vivem do Evangelho”. O ideal do AT sobre uma casta sacerdotal, que vivia das ofertas voluntarias do povo, é aqui aprovado e confirmado; mas não como uma espécie de esmola, conforme essa prática tem sido tão frequentemente reduzida, e, sim, como dever da Igreja local, interessada em obedecer aos mandamentos de Cristo, para que fosse por todo o mundo e pregasse o Evangelho a toda a criatura. As doações monetárias ao trabalho missionário da Igreja e uma garantia de que Deus abençoará ao doador e lhe suprira as suas necessidades, conforme nos mostra a passagem de Fp 4:19.

8. Paulo repreendeu também a contenda que surgira na Igreja dos filipenses, resultante de certo orgulho e egoísmo, por parte de membros que tinham aprendido a desprezar a outros. Paulo conclamava aquela Igreja local à unidade em Cristo, como meio seguro de eliminar desordens dessa natureza (Fp 4:2,3).

9. A Carta aos Filipenses contém uma das mais excelentes exortações quanto à pureza íntima, quanto à maneira de pensar, quanto ao estado de consciência, a qual deve resultar em ações externas piedosas (cf. Fp 4:8). É fato sobejamente conhecido que nossas ações procedem da maneira de pensar. Se tivermos de manter ações santas nesta vida, essas devem ter inicio na fonte, isto é, nos pensamentos. O crente está na obrigação moral de resguardar o santuário de sua mente e de sua alma, cultivando-o com a mensagem da graça de Cristo. Trata-se do mesmo conceito que foi desenvolvido em Rm 12:1,2. Fica suposto que a vida interior dos pensamentos, se for cuidadosamente cultivada e resguardada, garantirá uma vida de pureza e utilidade nas mãos de Deus. Naturalmente que essa é uma ideia central de Cristo, que afirmou que todos os grandes pecados têm sua origem na mente, nos motivos, que finalmente produzem as ações malignas e erradas. Isso é o que também se aprende, em vários trechos do Sermão do Monte (cf. Mt 5-7). Com isso concorda aquela expressão que diz o homem é aquilo que pensa.

4. CONTEÚDO DA CARTA

Visando prover uma visão geral do conteúdo desta maravilhosa Epístola, apresentamos,  a seguir, um esboço de seu conteúdo geral:

I. Introdução (1:1-11)

1. Endereço e saudação (1:1,2)

2. Ação de graças, oração e confiança (1:3-11)

II. Paulo, um prisioneiro cheio de esperança e alegria (1:12-26)

III. O exemplo de Paulo era um consolo para os crentes que sofriam (1:27-2:18)

 IV. Características da vida cristã (2:1-18)

1. Humildade, segundo o exemplo de Cristo (2:1-4)

2. A humildade e a encarnação de Cristo. Essa humilhação propiciou lugar para sua exaltação. Cristo tinha natureza humana verdadeira e foi exaltado por haver completado de forma magnífica a Sua missão como homem (2:5-11)

3. O supremo exemplo de dedicação, deixado por Cristo, leva o crente a aceitar várias obrigações morais (2:12-18)

V. Timóteo e Epafrodito são enviados. Deveriam ser acolhidos como representantes de Paulo e tratados como tais (2:19-30)

 VI. A digressão contra os legalistas (3:1-21)

1. Contra os judaizantes (3:1-3)

2. Rejeição pessoal de Paulo aos legalistas e aos valores ditados pelo orgulho humano, paralelamente aos seus novos alvos espirituais em Cristo (3:4-16)

3. Necessidade de uma vida cristã coerente (3:17-21)

 VII. Admoestações finais variadas (4:1-9)

 VIII. A carta de agradecimento e considerações sobre as dádivas cristãs (4:10-20)

 IX. Saudações finais, encorajamentos, apreciações (4:21-23).

Estamos de volta... Mais uma vez!

Depois de longos anos sem atividades, resolvi reativar este Blog. 

Com a graça de Deus, pretendo compartilhar os estudos que tenho preparado para as EBDs de nossa pequena Igreja, a Comunidade Batista Monte Moriá, em Ipatinga, MG.

Oramos e esperamos que as publicações possam ser instrumentos úteis para edificação do Corpo de Cristo, no propósito de Jo 17:17!

Um abraço, na graça e na paz do Senhor Jesus, o Emanuel

segunda-feira, 29 de junho de 2015

SERÁ QUE DEUS PRECISA DE NÓS?

INTRODUÇÃO

        Nos últimos anos temos assistido à ascensão da Teologia centrada no homem e nos seus interesses. Uma clara distorção do enfoque bíblico-teológico ortodoxo, que sempre focalizou Deus como Centro absoluto de suas investigações e considerações. Na verdade, o que está se delineando diante de nós é uma extrema popularização do Antropocentrismo, inclusive no ambiente religioso.
        "Deus precisa de você!". Esta é uma afirmativa extremamente comum em nossos dias. Mas será que, realmente, Deus precisa de nós? O que nos ensina a Bíblia sobre este assunto?
        Estaremos investigando um pouco do ensino bíblico acerca da Pessoa de Deus e algumas das informações acerca de nós mesmos. Analisando tais informações, seguramente estaremos em condições de responder a tão importante pergunta.

1. A PESSOA DE DEUS
        Vamos começar a estudar a Pessoa de Deus, analisando um pouco das informações de que dispomos a respeito de Sua Natureza. Obviamente, Deus pode ser revelado e crido, mas jamais  assimilado em Sua plenitude, tampouco pode ser analisado num tubo de  ensaio de laboratório. Se nem os céus, nem os céus dos céus podem conter a Pessoa de Deus ou o conhecimento pleno acerca dEle (cf. 1Rs 8:27 e 2Cr 2:6; 6:18), quanto mais nós, seres finitos.
        O Catecismo de Westminster tenta dimensionar Deus quando diz: "Deus é espírito, infinito, eterno e imutável em Seu ser, sabedoria, poder, santidade, justiça, bondade e verdade" – o grifo é nosso.
        A vida de Deus é intimamente ligada ao próprio fato da existência de Deus. Há coisas que existem e no entanto não têm vida, como é o  caso  do Pão  de Açúcar, na cidade do Rio de Janeiro, os Alpes  Suíços,  a Cordilheira dos Andes, o Monte Everest ou a Serra do Caparaó. Mas Deus não só existe, Ele é vivo; Ele possui vida. Ou melhor, Deus é a  própria vida (Jo 5:26). DEle, nEle e para Ele emana tudo e todos  os seres  criados, animados e inanimados. São abundantes os textos das Escrituras que falam da vida de Deus (e.g. Jr 10:10-16).
        Vida é um termo que não pode ser plenamente definido. A ciência define-a como uma correspondência entre os órgãos  e  o ambiente.  Porém, quanto a Deus, significa muito mais  que  isso, visto que Deus não tem ambiente vivencial como temos aqui. A vida de Deus é Sua atividade de pensamento, sentimento e vontade. É o movimento total e íntimo de Seu Ser que O capacita a formar propósitos sábios, santos e amorosos e a executá-los.
        O ensino de que Deus é um ser pessoal, contrapõe-se  ao ensino panteísta, segundo o qual Deus é tudo e tudo é Deus; que Deus é o Universo e o Universo é Deus; que Ele não existe independentemente daquilo que se alega ser Sua criação.
        Pode-se definir personalidade como existência dotada de autoconsciência e do poder de autodeterminação, ou ainda como existência dotada de sentimentos, inteligência e vontade. Não se deve, portanto, confundir personalidade com corporalidade ou existência corporal material, composta de cabeça, tronco  e membros, tratando-se do homem. Corretamente definida, a personalidade abrange as propriedades e qualidades coletivas que caracteri­zam a existência pessoal e a distinguem da existência impessoal e da vida normal. A personalidade, portanto, representa a soma to­tal das características necessárias para descrever o que é um ser pessoal.
        O nome é uma das mais fortes evidências da personalidade de um ser. Ao revelar-Se a Moisés, Deus revela Seu Nome  (cf. Êx 3:14). Essa revelação é muitíssimo importante. Em nossas Bíblias em português, o verbo hebraico hayah é geralmente traduzido como “ser”. Na verdade, este é um verbo muito importante para nossa compreensão, pois significa basicamente "ser", mas também "tornar-se", "vir a ser", "existir", "acontecer". Por isto, o Nome próprio de Deus é exatamente YHWH, ou seja, “Aquele-Que-Existe” ou “O Auto-Existente”, o Nome inefável, o impronunciável Nome Próprio de Deus.
        Para melhores esclarecimentos, precisamos analisar melhor a questão do Nome Divino. Muitas vezes, quando se levanta este questionamento, muitos ficam preocupados e automaticamente relacionam esta discussão com os pretensos “Testemunhas de Jeová” ou grupos assemelhados. Obviamente, nossa discussão nada tem a ver com a aludida seita ou grupos, pois na presente dispensação somos chamados a ser testemunhas de Jesus (veja At 1:8). Ademais, a Bíblia declara que “Quem não honra o Filho não honra o Pai que O enviou” (cf. Jo 5:23b). Eles (as pretensas “Testemunhas”), são, na verdade, falsas testemunhas. Portanto, nossa discussão nada tem a ver com as pretensões deles.
        Feitas as observações acima, queremos demonstrar de forma clara e inequívoca o grande erro que se encontra na confusão entre o Nome de Deus e Seus Títulos. Iniciemos  analisando a utilização de  "nomes divinos" por parte dos próprios judeus. É por demais irônico que exatamente  eles, que foram justamente os primeiros a adotar a  concepção da  Unidade de Deus tenham aposto a Ele um número  surpreendente de designações. Este fato, inclusive, tem sido objeto de várias especulações, tanto por parte de historiadores bíblicos, de filólogos  e mesmo de antropólogos culturais. Entretanto,  costuma-se concluir que todas essas discussões resultaram de  conclusões pouco firmes e em escassos esclarecimentos. A hipótese mais razoável, possivelmente, é de que cada um dos inúmeros "nomes" de Deus que aparecem na Bíblia representam, meramente, um atributo  físico ou moral dEle, expresso em termos humanos.
        Em linhas gerais, alguns eruditos judeus costumam afirmar que Deus tenha dito a Moisés: "Quando estou julgando a  raça humana chamo-Me Elohim. Quando combato os que praticam  o  mal, chamo-Me Sabaot. Quando relembro os pecados do homem, chamo-Me El Shadai. Quando Me apiedo do mundo, chamo-Me YHWH”.
        Essa  aparente  "confusão" mesmo por parte do povo da Bíblia, possui uma razão histórico-cultural. Deus havia estabelecido:  "Não tomarás o Nome do Senhor teu Deus em vão;  porque  o Senhor não terá por inocente o que tomar o Seu Nome em vão."  (Êx 20:7). Dessa palavra do Senhor, adveio uma extrema reverência do judeu  para com o Nome YHWH, o Nome Próprio de nosso  Deus.  Essa reverência era tamanha, que o Nome veio a ser pronunciado em raríssimas ocasiões. Desta forma, para não correrem o risco de cair em desobediência  ao mandamento de Êx 20:7, o Nome era  sempre substituído por adon, ”Senhor” ou adonai, "meu Senhor", esses, por sua vez, notadamente, títulos. Também com relação à leitura e cópia do texto sagrado, haviam cuidados especiais. Em relação à cópia,  é curioso o fato de que era reservada uma pena  de ouro apenas  para escrever o Nome. O Nome de Deus, para os copistas  e os judeus em geral, é um Tetragrama que eles consideram impronun­ciável (inefável). Desta forma, optava-se por Títulos e não pelo Nome, pois este estava revestido de extremado respeito.
        Na auto-revelação de Deus, Ele próprio disse: “... este é o Meu Nome..." (Êx 3:15). Está claro, pois o Senhor não disse: “... este é um dos meus nomes...". Muito pelo contrário. Ele  uti­lizou um pronome demonstrativo singular a fim de enfatizar a Revelação  de Seu Único Nome. Aliás, a Bíblia em parte alguma fala sobre nomes diferentes aplicados a Deus. Deus só tem um Nome: Javé ou Yahweh. Jeová é uma corruptela obtida com as vogais de adonai.  Com exceção deste, os outros "nomes" não passam de títulos ou descrições. 
        No escopo de nossa proposta, ainda precisamos analisar a questão dos atributos de Deus. A palavra atributo, vem do latim ad, "para" e tribuere, "atribuir". Ou seja, "aquilo que é atribuído a alguém ou a alguma coisa". Na Teologia cristã, esse termo veio a ser utilizado  para indicar  aquelas qualidades morais ou propriedades  (atributos) atribuídas a Deus, como partes de Sua Natureza.
        Geralmente, analisa-se os atributos de Deus sem atentar devidamente a uma qualificação Divina que se reveste de enorme significado: a Solidão de Deus. Talvez você esteja questionando: Mas, Solidão!?
        Sim, Solidão.
        Solidão é aquele atributo divino que nos mostra que uma vez que Deus é Eterno, Todo-Poderoso, Onipotente e Auto-Existente, conclui-se que Ele também é Auto-Suficiente. Ou seja, Ele Se basta a Si mesmo! Vejamos os textos bíblicos que nos mostram esta verdade: Dt 33:26: “Não há outro, ó Jesurum, semelhante a Deus, que cavalga sobre os céus para a tua ajuda e, com a sua alteza, sobre as mais altas nuvens!”. 1Sm 2:2: “Não há santo como é o Senhor; porque não há outro fora de Ti; e rocha nenhuma há como o nosso Deus”. 2Sm 7:22: “Portanto, grandioso És, ó Senhor Jeová, porque não há semelhante a Ti, e não há outro Deus, senão Tu só, segundo tudo o que temos ouvido com os nossos ouvidos”. 1Rs 8:60: “... para que todos os povos da terra saibam que o Senhor é Deus e que não há outro”. 1Cr 17:20: “Senhor, ninguém há como Tu, e não há Deus além de Ti, conforme tudo quanto ouvimos com os nossos ouvidos”. Sl 73:25: “A quem tenho eu no céu senão a Ti? E na terra não há quem eu deseje além de Ti”. Is 45:5: “Eu sou o Senhor, e não há outro; fora de mim, não há deus; eu te cingirei, ainda que tu Me não conheças”. Is 45:6: “Para que se saiba desde o nascente do sol e desde o poente que fora de mim não há outro; eu sou o Senhor, e não há outro”. Is 45:22: “Olhai para Mim e sereis salvos, vós, todos os termos da terra; porque Eu Sou Deus, e não há outro”. Jl 2:27: “E vós sabereis que Eu estou no meio de Israel e que Eu Sou o Senhor, vosso Deus, e ninguém mais; e o Meu povo não será envergonhado para sempre”.
        Ora, se não há outro semelhante a Deus, isto demonstra que desde toda a eternidade, Deus, o Único Deus, é totalmente Único. Ele não necessitava, nem necessita de nada, nem de ninguém, pois Ele Se basta a Si mesmo.
        Entretanto, precisamos nos lembrar que Deus, por um livre desígnio de Sua própria vontade, resolver criar o homem. As Escrituras nos revelam que o propósito fundamental desta criação é o louvor da glória de Deus: Rm 11:36; Ef 1:6,12; Hb 13:15.

2. O HOMEM
        Agora que estudamos um pouco sobre Deus, vamos dar sequência falando acerca do homem. Vamos partir da seguinte pergunta: O que é o homem?
        Ao que parece, Jó foi o primeiro dos homens mencionados na Bíblia a  interrogar acerca do homem. Foi ele quem perguntou a Deus: "Que é o homem, para que tanto o estimes, e ponhas sobre ele o Teu coração, e cada manhã o visites, e cada momento o provês?" (Jó 7:17,18). Essa inquirição também foi realizada pelo salmista: "Que é o homem  mortal  para que Te lembres dele? E o filho do homem, para que o visites?" (Sl 8:4). E também: "Senhor, que é o homem, para que o conheças, e o filho do homem, para que o estimes?" (Sl 144:3).
        Seguramente o aspecto de transitoriedade da vida humana é algo marcante. O corpo humano e inegavelmente volátil. Alguém definiu assim a transitoriedade da vida humana: "O homem é um embrulho postal que a parteira despachou ao coveiro." A Bíblia, não obstante, fala do homem físico natural como um ser cuja existência física está limitada aos poucos anos que Deus lhe deu na terra.
        As  Escrituras  apresentam a vida terrena do  homem  em termos de absoluta transitoriedade: uma sombra (Jó 8:9), os  dias de  um  jornaleiro  (Jó 7:1), um correio (Jó  9:25),  palmos  (Sl 39:5), a urdidura de um tecelão (Is 38:12) e vapor (Tg 4:14).
        A Bíblia registra alguns nomes para designar o corpo humano, quanto a transitoriedade de sua existência e posição que ocupa no plano eterno de Deus. A Bíblia o chama "casa", "tabernáculo" e "templo". (1Co 6:19; 2Co 5:1-4).
        Os  filósofos pagãos falavam do corpo com  desprezo,  e consideravam-no um empecilho ao aperfeiçoamento da alma, pelo que almejavam o dia quando a alma estaria livre de suas  complicações e  enredosas  roupagens. É especialmente curiosa  a  postura  dos gnósticos neste sentido, pois afirmavam veementemente que a matéria é a essência mesmo do mal, fato pelo qual levou alguns dentre eles a adotarem uma posição "docética" (do verbo gr. dokeo, parecer) em relação ao Senhor Jesus, pois segundo eles, Jesus  jamais poderia ter Se feito homem, pois isso anularia Sua Divindade.
        No entanto,  as Escrituras Sagradas não apresentam o corpo do homem em termos semelhantes. Pelo contrário, em toda a parte, a Bíblia trata do corpo do homem como obra das  mãos  de Deus, que deverá ser apresentado a Deus (Rm 12:1) e que deve  ser usado para a glória de Deus (1Co 6:20). Uma coisa de suma  importância  a ser observada é o seguinte: porque o livro de  Levítico trata de forma tão acentuada de leis que governam a vida  física dos  israelitas?  Obviamente, para ensiná-los que o corpo, como instrumento da alma e do espírito, deve conservar-se forte e santo.
        Evidentemente, o corpo é terreno (1Co 15:47), e como tal, um corpo de humilhação (Fp 3:21), sujeito a enfermidades e à morte (1Co 15:53), de maneira que gememos por um corpo celestial (2Co 5:2). Mas, na vinda de Cristo, o mesmo poder que vivificou a alma, transformará o corpo, completando assim a Redenção do  homem.  E a garantia de que essa mudança ocorrerá é o Espírito que nele habita (Rm 8:11; 1Co 5:5).

CONCLUSÃO

        Pelas considerações apresentadas, podemos concluir que Deus não precisa de nós. Nós, sim, precisamos desesperadamente dEle, pois sem Ele, somos apenas pó e cinza (Gn 18:27). Se há alguma virtude em nós, esta reside unicamente no fato de que somos alvo do amor de Deus (Jo 3:16) e por causa deste amor, podemos ser Santuário do Deus Vivo! A Ele a glória pelos séculos sem fim!

terça-feira, 16 de junho de 2015

RENOVAÇÃO CARISMÁTICA CATÓLICA
O QUE É? O QUE PRETENDE? O QUE TEM SIDO?


1. INTRODUÇÃO

Apesar de historicamente a Renovação Carismática Católica (RCC) já contar com algumas décadas de existência, muito pouca coisa se tem falado ou escrito acerca dela nos meios evangélicos. A grande verdade, é que a RCC continua sendo uma espécie de enigma para muitos evangélicos (inclusive líderes), que postulam as mais diferentes posições acerca dela. De um lado, existem os complemente céticos de que de fato possa haver uma "renovação" no seio do Romanismo. De outro, existem aqueles que cegamente defendem a RCC como se fosse uma denominação evangélica dentro do Catolicismo!
Mas, afinal, o que é Renovação Carismática Católica? O que de fato pretende a renovação Carismática dentro do contexto católico-romano e dentro do contexto evangélico? O que tem sido, na prática, esse "movimento"? Quais as implicações práticas da renovação Carismática?
Estas e outras perguntas procuramos responder neste pequeno trabalho. É óbvio, que de forma alguma pretendemos esgotar o assunto ou nos apresentar como "grande mestre" da RCC. Mas o que apresentamos, é fruto da nossa experiência pessoal nos grupos de oração carismáticos católicos e nos bastidores dessa RCC. Experiências essas vividas, quando ainda a RCC era considerada pela esmagadora maioria dos católicos como "bicho de sete cabeças". 
O presente trabalho destina-se, principalmente, aqueles que pretendem formar uma idéia sólida da RCC. Naturalmente, alguns católico-romanos terão acesso ao mesmo e creio que se o Senhor providenciar para que isto ocorra, poderá redundar em bênçãos para sua vida e instrumento de libertação.
Nossa oração, é que esse trabalho humilde possa ser subsídio útil para que a Igreja do Senhor possa ser edificada na Palavra do Senhor (cf. Jo 17:17).


2. O QUE É A RCC: RENOVAÇÃO CARISMÁTICA CATÓLICA? 

Para podermos responder de forma correta a esta pergunta, é necessário, primeiramente, que respondamos a uma outra:

Como surgiu a RCC?

No tocante a esta pergunta, existe muita controvérsia, mesmo dentro dos meios romanistas. Muitos defendem a idéia de que antes de surgir como movimento oficial (com aprovação eclesiástica), a RCC surgiu não-oficialmente nos Estados Unidos. Particularmente, essa é a posição que cremos ser a mais verdadeira. É importante a observação de um autor católico-romano, S. Falvo, em seu livro "A hora do Espírito Santo", pág. 25, quando ele diz literalmente: "O novo Pentecostes, ou melhor, o despertar carismático, como fenômeno de massa, para a renovação da Igreja, no clima de Pentecostes, nasceu nos Estados Unidos, e fora da Igreja católica" - o grifo é nosso. Essa descrição de S. Falvo, na nossa opinião, é chave para entendimento do surgimento desse movimento. Vejamos que é admitido pelo romanismo que o movimento não surgiu dentro do Catolicismo. Outra observação histórica, é que o papa João XXIII, de pontificado relativamente curto (1958-1963), um homem que segundo a história contemporânea e o próprio catolicismo "não possuía inimigos", foi quem oficialmente, em audiência pública na Praça de São Pedro, em Roma, na abertura do conhecido Concílio Ecumênico Vaticano II, em 25 de dezembro de 1961, na sua oração pediu a Deus um novo derramar do Espírito, um novo Pentecostes. É interessante, também, observar, que foi o papa João XXIII quem convocou esse Segundo Concílio Ecumênico do Vaticano, embora Não tenha tido o privilégio de concluí-lo, pois a morte o alcançou antes disso (em 3 de junho de 1963). É muito curioso o fato de que o próprio Magistério da Igreja católica Não nega que a RCC surgiu fora dos limites romanistas e dentro do ambiente ecumenista do Vaticano II. 

Afinal... o assopro veio de Deus ou da "virgem"?

Paulo VI, que segundo os romanistas foi quem levou a efeito os propósitos ecumênicos do Segundo Concílio do Vaticano, sucedeu a João XXIII. "Em 1967, celebrava-se o qüinquagésimo aniversário das aparições... de Fátima. O Papa Paulo VI dirigiu-se como peregrino à Cova da Iria (lugar das aparições, N.R.), para pedir à Virgem a paz do mundo, e, sobretudo a paz no interior da Igreja. Ora, foi exatamente naquele ano, para Não dizer naqueles dias que se verificou a misteriosa... coincidência. Exatamente naqueles dias manifestaram-se os primeiros sinais do despertar carismático na Igreja católica... Queremos crer que a Virgem, em resposta às angustiosas súplicas do Vigário de Cristo, tenha respondido com uma nova e abundante efusão do Espírito Santo, o verdadeiro, o único Pacificador dos ânimos..." (S. Falvo, em "A hora do Espírito Santo", pág. 40). Gostaríamos que nesse ponto em particular, o leitor atentasse para o fato de que segundo o historiador romanista citado, a resposta veio da Virgem. Outro fato de importância capital: o mesmo historiador afirma que a abundante efusão veio também da Virgem!
Os fatos mencionados por S. Falvo são bem conhecidos no ambiente da RCC. Quais sejam:
Primavera de 1967. Um grupo de sacerdotes católicos, religiosas, estudantes e professores da Universidade de Duquesne, sentem-se desiludidos e desmoralizados. Essa desilusão serve para que se apercebessem de algo de concreto na fé. Em seguida, cai-lhes nas mãos o famoso livro "A Cruz e o Punhal", do famoso pastor de Times Square, David Wilkerson. A leitura desse livro leva-os a compreenderem da necessidade de uma experiência pessoal com o Espírito Santo. Depois de alguns meses de oração perseverante, pedem a alguns Pentecostais que orem sobre eles para receber o batismo no Espírito. Os efeitos são imediatos e prodigiosos. Essas pessoas sentem suas vidas transformadas, com um profundo sentimento de paz e de alegria, bem como poder para testemunhar. Além disso, sentem-se revestidos de um poder sobrenatural, verificado através da experiência do falar em outras línguas, as profecias, as curas, o discernimento dos espíritos... Assim, nasce a RCC.
"No dia 1º de março de 1967, realiza-se o primeiro encontro de oração, com alguns pentecostais: é o primeiro encontro de oração carismática de caráter ecumênico..." (S. Falvo, "A hora do Espírito Santo", pág. 42).


E então? O que vem mesmo a ser a RCC?

Para esta resposta, gostaríamos em primeiro lugar, de citar o que afirma o próprio S. Falvo (romanista), em seu livro "A hora do Espírito Santo", pág. 105 e 106: "... A renovação Carismática... é reviver a experiência do Pentecostes... É restituir à Igreja sua verdadeira face... Portanto Não se trata de novas estruturas, nem de novas organizações ou de novas formas de práticas de piedade, mas de um sopro de vida nova... nas atuais estruturas da Igreja..." Também o mesmo autor enfatiza, nas págs. 103 e 104, do referido livro o que Não é a RCC, que nos serve para compreender o que de fato é, visto que nos informa o que ela Não é. Vejamos: "Excluímos, obviamente, da maneira mais categórica, de que se trate de um movimento tendente a alterar, modificar, ou, de qualquer forma, pôr em crise as atuais estruturas da Igreja... Nada em comum com novas doutrinas teológicas...".


3. O QUE PRETENDE A RCC?

Bem, agora que temos analisado historicamente como surgiu e o que de fato é a RCC, passaremos a analisar, à luz das Escrituras Sagradas, o que pretende a mesma. Para uma melhor compreensão, dividiremos o assunto em: o que pretende a RCC dentro e fora do catolicismo romano.


O que pretende a RCC dentro do contexto católico-romano?

Esta é uma pergunta de muita importância. Será o que de fato pretende a RCC? 
Se analisarmos a história deste movimento a fundo, ou mesmo que o analisemos somente tendo por base os subsídios históricos aqui apresentados, veremos que a RCC, surgiu num contexto bastante peculiar. O Senhor Deus havia prometido: "E nos últimos dias acontecerá, diz Deus, que do Meu Espírito derramarei sobre toda carne..." (At 2:17; cf. Jl 2:28). Conhecemos o que o Senhor realizou em cumprimento à Sua promessa nos territórios da Armênia e da Rússia no último quartel do século XIX, bem como o que realizou nos Estados Unidos no início deste século, derramando do Seu Espírito sobre milhares de vidas, concedendo-lhes poder para testemunhar de Jesus (cf. At 1:8). Sabemos também o que o Senhor realizou dentro das chamadas "Igrejas Históricas" nas décadas de 50 e 60.
Assim, o Magistério da Igreja católica percebeu a necessidade de integração no novo modelo eclesial que estava surgindo, onde a frieza da liturgia sem vida era substituída pela espontaneidade do louvor, da adoração e da ação de graças. Até então, o ápice da liturgia romanista era celebrado em latim, não importando se os fiéis sabiam ou não o que era recitado. A monotonia havia invadido o romanismo depois de séculos de trevas... Assim, os observadores mais acurados do Vaticano, perceberam que só havia um meio de deter o crescimento daquilo ao qual se opunham: unir-se a eles, tornando-se como eles!
Talvez nesse contexto, você esteja perguntando se de fato houve autenticidade naquilo que ocorreu com aqueles da Universidade de Duquesne. A resposta é sim!!! Não apenas com aqueles, mas com milhares e milhares de outros católicos que tiveram a experiência genuína do Batismo com o Espírito Santo. A questão não está centrada no que a RCC pretende, mas no que o romanismo pretende com ela!
Ainda sobre o que pretende a RCC, cabe-nos citar algumas palavras do livro "Orientações Teológicas e Pastorais da RCC", pág. 12: "A renovação Carismática não quer promover um retorno simplista, despojado de todo sentido histórico, a uma Igreja idealizada no Novo Testamento... Seu desejo é continuar a tradição católica..." Nesse mesmo livro, afirma-se que "a renovação carismática não dá nada à igreja que ela já não possua" (pág. 35 - o grifo é nosso).
Em suma: a RCC surgiu no seio do romanismo como meio de deter ou tentar deter o crescimento das chamadas "igrejas de fogo". A filosofia apresentada é bastante elementar: porque ser evangélico, se a RCC possui todos os elementos dos evangélicos: louvor, ADORAÇÃO, línguas, profecias, curas...?


O que pretende a RCC fora do contexto romanista?

RCC é encarada no seio do catolicismo romano, como o encarnar dos propósitos ecumenistas propostos no Concílio Ecumênico Vaticano II. É visto no seio do romanismo, como uma forma de tornar possível o propósito do pai do Vaticano II, João XXIII: "Valorizemos o que nos une e deixemos de lado o que nos divide".
Para entendermos o alcance desse objetivo ecumenista, vale ressaltar que na conclusão de um sermão, um pastor evangélico do Texas, EUA, afirmou: “... Ave, Maria, agraciada por Deus! Vós nos mostrastes o que significa confiar e obedecer. Ajudai-nos agora a dizer como vós..." (John R. Claypool, em "Maria e o Espírito Santo", pág. 66).
Convém transcrever aqui o que afirma o livro "Orientações Teológicas e Pastorais da RCC", à pág. 59: "É evidente que a renovação Carismática é uma relevante força ecumênica e é de fato ecumênica por sua natureza".


4. O QUE TEM SIDO, NA PRÁTICA, A RCC?

O apóstolo Paulo afirma-nos que "todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados pelo Seu decreto" (Rm 8:28). Com base neste único verso, podemos afirmar que Deus tem usado tremendamente a RCC para salvação de vidas! Sim: para salvação de vidas! Pois se há um aspecto marcante nessa RCC, é que os carismáticos têm sido levados a ler a Palavra, e segundo o que disse o próprio Senhor Jesus (Jo 8:32): "conhecereis a verdade (1ª fase) e a verdade vos libertará" (2ª fase).
Assim, podemos afirmar, por experiência própria, que a RCC pode ser definida como "um tiro que saiu pela culatra". Se o Magistério romano pretendia segurar os fiéis, o que tem ocorrido é que muitas e muitas pessoas (como eu mesmo) têm conhecido a Jesus e têm sido libertos das garras de Satanás. Aleluia!!!


5. QUAIS AS IMPLICAÇÕES PRÁTICAS DA RCC?

Agora que temos analisado aspectos históricos da RCC, gostaríamos de analisar alguns aspectos práticos da mesma.
O primeiro aspecto que gostaríamos de analisar: de fato alguém do romanismo pode receber a experiência do Batismo com o Espírito Santo? A resposta é, sem dúvida alguma, sim. O Senhor afirmou que derramaria do Seu Espírito sobre "toda carne", (pasan sarka, no grego), isto é, cada (ou toda sorte de) carne. Isto é, a promessa é para todos. Talvez alguém queira apresentar uma objeção lógica: como é que então, alguns dos carismáticos que aparentemente receberam o derramar do Espírito continuam adorando imagens de escultura? A resposta a esta pergunta está relacionada com outra pergunta: será que todos que "aparentemente" receberam algo do Espírito o receberam de fato? Como fruto de minha experiência pessoal como "ex-carismático-católico", e de minha pesquisa pessoal na Palavra de Deus, posso afirmar com certeza de que há uma forma de se discernir o verdadeiro do falso no que tange a experiência dos católicos-carismáticos. Três versos da Bíblia podem nos servir de ajuda. O primeiro deles é At 5:32: "... e também o Espírito Santo que Deus deu aqueles que lhe obedecem". O segundo é 2Co 6:16: "... que consenso tem o templo de Deus com os ídolos?". O terceiro e último é Rm 8:14: "Todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses são filhos de Deus". Concluindo: se quisermos saber se verdadeiramente alguém da RCC recebeu a plenitude do Espírito Santo, basta observarmos se saiu ou se continua lá! (cf. Ap 18:4).
Outro aspecto prático da RCC é que o carismático geralmente é pessoa sincera, que não admite ser um idólatra, ou que às vezes, tenta provar, que o romanismo não seja idólatra.
Cremos que esta questão está muito mais relacionada com os católicos-carismáticos do que propriamente com os evangélicos que estarão lendo esse trabalho.
Esta é uma velha afirmação romanista. Em regra geral, quase todos os católicos não admitem que adoram imagens de escultura. É necessário recordarmos que esse trabalho não é um tratado de idolatria ou mariolatria ou um instrumento de ofensa, mas isto sim, um pequeno subsídio para se entender a RCC. Entretanto, gostaríamos de abordar esse assunto de forma bem clara. Não estaremos citando versos bíblicos do abundante manancial de condenações escriturísticas à idolatria. Gostaria apenas de citar o que estabelece o Código de Direito Canônico (o Documento que rege o Catolicismo romano - N.R.), em seu cânon 1186: "Para fomentar a santificação do povo de Deus, a Igreja recomenda à veneração especial... a sempre Virgem Maria, Mãe de Deus..." Também o cânon 1187 que diz: "Só é licito venerar, mediante culto público, aqueles servos de Deus que foram inscritos pela autoridade da Igreja..." (o grifo é nosso). E por fim, o cânon 1188: "Mantenha-se a praxe de propor imagens sagradas nas igrejas, para veneração dos fiéis...".
Um último aspecto que gostaríamos de enfocar, é o caso da manutenção da identidade católico-romana. Eu, pessoalmente, participei de reuniões de oração da RCC, onde após um longo período de oração, introduzia-se ao som de algum hino mariolátrico alguma imagem de Maria, preferencialmente a "Aparecida". Ademais, temos notícias orais de que grupos carismáticos de Brasília que durante meses realizaram trabalhos "evangelísticos" em logradouros públicos foram obrigados a usar "distintivos" para que a identidade católico-romana não se perdesse.


6. CONCLUSÃO

Cremos que em razão da complexidade e abrangência desse importante assunto, esse trabalho servirá apenas como subsídio. Mas gostaríamos de expressar, ao final desse trabalho, nosso desejo de que a Igreja do Senhor Jesus possa valer-se da RCC como instrumento de evangelização, vez que se há um ponto positivo na RCC, este ponto seja aquilo que os bispos católicos têm definido como "perigo de fundamentalismo bíblico", isto é, o "perigo santo" de que lendo a Bíblia, o católico se converta e seja feito nova criatura. Esta é nossa oração.

"Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz..." (Ap 3:22).


7. BIBLIOGRAFIA

A BÍBLIA SAGRADA. Edição Revista e Corrigida no Brasil. Rio de Janeiro, Imprensa Bíblica Brasileira, 1994.
ALDUNATE, Pe. C. & outros. A Experiência de Pentecostes. São Paulo, Edições Loyola, 1982.
CHAMPLIN, Russel N. & BENTES, João Marques. Enciclopédia de Bíblia Teologia e Filosofia (6 volumes). São Paulo, Associação Religiosa Editora e Distribuidora Candeia, 1991.
FALVO, S. A Hora do Espírito Santo. São Paulo, Edições Paulinas, 1982.
PAULO VI, Papa. Paulo VI e a Renovação Carismática. São Paulo, Edições Loyola, 1978.
ROSAGE, David & outros. Maria e o Espírito Santo. São Paulo, Ed.Loyola, 1983.
SUENENS, Cardeal. Orientações Teológicas e Pastorais da Renovação Carismática Católica. São Paulo, Edições Loyola, 1979.
TAYLOR, William Carey. Dicionário do Novo Testamento Grego. 8ª ed. Rio de Janeiro, JUERP, 1986.